Eliane dos Santos não sai de casa há seis dias. Desde que os rios Pardo e Jacuí começaram a subir e invadiram a casa em que ela mora com a família, no balneário Porto Ferreira, o segundo andar da casa se transformou num cárcere. O andar de baixo está inundado, são mais de dois metros de água onde antes funcionava o mercado que dá sustento à família.
– Puxamos a mercadoria e os móveis pro segundo andar, e estamos rezando para a água não subir mais – conta a dona de casa.
Da sacada, Eliane vislumbra um cenário aterrador. Das casas dos vizinhos, só é possível ver os telhados de quem tinha dois andares. O marido dela, Derli dos Santos, passa os dias no imenso lago, com um barco, resgatando cães que se abrigaram em telhados e levando um ou outro morador para ver os estragos das casas.
O irmão dele, Jorceli Prado dos Santos, que mora há 46 anos na localidade, lembra uma única cheia em que o rio subiu tanto, em 1983. Antes, só a histórica enchente de 1941, que deixou a cidade praticamente embaixo d’água. Para sair de casa e chegar à estrada que leva à cidade, Santos precisa fazer dois quilômetros de barco, em meio à água lamacenta.
Cidade cenográfica está praticamente submersa
Nos balneários de Rio Pardo, 900 casas estão na mesma situação. Apenas três famílias permanecem na localidade, que virou um grande cemitério aquático. Como a maior parte dos proprietários é veranista, esta parte da cidade não deixou desabrigados, mas vai trazer prejuízos financeiros ao município.
– O veraneio pra nós acabou, Quando esta água baixar, vai deixar só lama e sujeira – lamenta Santos.
A cidade cenográfica construída para as gravações do filme Diário de um Novo Mundo, baseado no romance Um Quarto de Légua em Quadro, de Luiz Antônio de Assis Brasil, está quase submerso, em Porto Ferreira. Com previsão de chuva forte para o final de semana, os olhares de Santos se estendem para a grande massa de água, imaginando se será necessário retirar a família às pressas pelas janelas.
Nas outras áreas ribeirinhas de Rio Pardo, outras 160 famílias tiveram de deixar as casas e se abrigar em salões comunitários e casas de parentes. Os rios Pardo e Jacuí, que circundam a cidade, subiram 19 metros, atingindo os balneários e os bairros nas áreas ribeirinhas.
O prefeito Joni da Rocha (PTB) decretou situação de emergência e ainda trabalha para levantar os prejuízos. Estradas do interior foram destruídas pela água e deixaram localidades inteiras isoladas. O plantio do arroz já registra perda total em algumas áreas e o fumo, atividade da qual dependem mais de 6 mil famílias, terá quebra de 60% na safra.
(Por Marielise Ferreira, Zero Hora, 28/11/2009)