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2009-11-17

Diariamente, as emissoras de rádio veiculam um anúncio que há muito tempo a população de Rondônia não ouvia: oferta de emprego.  Pela quarta vez em sua história, o estado está passando por um momento de euforia com a chegada não só do progresso, mas de oportunidades de trabalho para milhares de pessoas, com a construção das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio.  Mas as estatísticas mostram que o desenvolvimento, que ainda está começando, pode piorar os índices sociais da cidade.

Há pelo menos um ano, Porto Velho passa por uma grande transformação com a construção das usinas.  Prédios luxuosos estão transformando o visual da cidade.  A rede hoteleira, antes limitada, hoje é integrada por centenas de novos estabelecimentos espalhados pela cidade.  Para se encontrar uma vaga em algum deles, por exemplo, a espera pode chegar a meses, pois estão lotados com frequência.  Promotora da área de Urbanismo e Habitação do Ministério Público do estado, Aidee Luz alerta que o município não está estruturado para receber os impactos do desenvolvimento.  “Está havendo um crescimento desordenado”, diz.

Enquanto isso, o albergue público, destinado a quem vem se aventurar e não tem onde ficar, também está com sua lotação esgotada.  Em 2005, foram abrigadas 140 pessoas, subindo para 402 em 2008.  Até junho deste ano, já eram 263 e a contabilidade final pode ser bem maior, segundo as próprias autoridades, já que os números correspondem apenas às pessoas que procuram o serviço social.

No comércio e entre os motoristas de táxi, uma nota de R$ 100 era uma raridade até há pouco tempo, mas agora sua circulação é normal.  Diariamente, as agências bancárias lotam por causa da movimentação do dinheiro, mas a pobreza continua assustando.  Desde 2005, o Programa Bolsa Família cadastrou 19,5 mil novos beneficiários, o que representa quase 100 mil pessoas em situação de vulnerabilidade, sendo que 12 mil delas ingressaram na iniciativa do governo de janeiro a junho deste ano.

A circulação do dinheiro também aconteceu no primeiro grande momento para a economia de Rondônia, durante a construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré(1), no início do século 20.  Centenas de pessoas trabalharam na ferrovia, que chegou a ser usada durante vários anos, mas foi desativada por acumular prejuízos.  As últimas lembranças que restaram foram as locomotivas e as pontes de aço importadas da Inglaterra, que são peças de museu, ou estão espalhadas pelo meio da floresta.

O segundo ciclo de desenvolvimento de Rondônia foi a exploração da borracha.  Durante a década de 1940, milhares de nordestinos, incentivados pelo governo, foram à Amazônia trabalhar na extração de látex nos seringais, para ajudar os aliados na Segunda Guerra.  Os que não morreram na mata continuam pobres, como centenas de pessoas que estão migrando para Porto Velho em busca de ajuda.  Sem números oficiais, a constatação pode ser feita pelo próprio Bolsa Família.  Somente nos primeiro seis meses deste ano, 745 famílias vindas de outros estados e municípios transferiram seus cartões para Porto Velho, 130 a mais que em 2008.

Diagnóstico
A secretária municipal de Assistência Social, Benedita do Nascimento Pereira, reconhece os problemas, mas ressalta que a prefeitura já está realizando diagnóstico para enfrentar a situação.  “Temos que considerar as mudanças que Porto Velho vem sofrendo, mas estamos preparados para isso”, diz Benedita.  Segundo ela, as estatísticas mostram que já há uma atuação do município e em uma maior procura das ações sociais pelas pessoas.  “À medida que os serviços estão sendo feitos, o cidadão passa a requerê-los com mais frequência.”

“O ciclo de agora é bem parecido com outros momentos da história, como o garimpo”, observa o juiz Dalmo Antônio de Castro Bezerra, da Vara da Infância e Juventude.  O magistrado é uma das autoridades mais preocupadas com o aumento da prostituição, inclusive de menores, como ocorreu durante a exploração do ouro, na década de 1980, época em que Rondônia teve seu terceiro maior momento de desenvolvimento.  A situação atual não é diferente: de janeiro a junho deste ano, 98 menores passaram pelos abrigos públicos por estarem sendo explorados sexualmente.

1- Ferrovia do Diabo A Madeira Mamoré, como é conhecida em Rondônia, iria ligar Porto Velho a Guajará Mirim, na fronteira do estado com a Bolívia.  Sua construção começou em 1907 e terminou cinco anos depois.  A estrada era também lembrada como Ferrovia do Diabo, por causa da morte de dezenas de trabalhadores durante sua construção.  Foi desativada em 1966.

Prostituição explode em vilarejo
Quem chega durante o dia à vila de Jaci Paraná, no interior de Rondônia, conhece uma localidade pacata às margens da BR-364.  As crianças caminham pela rodovia rumo às escolas, os caminhões formam fila para abastecer no único posto do vilarejo e parte da população vai para o trabalho logo cedo.  Porém, com o anoitecer, Jaci Paraná se transforma.  As pequenas e empoeiradas ruas são tomadas por centenas de pessoas e carros.  A maioria é formada por trabalhadores da usina de Jirau.  Com a obra, além do desenvolvimento, chegaram também o medo, o receio e a violência.

Jaci Paraná, antes uma vila com pouco mais de 10 mil habitantes, é o mais antigo distrito de Porto Velho e um dos maiores exemplos dos problemas que as autoridades estaduais e municipais enfrentam hoje.  O índice de prostituição, causado pela chegada do progresso, aumentou no vilarejo, inclusive com a exploração de menores.  A situação está piorando a cada dia e se alastrando pela capital.  “Tivemos que mudar nosso foco de atuação e decidimos trabalhar em conjunto com outras instituições para enfrentar o problema”, afirma o juiz da Infância e Juventude Dalmo Antônio de Castro Bezerra.

Em Porto Velho, a situação não é diferente.  Há duas semanas, uma megaoperação policial fechou uma boate que funcionava no subsolo de um supermercado.  Dentro do estabelecimento, foram encontradas várias adolescentes, drogas e bebidas alcoólicas.  Em Jaci Paraná, além da atenção das autoridades, as próprias empresas estão ajudando a evitar que o problema se alastre.  Na semana passada, alertada por uma empresa, a policia interditou um prostíbulo que importava garotas de programa de outras localidades para atender os trabalhadores no dia do pagamento.

Muitos gastavam todo o salário em um único dia.  Nas buscas pelo local, foram encontrados documentos, pertences pessoais e até crachá, que eram deixados como garantia pelos trabalhadores.

(Rondonoticias / Amazonia.org.br, 16/11/2009)


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