O Departamento de Segurança Nacional gastou US$ 230 milhões para desenvolver a melhor tecnologia para detectar bombas nucleares contrabandeadas, mas teve que parar as máquinas porque os EUA estão com falta de uma matéria-prima crucial para o programa, disseram especialistas.
O material é o hélio 3, uma forma incomum do elemento que é formado por meio do empobrecimento do trítio, material usado em bombas de hidrogênio. Contudo, o governo parou de produzir trítio em 1989.
“Eu não recebi nenhuma explicação de por que isso não foi previsto”, disse o representante Brad Miller, democrata da Carolina do Norte, que é chefe do Subcomitê da Câmara, que está investigando o problema.
Uma autoridade do Departamento testificou, na semana passada, diante o conselho de Miller, o Subcomitê de Investigação e Fiscalização do Comitê da Câmara de Ciência, que a demanda por hélio 3 aparentemente era 10 vezes maior que o suprimento.
De acordo com Miller, algumas agências do governo de fato anteciparam a crise, mas o Departamento de Segurança Nacional parece não ter recebido a mensagem.
O departamento planejava formar uma rede mundial usando os novos detectores, que serviriam para detectar plutônio e urânio em contêineres de navios. O governo havia exigido de 1.300 a 1.400 máquinas, no valor de US$ 800 mil cada. Elas seriam usadas em portos em todo o mundo para combater terroristas que tentassem contrabandear bombas nucleares para uma grande cidade, colocando-a em um dos milhões de contêineres que entram nos EUA todos os anos.
Na Casa Branca, Steve Fetter, diretor-assistente do Gabinete de Política Tecnológica e Científica, disse que o problema do hélio 3 não duraria muito porque outras tecnologias seriam desenvolvidas. Mas, de acordo com ele, enquanto o governo tinha uma grande quantidade de hélio 3 ao final da Guerra Fria, “as pessoas deveriam ter ficado alertas de que essa abundância era momentânea e não se sustentaria”.
O hélio 3 não é nocivo, nem mesmo quimicamente reativo, e não é o único material que pode ser usado na detecção do nêutron. O departamento tem um equipamento mais antigo que detecta radioatividade, mas não diferencia muito bem uma bomba de combustível ou materiais inócuos, que naturalmente emitem radiação – como serragem para gato, telhas de cerâmica e bananas – e dá alarmes falsos com mais frequência.
No início deste ano, o Laboratório Nacional do Nordeste Pacífico, parte do Departamento de Energia, disse em um relatório que “nenhuma tecnologia de detecção atualmente disponível oferece estabilidade, sensibilidade e discriminação de nêutrons ou gama” que o detector de hélio 3 oferece.
Essa substância é usada para detectar neutros, partículas subatômicas que sustentam uma cadeia de reação em uma bomba ou reator. O plutônio, material mais usado na fabricação de bombas pela maioria dos governos que possuem armas nucleares, desprende intermitentemente os neutros, que são mais difíceis de ser escondidos pelos contrabandistas do que outras formas de radiação, (detectar a o combustível alternativo para a bomba, o urânio enriquecido, é um problema aparte e complicado, segundo especialistas).
O hélio 3 é um elemento raro na natureza, mas o Departamento de Energia acumulou um estoque substancial como bioproduto para a manutenção de armas nucleares. Essas armas usam trítio, que é uma forma de hidrogênio usada na bomba H, mas o hidrogênio empobrece e se transforma em hélio 3 em uma taxa de 5,5% ao ano. Por essa razão, o trítio das bombas deve ser removido, purificado e reabastecido em poucos anos. Ele é purificado a partir da remoça do hélio 3.
O suprimento também é muito necessário para pesquisas médicas e diagnósticos médicos.
O Departamento de Energia costumava produzir o trítio em reatores de seu centro de operações Savannah River Site, próximo a Aiken, na Carolina do Sul. Mas os reatores foram fechados após muitos problemas operacionais.
Depois, um reator de energia foi usado para fazer trítio, usando o mesmo método de Savannah River e quebrando outro material, uma forma do litio, com neutrons. Um dos fragmentos é o trítio, mas o projeto também enfrentou dificuldades técnicas.
Miller estimou que a demanda por hélio 3 será de cerca de 65 mil litros por ano até 2013, e que a produção total dos dois únicos países que o produzem de forma utilizável - Estados Unidos e Rússia - era de apenas 20 mil litros.
Em uma carta ao presidente Barack Obama, ele chamou a falta de material de "uma crise nacional" e disse que o preço saltou de US$ 2 mil por litro para US$ 100 mil nos últimos anos, o que ameaça a pesquisa científica.
(Por Matthew L. Wald, The New York Times / Último Segundo, 23/11/2009)