A menos de um mês da Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas e às vésperas da prometida divulgação do que a delegação brasileira levará a reunião em Copenhague, o governo brasileiro anunciou a menor queda de desmatamento na Amazônia em 21 anos. Segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal (PRODES) do INPE, de agosto de 2008 a julho de 2009 foram desmatados 7.008 quilômetros quadrados (km2), uma queda de 45% com relação ao ano anterior.
“Isto traz nitidamente uma convicção de que o Brasil tem capacidade de reduzir o desmatamento e alcançar a meta de reduzir 80% o desmatamento até 2020”, afirma o diretor do INPE, Gilberto Câmara.
O potencial de corte de emissões de gases do efeito estufa (GEE) vindo desta ação seria de seis gigatoneladas até 2020, diz Câmara, ou 20% do que os países ricos (incluindo os EUA) alcançariam se assumissem a meta que colocaram na mesa até agora – cortar em 20% as emissões. “Isto tem um peso enorme. Só o compromisso com o corte do desmatamento já terá um impacto grande nas negociações.”
Esta conta, tendo como base os 19 mil km2 desmatados em 2005/2006, foi feita por Câmara antes mesmo de ter o número divulgado nesta quinta-feira e considerava uma queda de 10.500 km2 em 2008/2009. “Em um quadro otimista, se os países ricos aceitassem o corte de 40% de emissões em 2020 que é pedido por cientistas e pelo G77, a redução de emissões vindas do controle do desmatamento na Amazônia representaria 10% do total global cortado até aquele ano”, completa.
Para o coordenador de pesquisas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Paulo Moutinho, a queda expressiva do desmatamento, aliada ao Fundo Amazônia e a meta de redução de 80% do desmatamento, que está no Plano Nacional de Mudanças Climáticas, são ações que colocam o Brasil em uma posição vantajosa para tomar a liderança na COP15, como é chamada a Conferência de Copenhague, principalmente nas negociações envolvendo o mecanismo de Redução de Emissão do Desmatamento e Degradação (REDD).
“Com este conjunto, o Brasil destrói o principal argumento usado pelos países ricos para não assumirem metas ambiciosas e cria um constrangimento não só às nações desenvolvidas, mas também àquelas em desenvolvimento, em especial a China”, afirma.
A mesma opinião é compartilhada pela secretária-geral do WWF-Brasil, Denise Hamú. "Números do desmatamento, como os divulgados pelo presidente Lula, reforçam as credenciais brasileiras para liderar as negociações do clima e ser protagonista na construção de um novo modelo de desenvolvimento para o mundo, que respeite o meio ambiente e as pessoas", disse.
Valorizar a floresta em pé
Mariana Nogueira Pavan, do programa de mudanças climáticas do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (IDESAM), concorda que chegar com bons números e uma meta voluntária ajudará a pressionar por objetivos mais ambiciosos entre os países ricos.
Contudo, tanto Mariana quanto Moutinho lembram que há fatores externos a ação do governo que podem ter ajudado o Brasil a chegar nesta queda histórica do desmatamento que não podem ser ignorados, como a crise mundial que fez com que o preço das commodities variassem bastante e reduzissem a pressão de expansão do setor agrícola sobre a floresta, e o longo período de chuvas na região.
“Além disso, não podemos esquecer que há outros fatores na conjuntura nacional que podem vir a interferir no desmatamento futuro (levar ao crescimento), como a MP 458 (conhecida como MP da grilagem) e as alterações no código florestal”, comenta Mariana. O desafio agora, diz, é manter este quadro e, para isso, será preciso mais ações do governo além do ‘comando e controle’ que valorizem a floresta em pé, como o REDD e incentivos ao manejo florestal.
O diretor da campanha Amazônia do Greenpeace, Paulo Adario, diz que a pressão da sociedade civil conseguiu barrar as mudanças no código florestal que aumentariam o desmatamento, porém alerta que esta ameaça continua viva. “Vamos continuar vigilantes para que a tendência de queda seja consolidada e permita transformar em realidade o sonho do desmatamento zero na Amazônia”, afirmou.
Anúncio da posição brasileira
Está marcada para esta sexta-feira (13/11), às 15 horas, uma reunião do presidente Lula com ministros para definir o que o Brasil defenderá nas negociações em torno de um novo acordo climático em Copenhague. Até agora, o único compromisso que o país assumiu foi o corte de 80% nos índices que desmatamento na Amazônia até 2020. Isto significaria reduzir em 20% as emissões nacionais de GEE.
No início da semana, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que também será chefe da delegação brasileira na Conferência do Clima, afirmou que a meta geral poderá chegar a 40%, o que incluiria outros setores. “Nós somos o governo só vamos assumir o que é possível. Falta fazer avaliações consistentes porque temos que provar o que pode ser feito e ter políticas para fazê-lo. Não temos metas a cumprir, temos compromissos voluntários”, explicou a ministra. Moutinho espera que o governo não recue em colocar uma meta quantitativa. “Se não for assim, teremos a mesma dinâmica (em Copenhague) de todo mundo se negando a pagar a conta”, comenta.
O diretor de política ambiental da ONG Conservação Internacional, Paulo Gustavo Prado, critica a postura brasileira de não admitir que é um país industrial e espera que o governo assuma realmente uma meta e inclua outros setores, como o industrial e o energético. “O desmatamento é só o primeiro passo de uma estratégia mais longa, que deve incluir um plano econômico e social para as pessoas que vivem na Amazônia, planos de economia de energia e investimentos de novas tecnologias”, comenta.
Para Câmara, metas para outros setores é algo que o Brasil precisará fazer em algum momento e não por causa das negociações climáticas internacionais, mas por um projeto de uma nação, de uma potência ambiental. “Eu espero que tenhamos metas energéticas, por exemplo, mas as pessoas precisam entender que há um custo embutido nisso e hoje não há um consenso sobre isso”, afirma.
Ele explica que assumir uma meta para energia que reduza as termoelétricas teria que incluir a construção de Belo Monte e de usinas nucleares, por exemplo. “Por isso eu digo que o movimento ambientalista precisa decidir o que irá defender e não pode esperar que todas suas causas sejam adotadas pela sociedade”, afirma.
(Por Paula Scheidt, CarbonoBrasil, 13/11/2009)