É o que revelam dados de recentes pesquisas sobre variedade surpreendente do Plasmodium
De onde veio a malária humana: de frangos ou chimpanzés? Essa questão tem sido debatida nos últimos 50 anos: qual a origem do parasita da malária humana mais comum, o Plasmodium falciparum, que provoca a morte de no mínimo 1 milhão de pessoas anualmente. Uma nova pesquisa aponta para nossos parentes, os primatas.
“Esse é um dos extraordinários desafios médicos da humanidade”, observa Nathan Wolfe, diretor do Programa Global de Previsão Viral, com sede em São Francisco, Califórnia, e coautor do trabalho publicado recentemente on-line no Proceedings of the National Academy of Sciences. “Estamos diante talvez da mais devastadora doença da humanidade, mas sua origem permanece desconhecida.”
Alguns investigadores teorizam que o P. falciparum seja uma variante de um parasita encontrado em frangos, mas a maioria argumenta que as malárias de humanos e símios coevoluíram de um ancestral comum há vários milhões de anos.
Isso tudo aconteceu antes de Wolfe e sua equipe descobrirem a variedade surpreendente do parasita Plasmodium que infecta chimpanzés, chamado P. reichenowi, cuja variedade genética é muito maior que da espécie que ataca humanos. Como os parasitas mais antigos tiveram mais tempo para desenvolver variantes, a forma humana, menos diversificada, parece ser bem mais jovem que a dos chimpanzés.
Essa precocidade relativa foi confirmada quando pesquisadores dissecaram os detalhes do genoma da espécie. “O parasita da malária humana veio dos chimpanzés”, destaca Stephen Rich, coautor do trabalho e geneticista da University of Massachusetts, em Amherst. De fato, os dados genéticos sugerem que o P. falciparum é uma forma mutante do P. reichenowi.
“Quando observamos os padrões de ramificação, verificamos que humanos e chimpanzés tinham um ancestral comum há cerca de 5 a 7 milhões de anos. No entanto, não havia um exemplo em que a malária humana estivesse mais fortemente relacionada com pássaros ou frangos que com a malária dos chimpanzés”. A teoria decorrente supõe que um mosquito picou um chimpanzé e depois um humano, introduzindo o parasita na nossa linhagem há cerca de 10 mil anos, explica Rich.
Pesquisas recentes indicam que a malária é menos virulenta em seus hospedeiros chimpanzés. Essa observação também é consistente com a descoberta de que a versão simiana já existe há mais tempo. “Parasitas geralmente evoluem no sentido de obter uma associação vantajosa com seus hospedeiros”, observa Rich. “Tendo tempo suficiente, parasitas e hospedeiros equilibram suas armas de forma a viverem em paz”. Os chimpanzés e sua forma de malária tiveram, portanto, bastante tempo para chegar a bom termo.
Essa conclusão “é compatível com o que se sabe sobre a evolução do vetor da malária”, avalia Greg Lanzaro, diretor do Laboratório de Genética de Vetores da University of California, em Davis. “Mas é preciso juntar todas as peças para se entender o que acontece: a genética humana, a biologia dos mosquitos vetores que fazem a transmissão, e, certamente, o próprio parasita”. A descoberta é mais uma peça do quebra-cabeças.
Rich e seus colegas continuam coletando dados e sequenciando genomas na esperança de entender melhor como a malária afeta os chimpanzés e determinar quando ela se transferiu para os humanos. Enquanto isso, sua descoberta já tem repercussão na pesquisa médica. Sarah Tishkoff, geneticista da Escola de Medicina da University of Pennsylvania, acredita que as diferenças entre a suscetibilidade de humanos e primatas “pode fornecer pistas importantes para o desenvolvimento de vacinas e tratamentos mais eficazes”. Wolfe concorda e acrescenta que a descoberta “não se restringe apenas aos registros históricos”.
(Por Lynne Peeples, Scientific American Brasil, 26/10/2009)