Um artigo publicado pela revista Forbes em 5 de outubro de 2009, intitulado "O Bill Gates da Suíça" [1], pode dar a impressão de que o magnata suíço Stephan Schmidheiny é realmente um grande homem, um filantropo e um visionário que dedica sua vida promovendo causas como desenvolvimento sustentável, geração de riqueza e dignidade humana. Outras prioridades de Schmidheiny, de acordo com o site dele, incluem liberdade, democracia, igualdade e responsabilidade social. E, para completar, eu aposto que ele consegue caminhar na água também [2].
Esta riqueza que sustenta a filantropia de Schmidheiny, contudo, provém da exploração comercial do mortífero amianto. Nas fábricas da Eternit que pertenciam à bilionária família dele e em locais de trabalho onde produtos de amianto da empresa foram usados, exposições ocupacionais perigosas ocorriam diariamente e, em conseqüência disto, muitos operários contraíram doenças fatais.
Entre essas pessoas, está Don Lee Henderson, que contraiu mesotelioma trabalhando em uma subsidiária da Eternit na Califórnia. De acordo com o advogado dele, Steven Kazan, de Oakland, quando o júri concordou, de maneira unânime, com a causa de Henderson, a subsidiária da Eternit foi colocada em processo de falência para evitar o pagamento de uma indenização de US$ 2,5 milhões [3]. No Brasil, homens que trabalharam ao lado de Schmidheiny na fábrica de fibrocimento de amianto da Eternit em Osasco (SP) também morreram e o suíço nunca respondeu a um apelo pessoal feito por um deles, o operário João Francisco Grabenweger.
A Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA) expressou os sentimentos de muitos ex-empregados da Etenit em uma carta à Forbes, que ainda não a reconheceu e tampouco a publicou.
Nesta carta, o presidente da ABREA, Eliezer João de Souza, destacou que, se os membros da associação fossem entrevistados pela autora da matéria da Forbes, a jornalista Tatiana Serafin, "eles poderiam ter contado a opinião deles sobre a filantropia de Schmidheiny. Eles poderiam ter dito à jornalista como ele e a empresa da família dele expuseram os trabalhadores a uma substância reconhecidamente cancerígena e depois deixaram a cidade e os abandonaram. O fato de que pessoas que trabalharam na fábrica estão morrendo não parece afetar os Schmidheiny. Mesmo quando foi questionado sobre a atitude da Eternit em relação aos trabalhadores doentes de Osasco, durante um evento médico sobre câncer e amianto na Suíça em 2004, um representante de longa data da empresa respondeu que os expostos deveriam procurar ajuda ao governo, já que a companhia não devia qualquer obrigação a eles." [4]
Diante da proximidade do julgamento de Stephan Schmidheiny em Turim por sua suposta responsabilidade em expor milhares de italianos ao amianto da Eternit [5], a publicação do perfil enaltecedor feito pela Forbes parece casual demais: seria uma coincidência ou parte de uma estratégia da bem-afinada máquina de relações públicas do magnata?
Assumindo uma postura democrática e pró-ativa diante da controvérsia criada por este texto da Forbes, a ABREA decidiu organizar um debate público para 14 de novembro com o seguinte tema: "Stephan Schmidheiny: Santo ou Pecador?" E, como disse o presidente da associação na carta enviada à jornalista Tatiana Serafin, haverá um lugar na primeira fila reservado a ela.
(Por Laurie Kazan-Allen, IBAS / Ambiente JÁ, com tradução de Rodrigo Brüning Schmitt, 05/11/2009)
1 Serafin T. The Bill Gates Of Switzerland. Forbes Magazine. October 5, 2009. http://www.forbes.com/forbes/2009/1005/creative-giving-philanthrophy-bill-gates-of-switzerland.html
2 http://www.stephanschmidheiny.net/
3 Letter by Steven Kazan to Forbes. October 5, 2009. http://www.kazanlawblog.com/
4 ABREA & IBAS Joint letter to Forbes. October 13, 2009.
Kazan-Allen L. Secrecy and Subterfuge in Switzerland. October 5, 2004.http://ibasecretariat.org/lka_sec_sub_switz.php
5 http://en.wikipedia.org/wiki/Stephan_Schmidheiny