O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinará na próxima semana um pacote ambiental para "resolver 70% dos temas" que opõem ruralistas e ambientalistas nas discussões para a reforma do Código Florestal Brasileiro, em vigor desde 1965.
Às vésperas da reunião da ONU sobre o clima em Copenhague, na Dinamarca, um conjunto de decretos, portarias e medida provisória deve instituir instrumentos polêmicos como a "cota de reserva legal" e a permissão para a aquisição, e posterior doação à União, de terras em unidades de conservação estaduais ou federais por produtores rurais. "É uma guerra de 20 anos que só se resolve com legalização das áreas", disse Minc ao Valor. "Não quero anistiar nem afrouxar, mas facilitar a vida e dar condições ao produtor de cumprir a lei".
O "acordo" fechado no governo por Minc teria apoio da Casa Civil e do Ministério do Desenvolvimento Agrário, mas ainda enfrenta forte resistência no Ministério da Agricultura. Sem contar a oposição de ambientalistas e ruralistas da Comissão Especial de reforma do Código Florestal na Câmara.
Na tentativa de angariar simpatias externas, Minc informou que o "acordo" exclui qualquer possibilidade de anistia total como direito adquirido contra desmatamentos anteriores, a delegação de poderes na esfera ambiental aos Estados, a redução da reserva legal na Amazônia de 80% para 50% e a soma dessa reserva legal a Áreas de Preservação Permanente (APPs) em todos os casos. "Sobre isso não tem papo. É inaceitável. E temos o apoio da Casa Civil. Se os ruralistas aprovassem algo disso em uma lei, o Lula vetaria", afirmou.
O amplo programa de legalização ambiental vai ampliar em seis meses o prazo que acabaria em 11 de dezembro para a regularização ambiental das propriedades rurais. Assim, pela nova proposta, a adesão voluntária dos produtores proporcionará um prazo de 20 anos para o cumprimento dos compromissos que vierem a ser assumidos. "Isso já está no Código Florestal. O produtor vai registrar e assinar um compromisso da alternativa que melhor lhe servir", afirma Minc.
O texto alinhavado pelo ministro, no grupo de trabalho coordenado pela Casa Civil, permite atividades em encostas, à exceção do plantio de cana-de-açúcar e grãos, além da criação de gado. Estariam mantidas, assim, as plantações de café, maçã e uva nessas regiões. As demais atividades ficaram proibidas. O documento também admite a soma da reserva legal a APPs em áreas de até 400 hectares na Amazônia ou 150 hectares nas demais regiões do país. "Queriam para todo mundo, mas não dá para fazer no Cerrado", diz Minc.
A proposta prevê, ainda, a averbação simplificada e recomposição de florestas nas mesmas bacias hidrográficas ou biomas onde está a situada a propriedade, e não mais apenas em microbacias do mesmo Estado. "Isso muda conceitos e amplia chance de compensar fora. É uma coisa enorme", afirmou Minc. Na Mata Atlântica, disse ele, há 24% de vegetação que poderiam ser usadas no sistema.
O texto do ministro do Meio Ambiente também institui a "cota" de reserva legal, por meio do qual seria possível a um produtor comprar "excedentes" de florestas preservados por outros. "Premia quem preserva e permite compensação. E nós preservamos tudo", disse. Além disso, as medidas permitiriam ao produtor comprar terras ainda pendentes de indenização pelo Estado dentro de parques e reservas como forma de compensação florestal. "Eles comprariam e doariam ao Estado. Resolvemos dois problemas com uma coisa só", explicou.
Mas a boa vontade de Carlos Minc parece ser insuficiente para garantir uma trégua. "Não tem acordo em metade desses pontos. Somos radicais contra cota de reserva porque isso distorce tudo ao transformar biodiversidade em dinheiro", apontou o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Sarney Filho (PV-MA). Autor da proposta de um Código Ambiental, o deputado ruralista Valdir Colatto (PMDB-SC) disse que o acordo com o Palácio do Planalto não previa nenhum desses pontos. "Nosso acordo com o governo era aguardar os debates da comissão especial até fim de novembro. E o ministro Alexandre Padilha sabe disso", afirmou, em referência ao ministro das Relações Institucionais.
A estratégia dos ruralistas é levar as discussões até a véspera do novo decreto de crimes ambientais, previsto para vigorar em 11 de dezembro. O objetivo é forçar o governo a adiar as exigências e entrar 2010 debatendo as mudanças no Código Florestal para garantir a bandeira eleitoral em suas bases.
Pressionado na esfera política, o ministro Carlos Minc admitiu as dificuldades para costurar um acordo palatável aos dois lados. "Se cedermos aos ruralistas, nos desmoralizamos antes de Copenhague. Se dermos vitória total aos ambientalistas, manteremos todos na ilegalidade", disse.
Diante da discórdia geral, Minc afirma que o governo optou por um "equilíbrio" no tema. "Se desagradar um pouco de um lado e de outro, estaremos no bom caminho", comentou. E atacou os parlamentares por uma falta de compromisso em superar de vez o assunto ambiental: "No Congresso, parece que estamos em outro planeta."
(Valor Econômico / Amazonia.org.br, 28/10/2009)