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incra assentamentos reforma agrária mst
2009-11-01

Belmiro Krieger ficou indignado com vistorias de terras feitas pela instituição

Ao julgar uma ação de desapropriação de terras, para fins da reforma agrária, no Rio Grande do Sul, o juiz federal Belmiro Krieger, de Santana do Livramento, ficou espantado com a forma como são conduzidas as vistorias de terras pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Em sua sentença sobre o caso, o juiz chegou a classificar o procedimento da autarquia federal como "um deboche à moralidade administrativa e um descalabro no trato da coisa pública".

A ação que provocou a indignação do juiz deu entrada na Justiça em junho. O Incra pedia a desapropriação de uma área de 7 mil hectares, formada por quatro fazendas, da família Antoniazzi, no município de São Gabriel.

Foram anexados ao pedido laudos agronômicos, elaborados em 2008 por especialistas do Incra, segundo os quais "os imóveis rurais em consideração revelam-se extremamente viáveis para a implantação de um assentamento rural, considerando seus potenciais agropecuários". Para essas terras, os técnicos do Incra propunham pagar R$ 39,8 milhões, ou R$ 5,6 mil por hectare.

Por se tratar de um valor alto para os cofres públicos, o juiz federal solicitou uma segunda perícia a fim de apurar o valor de mercado das terras. Os advogados do Incra protestaram, mas ele não recuou. E foi aí que o caso teve uma reviravolta: o Incra desistiu da ação. Motivo? Os imóveis em questão eram completamente inadequados para a reforma agrária. De acordo com um novo relatório entregue ao juiz, as terras ali eram rochosas e com solos superficiais.

Krieger aceitou o pedido de desistência e mandou devolver os R$ 39,8 milhões aos cofres públicos. No texto da sentença, porém, fez questão de manifestar sua estranheza quanto às conclusões totalmente opostas dos dois relatórios, salientando que o último deles foi preparado às pressas, em três dias, após o pedido da nova perícia.

Para os juiz, os fatos levam à "inexorável conclusão que a informação agronômica constante nos laudos de 2008 é no mínimo grosseiramente errada, podendo até mesmo ser falsa, desenvolvida para fraudar os cofres públicos, seja para enriquecimento ilícito de servidores inescrupulosos ou outros fins escusos, como suprimento de fundos para custeio de campanhas políticas".

Ele também destaca que, segundo a perícia que encomendou, os preços de mercado das terras são bem mais baixos do que os apontados pelo Incra. Em São Gabriel, paga-se R$ 5,3 mil pelo hectare de terra de qualidade muito boa. Terras ruins não valem mais que R$ 3 mil.

Apuração
Procurado pelo Estado de S. Paulo, o superintendente do Incra no Rio Grande do Sul, Mozar Dietrich, disse que já está sendo apurado se houve erro, má-fé, imprudência, imperícia ou negligência dos agrônomos que prepararam os laudos. Os responsáveis podem sofrer punições.

Dietrich defendeu, no entanto, a planilha de preços elaborada pelo Incra. Observou que foi preparada em abril de 2008, quando havia muita procura de terras na região por indústrias de celulose para o plantio de eucaliptos. A perícia de Krieger, notou o superintendente, ocorreu em 2009, quando a crise financeira mundial freou os negócios de celulose.

O superintendente do Incra enfatizou que a decisão de desistir do negócio foi da instituição e lamentou que o juiz tenha usado o fato para atacar o Incra. "Ele exagerou nos termos que usou. Também não procede a acusação de que desistimos por causa do pedido de perícia."

Na versão do Incra, a desistência foi por causa de um técnico do Ministério do Desenvolvimento Agrário, destacado para assessorar a implantação do assentamento. Foi ele quem alertou para os problemas da terra e assinou o segundo relatório enviado ao juiz.

O imbróglio tem outros dois pontos importantes. Segundo o Incra, depois do alerta do técnico do ministério, descobriu nos arquivos da autarquia um terceiro relatório, de 2001, que já dizia que as terras eram totalmente impróprias. No total, portanto, foram três relatórios. O outro fato ocorreu em setembro, quando integrantes do Movimento dos Sem-Terra invadiram as fazendas, exigindo sua destinação para a reforma agrária. Só saíram depois que o Incra disse que já havia desistido da área, definitivamente.

(Por Elder Ogliari e Roldão Arruda, O Estado de S. Paulo, 01/11/2009)


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