O governo do Pará, Estado líder em desmatamento, mudou as diretrizes de seu programa de recomposição de áreas destruídas na Amazônia e passou a contabilizar espécies exóticas, como eucalipto, para aumentar os números e se aproximar da meta de 1 bilhão de árvores. Quando lançou o programa "1 Bilhão de Árvores para a Amazônia", em maio deste ano, o governo previu somente o plantio de espécies nativas. Mas 65% do reflorestamento deverá ser feito com eucalipto --planta original da Austrália--, segundo a Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente).
A Folha apurou que, se fosse mantida a condição inicial, a lentidão e o desinteresse dos produtores em se cadastrar atrasariam o cumprimento da meta até 2012, prazo estipulado pela governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT). A preferência pelo eucalipto decorre do menor tempo de maturação --em torno de seis anos-- em relação a espécies nativas brasileiras.
A produtividade da espécie também é maior do que as outras por ter sido melhorada geneticamente no país. O programa do Pará oferece financiamento e auxílio técnico a empresas e produtores que apresentarem projetos de reflorestamento, e também promete menos burocracia na futura concessão de licenças ambientais de exploração.
Os incentivos visam motivar produtores a fazerem o CAR (Cadastro Ambiental Rural). Os dados cadastrais permitirão ao Estado controlar o cumprimento da lei que prevê reserva legal de 80% das terras produtivas da região amazônica para manutenção de mata nativa.
A abertura para a inclusão de árvores exóticas na conta se deu em agosto. Com isso, o governo diz já ter autorizado o plantio de 222 milhões de árvores, quase um quarto da meta.
Na conta entram projetos de empresas como a Vale, que pretende arrendar propriedades para plantar eucalipto.
Para especialistas, espécies exóticas têm desvantagens. Além de não reconstruir a biodiversidade amazônica, tendem a gerar concentração de terras (o que aumenta a disputa e a violência fundiária) e, para alguns, prejudicam o solo.
"Se o foco é mesmo o reflorestamento, o eucalipto está longe de ser o ideal, principalmente por não reproduzir a biodiversidade", diz o pesquisador Paulo Barreto, do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia).
Segundo Barreto, o programa "1 Bilhão de Árvores para a Amazônia" foi lançado precocemente para aproveitar uma visita do presidente Lula a Belém e isso acabou exigindo alterações posteriores.
Para o engenheiro florestal Nilton José Sousa, o eucalipto não tem características de regeneração, mas também não há provas de que seja mais nocivo que qualquer outra monocultura. "Por ser mais viável economicamente, pode ser uma saída para áreas degradadas, já que teria impacto social positivo", afirma.
Outro lado
A Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente) diz que o Pará tem "grande necessidade de plantio de florestas energéticas", como as de eucalipto, e que o programa "1 Bilhão de Árvores para a Amazônia" segue o Código Florestal brasileiro.
A legislação permite o plantio de "espécies exóticas como pioneiras", de forma temporária, "visando a restauração do ecossistema original". Contudo, depois da primeira extração, a recomposição da floresta deverá ser, obrigatoriamente, com nativas.
A predominância do eucalipto corre, segundo a Sema, devido à demanda da indústria siderúrgica e de celulose. A futura extração do eucalipto será uma alternativa ao carvão vegetal que era produzido a partir da exploração ilegal da floresta até 2007.
Secretário do Meio Ambiente na data do lançamento do programa de reflorestamento, Valmir Ortega afirma que a contabilização de árvores exóticas foge do ideal, mas que ainda assim pode ser positiva. "O projeto não é só de reflorestamento. É uma estratégia para recompor a reserva legal com ganho social", afirma.
(Por JOÃO CARLOS MAGALHÃES, ROBERTO MADUREIRA, GUSTAVO HENNEMANN, Agência Folha, 28/11/2009)