A preocupação com as alterações climáticas há muito deixou os laboratórios e se tornou prioridade para governos e empresas, que per cebem, cada vez mais, seus impactos na vida urbana. As mudanças no clima também afetam a saúde e a qualidade de vida dos moradores de grandes metrópoles, que já sentem na pele (e nos pulmões) seus efeitos negativos. Porém, o que pesquisadores revelam é que esses impactos serão muito mais prejudiciais para a saúde em cidades que não estão devidamente preparadas para lidar com eles.
Baseada nisso, a rede Urban Climate Change Research Network, ligada à Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, realizou um levantamento global que busca mostrar como essas mudanças climáticas, de fato, afetam as condições de vida das populações – e até que ponto as autoridades podem agir para prevenir ou minimizar os efeitos.
"A variação do clima traz impactos para a temperatura, os ventos e até mesmo a qualidade do ar e da água, podendo provocar enchentes, secas e, consequentemente, diversas doenças", explica a economista e pesquisadora do Instituto Oswaldo Cruz, Martha Barata, uma das colaboradoras do estudo. – Porém, a intensidade desses impactos vai variar de acordo com as condições sociais, ambientais e de infraestrutura dessas cidades.
Os danos que a mudança climática pode causar na saúde, direta ou indiretamente, são muitos. Segundo Martha, vários centros urbanos sentem os efeitos diretos no caso, por exemplo, de enchentes – que causam traumas físicos e psicológicos instantâneos – ou de ondas de calor que vêm resultando em mortalidades, especialmente entre idosos, em vários países da Europa.
Já os impactos indiretos vão desde a proliferação de vetores de doenças (como mosquitos e ratos) ao aumento de alergias e problemas ,em decorrência da diminuição da qualidade do ar. Além disso, as mudanças climáticas alteram até mesmo a agricultura, gerando movimentos migratórios de expulsão rural e contribuindo para agravar os problemas sociais dentro das grandes cidades.
"Às vezes, as condições naturais, como o relevo, também contribuem para agravar problemas climáticos", completa a pesquisadora. "É por isso que a Zona Sul do Rio de Janeiro, que tem uma topografia que permite maior circulação do ar, não sofre com a poluição do ar como São Paulo, por exemplo."
E no caso climático, vale um velho ditado: “É melhor prevenir do que remediar”. Segundo Martha Barata, uma adaptação de sucesso às alterações ambientais depende de iniciativas que preparem, desde já, o governo e a população das grandes cidades para lidar com seus impactos.
"Trabalhando problemas como a qualidade da água e do ar, o governo pode reduzir os danos com o tratamento de doenças como hepatite, dengue ou patologias respiratórias", defende Martha. "O impacto depende muito do local e da educação, e a preocupação com esses investimentos pode poupar gastos no futuro."
Nesse sentido, a pesquisa procura orientar essas decisões, propondo iniciativas que englobam todos os campos da vida nas cidades, desde melhorias em hospitais e profissionais de saúde a soluções sustentáveis em transportes e habitação. Para isso, Martha defende um planejamento urbano visando à otimização de recursos e logística:
"É preciso pensar em construir prédios mais sustentáveis, criar alternativas energéticas e pensar em danos ambientais, como os causados pelo uso de agrotóxicos ou usinas hidreléticas", defende a economista. "As ações, no sentido da saúde, devem levar em consideração o planejamento urbano, já que a saúde também envolve vários campos sócio-econômicos."
O Rio já tem uma iniciativa nesse sentido. No momento, a Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz), o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e a Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro (SEA) conduzem um estudo para avaliar indicadores de vulnerabilidade dos municípios em relação às mudanças climáticas. A ideia é que, a partir desses índices, as autoridades possam aplicar as políticas adequadas, contribuindo para melhorar a saúde e a qualidade de vida dos cariocas.
"É necessário um setor de saúde bem preparado para receber mudanças", conclui Martha. "O clima vem se tornando uma preocupação cada vez maior."
(Jornal do Brasil / AmbienteBrasil, 23/11/2009)