Ao todo, 18 pessoas foram detidas sob a acusação de explorar uma espécie ameaçada de extinção em áreas de proteção ambiental. Grupo utilizava documentos frios para forjar a autorização para o corte e contava até com assessoria jurídica
Dezoito pessoas, entre elas funcionários públicos e autoridades ligadas ao poder executivo de Guaratuba, foram presas na manhã desta terça-feira (17/11) acusadas de integrar uma quadrilha que explorava a extração ilegal de palmito-juçara na região do litoral do Paraná. De acordo com a Polícia Federal (PF), o grupo explorava a espécie vegetal, ameaçada de extinção, no Parque Nacional Saint-Hilaire/Lange e em áreas de proteção ambiental de Guaraqueçaba e Guaratuba, e revendia como se o material fosse produzido em áreas autorizadas, por meio de documentos frios.
Ao todo, 19 mandados de prisão preventiva foram expedidos pela Justiça Federal, dos quais até as 18 horas faltava cumprir apenas um. Esse mandado era contra o vice-prefeito da cidade, José Ananias Santos Júnior. Entre os detidos estão o ex-prefeito José Ananias dos Santos, pai do vice-prefeito, o procurador-geral do município, Jean Colbert Dias, e o chefe da Circunscrição Regional de Trânsito (Ciretran), Mordecai Magalhães de Oliveira, além de Francisco Antônio de Oliveira, fiscal do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), e o sargento da Polícia Militar (PM) Valmir Santana Filho, que atua no Batalhão de Polícia Ambiental Força Verde.
Foram presos ainda cinco proprietários de sítios da região e quatro funcionários da empresa de Santos, entre eles a filha do ex-prefeito. As prisões ocorreram nas cidades de Antonina, Morretes, Paranaguá e Guaratuba, municípios do litoral do Paraná, e em Guaramirim, em Santa Catarina. Um dos mandados de prisão ainda seria cumprido no estado de São Paulo, mas o alvo foi encontrado e detido em Antonina.
De acordo com o delegado-chefe da PF em Paranaguá, Jorge Luís Fayad Nazário, o mentor do esquema era o ex-prefeito José Ananias dos Santos. Segundo Nazário, Santos é proprietário de uma empresa produtora de palmitos e, por meio da quadrilha, dava caráter legal para as extrações da espécie vegetal ameaçada de extinção. “Se parasse (em uma fiscalização) os fiscais iriam achar que era legal; ele andava com nota fiscal e autorização de corte”, diz o delegado.
Ainda segundo a PF, o procurador-geral do município entrava no esquema orientando os demais integrantes sobre como agir e o que dizer à polícia durante uma abordagem. “Ele estava dando assessoria jurídica para o grupo”, define Nazário. Já o chefe da Ciretran, sob solicitação de Santos, teria a função de conferir a propriedade de qualquer carro da cidade para descobrir se o veículo pertencia à PF, de modo a despistar uma possível fiscalização. Conforme apontam as investigações, o produto era vendido nos estados do Paraná, São Paulo e Santa Catarina.
As investigações começaram no início do ano, após uma prisão em flagrante, por extração ilegal de palmito, no Parque Nacional Sait Hilaire. Ao todo, 100 policiais federais participam da Operação Juçara, como foi batizada a ação desta terça, que conta ainda com a policiais militares e servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Além das prisões, foram cumpridos 20 mandados de busca e apreensão, que resultaram no recolhimento de notas fiscais, documentos e uma pequena quantidade de palmito.
Segundo a PF, os presos serão autuados por crime ambiental e formação de quadrilha. Seis deles, que têm formação superior ou são funcionários públicos, serão transferidos para Curitiba, enquanto os demais devem ficar detidos em delegacias de Morretes, Antonina e Paranaguá. Os ocupantes de cargo público responderão ainda por crime contra a administração. Sete das 18 pessoas que foram presas foram levadas para Curitiba. Os demais foram transferidos para Paranaguá, Antonina e Morretes.
Outro lado
A assessoria de imprensa da prefeitura de Guaratuba afirmou que a prefeita Evani Cordeiro Justus não vai se pronunciar sobre o caso e nem irá comentar o envolvimento do vice-prefeito, José Ananias Santos Júnior. Entretanto, a prefeitura divulgou nota oficial afirmando que não participa de nenhum crime ambiental e que não tem conhecimento de que agentes públicos municipais tenham participado. A nota diz ainda que a prefeitura irá aguardar o resultado do processo para tomar alguma providência.
Já Júlio Ricardo Araújo - advogado de Mordecai Magalhães de Oliveira, chefe da Circunscrição Regional de Trânsito (Ciretran) - falou sobre a questão. Araújo afirmou que ainda não conversou com o seu cliente, pois ele foi transferido para Curitiba, e que as únicas informações que tinha constavam no processo.
Segundo o advogado, não havia nenhuma comprovação de que Oliveira praticou crime ambiental. "O crime é ter cortado e comercializado o palmito e meu cliente não fez isso", afirmou. Araújo afirmou que o chefe da Ciretran foi envolvido no caso porque a PF grampeou uma ligação de um dos membros da quadrilha - que ele não soube informar qual - para seu cliente. De acordo com as informações do processo, essa pessoa pediu ao chefe da Ciretran que descobrisse quem era o proprietário de um veículo. "Esse procedimento é legal, e qualquer pessoa pode solicitar ao Ciretran", disse Araújo.
Leia a nota oficial da prefeitura de Guaratuba na íntegra
"Em resposta a operação da Polícia Federal, denominada “Operação Juçara” que realizou a detenção de diversas pessoas e que está a investigar dois agentes públicos municipais (o Vice-Prefeito e o Procurador Geral do Município), a Prefeitura Municipal de Guaratuba vem prestar o seguinte esclarecimento: Inicialmente, vale destacar que a prefeitura não coaduna com qualquer tipo de agressão ambiental. Da mesma sorte, a Administração não tem conhecimento de nenhum ato que desabone a conduta dos agentes públicos municipais no exercício de seus misteres.
Outrossim, é fato que as investigações atingem as atividades privadas dos envolvidos e que os documentos supostamente forjados, bem como as autorizações para o corte em áreas de proteção ambiental não são expedidas pela Prefeitura Municipal de Guaratuba e sim por órgãos estaduais. Logo, independente da evolução das investigações, pode-se afirmar, de forma categórica, que nenhum documento municipal foi forjado, bem como nenhum dos ilícitos supostamente praticados tinham relação direta ou indireta com a Administração Pública Municipal.
Assim, tendo em vista que os supostos ilícitos não se relacionam com a Administração Pública Municipal e invocando a presunção da inocência e o direito a ampla defesa e ao contraditório que norteiam o direito brasileiro é que o Executivo Municipal irá aguardar os esclarecimentos dos fatos através do devido processo legal, para então, tomar as providências cabíveis ao caso", diz a nota oficial.
(Por Célio Yano, Heliberton Cesca e Fernanda Leitóles, Gazeta do Povo, 17/11/2009)