Estudos internacionais mostram que recursos repassados às comunidades em esquemas que compensam financeiramente pela preservação de recursos como água e o desmatamento evitado ainda não competem com atividades que causam destruição
Uma das propostas para preservar recursos naturais como água e florestas que vem ganhando a cada dia mais adeptos é compensar economicamente pessoas ou comunidades que possuem estas riquezas em suas terras para que as mantenham intocadas. A idéia parece simples: você convence pessoas que ganham a vida desmatando para plantar ou criar gado a não fazerem mais isso, e sim conservarem os recursos naturais de sua propriedade.
Em troca, você oferece uma certa quantia em dinheiro, criando assim um esquema de pagamento por serviços ambientais (PSA). Para que isso funcione, contudo, a renda paga precisa ser, no mínimo, igual à recebida com as atividades econômicas que degradam o meio ambiente.
Porém, estudos apontam que não é bem isto que vem acontecendo em diferentes esquemas espalhados pelo mundo. Os recursos financeiros repassados às comunidades ou proprietários ainda não são competitivos o suficiente com relação a outras atividades que causam a destruição, como a agricultura e a pecuária.
“A razão para o PSA existir é justamente compensar as comunidades para não fazerem certas atividades econômicas que coloquem em risco o meio ambiente, porém eles não estão sendo bem calculados”, alerta o professor da Universidade Nacional Australiana (ANU, na sigla em inglês), Luca Tacconi.
A falta de cálculos acurados sobre o valor correto a ser pago é uma das conclusões de uma pesquisa que vem sendo conduzida por Tacconi sobre os impactos no modo de vida das pessoas em projetos de PSA em andamento no Brasil, México, Indonésia, Filipinas, Uganda, Moçambique, Nicarágua e Colômbia.
Tacconi, que dirige a Escola Crawford de Gerenciamento e Desenvolvimento Ambiental da ANU, designou um grupo de pesquisadores nestes países para analisar os impactos no capital financeiro, humano, natural, social e físico (infra-estrutura) sobre as comunidades do esquema de PSA, que variavam deste a conservação do carbono estocado nas árvores até desmatamento evitado e proteção de recursos hídricos.
“A maioria dos impactos é positiva nestas cinco áreas, porém observamos que ainda faltam mais dados. Há um número muito limitado de informações sobre os esquemas de pagamento por serviços ambientais em funcionamento”, afirma Tacconi. O estudo ainda está em fase de finalização e os resultados serão publicados em forma de livro, em 2010.
Benefícios além do financeiro
Mas se o valor que estas comunidades ganham nestes esquemas é menor do que o obtido em atividades econômicas que desenvolviam anteriormente, por que elas continuam engajadas e dispostas a participar? “Os valores são aceitos pela comunidade provavelmente porque elas têm outros benefícios além do econômico”, comenta Tacconi. No caso brasileiro estudado, por exemplo, os agricultores do Projeto Proambiente se mostraram mais interessados em receber a assistência técnica para melhorar a produtividade que o pagamento por si só.
O Proambiente, desenvolvido com 4214 famílias em onze diferentes localidades da Amazônia desde 2003, tem como objetivo principal pagar aos agricultores que desenvolvem planos de atividades de manejo de longo prazo em suas propriedades, seguindo uma série de regras, que trariam benefícios como a redução do desmatamento, o aumento do seqüestro de carbono, a restauração das funções hidrológicas do ecossistema e a conservação da biodiversidade.
Uma das ameaças econômicas a este projeto, segundo o estudo de caso brasileiro, é a alta competitividade financeira do setor agrícola no país, que pode afetar o preço das terras e incentivar pequenas propriedades agrícolas a venderem ou adotar usos que necessitem a conversão de florestas. “Sob tais circunstâncias, os pequenos produtores podem demandar incentivos financeiros mais elevados para garantir a proteção dos serviços ambientais e o gerenciamento sustentável da terra”, afirma um rascunho do estudo ao qual a CarbonoBrasil teve acesso.
América Central e Caribe
Outro fator fundamental para o sucesso a longo prazo de PSA é o engajamento da população, tanto na hora decidir como ele funcionará na prática quanto durante a operação. Ao menos isto é o que demonstra um outro estudo de 27 esquemas de pagamento por serviços hídricos, realizado pelo Programa Facilitador de Florestas Nacionais da Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) em países da América Central e Caribe.
“Financiamento é essencial no começo, assim como um marco legal e vontade política”, completa o diretor regional do Programa Facilitador de Florestas Nacionais, Jhony Zapata, que apresentou o estudo durante o Congresso Mundial de Florestas, em Buenos Aires no mês passado.
Segundo esta pesquisa, em 80% dos casos analisados há uma compensação econômica. Na Nicarágua, por exemplo, um esquema de PSA paga US$ 36 anuais por hectare de floresta preservada, enquanto que na Republica Dominicana o valor pago é US$50 anuais por hectare.
Apesar disso, seis dos esquemas analisados não envolviam o pagamento em dinheiro para quem preserva o recurso natural. Em um deles, por exemplo, a proprietária da área com uma nascente de água aceitou manter sua terra intacta em troca do trabalho de manejo florestal na área feito pelas pessoas que se beneficiam com o recurso.
“Estes esquemas não vão solucionar os problemas hídricos ou florestais, porém podem ser um mecanismo estratégico de uso sustentável dos ecossistemas. Mas vimos que a sustentabilidade financeira é o elemento mais crítico para o sucesso”, destaca Zapata.
(Por Paula Scheidt, CarbonoBrasil, 17/11/2009)