Faltam 42 dias para a conferência de Copenhague, na Dinamarca, e a previsão do clima não é das melhores. Tudo indica que resultará em fracasso. Como em Poznan, Polônia, há um ano. Como em Bali, Indonésia, há dois anos. Como em Kyoto, Japão, há 12 anos. Se você não faz ideia do que está em jogo nessas reuniões da ONU, é porque desembarcou agora na Terra. É o seu futuro que está em jogo -tanto o do leitor quanto o do planeta.
Nesses encontros, com delegações de quase duas centenas de países, debate-se o que fazer para prevenir os efeitos da provável mudança climática, decorrente do acúmulo de gases do efeito estufa na atmosfera. Na origem da infindável discussão está a Convenção do Clima das Nações Unidas, adotada em 1992 no Rio. A partir dela desenvolveu-se uma burocracia fantástica e uma linguagem própria, que poderia ser apelidada de "kyotês", em que despontam jargões como "mitigação" e "adaptação".
Mitigação se refere ao esforço para aliviar (mitigar) as emissões de gases do efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2). Eles são produzidos por várias atividades, como geração de energia elétrica, propulsão de veículos, agricultura, desmatamento etc. Países ricos e pobres se engalfinham para empurrar a conta uns aos outros. Partem do princípio de que reduzir emissões prejudica a economia. Estão certos no curto prazo e provavelmente errados no longo, porque nenhuma economia sobrevive sem os insumos que a natureza lhe fornece de graça: chuvas no período certo, rios regulares, insetos polinizadores, vegetais para segurar a erosão etc.
Se mitigar é prevenir, adaptar é remediar. Vale dizer, preparar-se para alguns impactos inevitáveis, de acordo com previsões de especialistas e com tendências observadas. Se a elevação do nível dos mares (milímetros, até agora) continuar, cidades costeiras terão sua infraestrutura ameaçada, por exemplo. Mudanças de regimes de chuvas bagunçarão a agricultura. Insetos transmissores de doenças podem mudar de região.
O Protocolo de Kyoto, adotado em 1997, previa uma redução modesta das emissões, e por esforço só de países mais ricos: 5,2% de corte, em média, até 2012, sobre os níveis de 1990. Até 2007, só 3,9% haviam sido obtidos -mesmo assim, porque a economia do Leste Europeu foi para o saco.
Em "kyotês", essas "economias em transição" viram suas emissões recuarem 37% entre 1990 e 2007. O resto avançou 11,2%, mais que o dobro do que deveriam reduzir. Os EUA, que nunca ratificaram Kyoto, progrediram 16,8%. Fizeram bonito só nações europeias como a Alemanha (-21,3%).
Gigantes como China, Índia e Brasil ficaram fora das metas, mas sofrem pressão para assumir compromissos. Por mais que a responsabilidade histórica recaia sobre os ricos, que emitem carbono aos borbotões há mais de um século, a cobrança faz algum sentido. Logo será impossível conter o aquecimento global num limite razoável (2C) sem nossa contribuição.
Não há nem esboço de acordo, a 42 dias de Copenhague. É fácil prever -ainda que deprimente- que fracasso é o resultado mais provável. Já se fala que da Dinamarca sairá quando muito uma declaração política. Nada. Não é por outra razão que alguns militantes ambientalistas já se movimentam para organizar uma nova cúpula do ambiente, como a Eco-92 realizada no Rio. Houve uma Rio+10, em 2002, em Johannesburgo, da qual ninguém mais se lembra, mas não custa sonhar. Quem só pensa em Rio 2014 e Rio 2016 deveria começar a batalhar também pelo Rio 2012.
(Por Marcelo Leite*, Folha de S. Paulo, 25/10/2009)
* Marcelo Leite é autor de "Darwin" (série Folha Explica, Publifolha, 2009) e "Ciência - Use com Cuidado" (Editora da Unicamp, 2008). Blog: Ciência em Dia (cienciaemdia.folha.blog.uol.com.br). E-mail: cienciaemdia.folha@uol.com.br