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rio paraíba do sul contaminação com agrotóxicos basf
2009-10-26

Paraíba do Sul sofre com a redução do número de espécies de peixes

Quase um ano depois de um dos piores acidentes de sua história - o vazamento do pesticida endossulfan -, o Rio Paraíba do Sul ainda agoniza. Os peixes rarearam. Espécies como dourado, piau vermelho e cascudo preto e pintado não foram mais vistas. Em um esforço com empresas privadas para recuperar a vida no rio, o governo iniciou um programa para devolver ao Paraíba do Sul 1 milhão de peixes em dois anos. Até agora, 90 mil filhotes (alevinos, no jargão técnico) foram lançados, mas eles só começarão a procriar em dois anos.

O acidente aconteceu na noite de 18 de novembro, durante procedimento de envase do pesticida na Servatis, em Resende, no sul fluminense. Um caminhão com 30 mil litros da substância seguiu da área de sintetização para o tanque. No processo, uma mangueira se soltou, despejando o pesticida em um dique de contenção. "Uma válvula de descarte do dique de águas pluviais dava passagem. O operador não percebeu porque não estava presente. Fizemos a testagem assim que percebemos a coloração leitosa da água do dique", relembra o gerente de Meio Ambiente da Servatis, Guilherme Gama.

Oito mil litros de endossulfan vazaram e percorreram os 500 quilômetros do rio, entre Resende e a Praia de Atafona, em São João da Barra, no norte fluminense, onde está localizada a foz do Paraíba do Sul. Por todo o caminho, o veneno deixou centenas de toneladas de peixes mortos.

Esses peixes se estenderam por 32 quilômetros da orla de São João da Barra. Em Barra Mansa, pescadores retiraram 3 mil quilos de dourados, curimbas e piaus. "Foi a única vez na minha vida que peguei um piauçu de 20 quilos. Só que ele já estava morto", lamenta o pescador Sérgio Coelho, de 56 anos, presidente da Associação dos Canoeiros Defensores da Natureza de Barra Mansa.

"O endossulfan atinge o sistema nervoso central dos peixes, causando paralisia nos órgãos internos e matando os animais", explica o biólogo Guilherme Souza, diretor técnico do Projeto Piabanha, que se dedica ao repovoamento dessa espécie no Paraíba do Sul.

O impacto foi ainda maior porque o acidente ocorreu no momento da piracema, quando os peixes sobem o rio para se reproduzir. "Esse acidente foi muito mais grave do que o vazamento de uma indústria de papel, em 2003. Naquela época, o rio foi atingido por matéria orgânica. Dessa vez, foi um produto extremamente tóxico, que dizimou a vida por onde passou", afirma o biólogo.

Pesca proibida
A pesca permanece proibida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Cerca de 1,7 mil pescadores vinham recebendo um seguro, mas o pagamento foi suspenso em agosto. "Os pescadores voltaram ao rio, mas pegam peixes abaixo da medida, peixes jovens que seriam reprodutores em um ano", diz Souza. O Estado procurou o Ibama e o Ministério do Trabalho, mas não obteve resposta sobre a interrupção do pagamento.

"Não temos um estudo, mas houve uma grande redução na população de peixes do Paraíba do Sul, principalmente das espécies mais sensíveis", diz o chefe do serviço de monitoramento no Médio Paraíba do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), José Roberto de Souza. Em maio, quando exames mostraram que já não havia mais sinais do agrotóxico na água nem nos sedimentos, foi traçado o plano de repovoamento do rio, que conta com a participação de empresas como Light e Votorantim.

O último lançamento do ano, ocorrido na semana passada, foi financiado pela Servatis. A empresa soltou 2 mil piabanhas e 20 mil curimatás, em um acordo firmado que não exime a companhia da multa de R$ 33 milhões, ainda não paga. "Retomamos programas de recuperação da mata ciliar e o monitoramento do rio. Não podemos esperar que morra peixes para saber que o rio vai mal", afirma o vice-presidente do Inea, Paulo Schiavo.

A Servatis também anunciou investimento de R$ 1,2 milhão para a construção de cinco tanques para a produção de filhotes de peixes e a criação de cinturão verde ao redor da fábrica, entre outras ações. "Episódios como esse não podem se repetir. Se o rio continuar a ser bombardeado por vazamentos das indústrias ou pelo esgoto sem tratamento, em breve, a única água que teremos será as de nossas lágrimas de lamento, como me disse um menino de 11 anos no momento do acidente", comentou Roberto Silva, diretor de Meio Ambiente da Associação de Canoeiros de Barra Mansa.

(Por Clarissa Thomé, O Estado de S. Paulo, 25/10/2009)


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