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algas impactos mudança climática ecossistemas
2009-10-26

O estado do tempo era ideal para nadar nas águas do lago Michigan neste verão. Mas, por muitos dias, as gaivotas foram os únicos seres vivos que habitaram a praia, arrancando mexilhões-zebra de uma lama verde e grossa que o cobria totalmente. A formação deste raro tapete se deveu à Cladophora, alga nativa que nos últimos anos sofreu uma metamorfose, passando de uma espécie de comportamento dócil a um monstro verde que contamina água potável e praias, e que causa obstrução de encanamentos de insumo industrial no lago Michigan, um dos cinco Grandes Lagos, localizados entre EUA e Canadá.

Os cientistas ainda não descobriram a razão do crescimento excessivo da Chladophora. O lago está tão pressionado do ponto de vista ambiental que qualquer um, ou todos, de uma série de fatores pode ser a causa, afirmam. “É fácil ver o que ocorre. É difícil compreender o motivo”, disse à IPS J. Val Klump, diretor do Instituto de Tecnologia Aquática e Pesquisas Ambientais de Wisconsin (conhecido pela sigla em inglês Water, que também significa água) dos Grandes Lagos.

Os principais suspeitos são a mudança climática (que elevou a temperatura do lago e baixou os níveis da água) e as mudanças generalizadas no ecossistema lacustre, criados pelos invasores mexilhões-zebra e mexilhões “quagga”, milhões dos quais agora cobrem o fundo do lago. “Estes sistemas são muito sensíveis à mudança climática”, disse Klump. Esta não é a primeira vez que a Cladophora, cujo crescimento é estimulado pelo fósforo e por outros nutrientes, se transforma em uma planta incômoda. Também cresceu excessivamente nos anos 60 e 70, até que deixou de se jogar no lago o excedente de fósforo, produto derivado da indústria e das casas. Com o fósforo sob controle, a Cladophora também ficou controlada, até cinco anos atrás.

“Algo mudou”, disse à IPS Paul Horvatin, diretor de controles da federal Agência de Proteção Ambiental dos Grandes Lagos, à bordo do barco de pesquisas Lake Guardian no lago Michigan. O governo de Barack Obama se comprometeu a dar US$ 500 milhões ao longo de 10 anos para recuperar os Grandes Lagos, e parte da primeira cota de US$ 475 milhões será usada para investigar as espécies invasoras, disse Horvatin. Os cinco Grandes Lagos ocupam 244 mil quilômetros quadrados, que se estendem pelos Estados Unidos e o Canadá, a apenas 2.400 quilômetros da plataforma gelada polar.

Os lagos permitem a passagem de embarcações para o oceano Atlântico, e mantêm algumas das mais ricas reservas pesqueiras comerciais do mundo. Além disso, cerca de 40 milhões de pessoas recebem água potável dos Grandes Lagos. Ao mesmo tempo, os lagos estão contaminados com produtos químicos e metais pesados, particularmente os sedimentos do fundo, após séculos deindustrialização. Oslagos são sistemas fechados e conservam os contaminantes. Estima-se que 43 baías dos Grandes Lagos são lixões altamente tóxicos. “A boa noticia é que estamos vendo uma redução dos compostos químicos bifenilos policlorados e diclorodifeniltricloroetanos. A má é que não diminuíram o suficiente”, disse Horvatin.

Inclusive hoje, grandes quantidades de esgoto fluem de áreas urbanas como Milwaukee para o lago Michigan, por causa de drenagens sobrecarregadas durante chuvas muito fortes. Em um dia normal, 30% dos líquidos lançados desde Milwaukee dão positivo nas análises de contaminação com fezes humanas, disse Klump. O lançamento de esgoto nos lagos aumenta, na medida em que a mudança climática faz com que haja mais dias de chuvas fortes no Meio Oeste, segundo o Instituto Nelson da Universidade de Wisconsin.

O Meio Oeste está esquentando em geral, com dias de calor mais extremo no verão, invernos mais quentes, com menos neve e menos gelo nos Grandes Lagos. Segundo o Instituto Water, agora os invernos em Wisconsin – que limita com o Lago Michigan – são 16 graus mais quentes do que antes de 1980. em 2030, a quantidade de neve primaveril terá caído pela metade, e o lago poderá ficar sem gelo durante boa parte do inverno, segundo modelos do Escritório Nacional de Administração Oceânica e Atmosférica.

A água do Michigan já está 58 centímetros abaixo do normal, perto de seu menor nível, devido à evaporação causada pelo calor estival, segundo o Instituto Nelson. O lago Superior costuma ter uma cobertura gelada de 60% de sua superfície durante a maior parte do inverno, mas atualmente esse gelo ocupa 20%, disse Klump,. “O importante é que até meados do final do século estaremos em uma zona climática diferente”, acrescentou. O clima do Meio Oeste será como o do Estado de Arkansas, no sul, ressaltou.

Para o zoólogo Brina Shuter, do Ministério de Recursos Naturais da província canadense de Ontário, estas mudanças podem fazer com que peixes de água fria, com salmão, truta de lago e truta de rio, se mudem para o norte, e que sejam substituídos por peixes de água quente com carpa e bagre. Atualmente, a autóctone borboleta azul de Karner, espécie ameaçada que prospera no habitat natural do Parque Nacional Dunas de Indiana, no extremo sul do lago Michigan, está com problemas, segundo a União de Cientistas Comprometidos. A neve isola os ovos da borboleta nos invernos gélidos, mas agora sobrevivem menos porque há menos neve.

A temperatura, o nível da água e outras mudanças no lago Michigan criaram o habitat perfeito para que novas espécies como a totora híbrida substituam as juncas que rodeiam Green Bay, uma das reservas pesqueiras mais ricas do mundo, segundo o Instituto Water. Os mexilhões-zebra quagg, originários da Rússia e da Ucrânia, abundam no lago Michigan, a ponto de nos últimos 19 anos terem alterado drasticamente esse ecossistema. Os mexilhões são agressivos comedores de filtros, e nos últimos cinco anos sua atividade mudou as águas tipicamente barrentas e ricas em plâncton, clareando-as. Agora a luz penetra no lago, chegando a zonas que nunca atingira antes.

Os mergulhadores se encantam com esta mudança, como a Cladophora, cujo crescimento é estimulado pela luz. Enquanto filtram, os mexilhões liberam altas quantidades de fósforo, o que também pode estar ajudando no crescimento da Cladophora. A variedade quagga libera ainda mais fósforo, na medida em que aumenta a temperatura, com vem ocorrendo no lago Michigan, disse Harvey Bootsma, cientista do Instituto Water. O plâncton é uma rica fonte de alimento para muitos peixes nativos. Como os mexilhões consomem grandes quantidades do mesmo, “os peixes estão afinando”, disse Bootsma.

Qualquer um que esteja perto de uma praia obstruída pela Cladophora pode dizer que há algo errado com o lago Michigan. Quando as algas se decompõem “fedem como um chiqueiro”, segundo Bootsma. E isso não é tudo. A quantidade de algas mortas na praia ameaça a qualidade da água. A corrente as arrasta e com elas chegam os mexilhões-zebra. Gaivotas e outras aves passeiam sobre as algas, comendo os mexilhões e depositando matéria fecal com altas concentrações de bactérias tóxicas Escherichia coli. Todo esse caos apodrece sob o sol e cheira mal, e as bactérias contaminam a água, explicou Bootsma.

Os pássaros também sofrem. Em 2007, mais de 17 mil deles morreram de botulismo, causado por um bacilo que habitualmente vive em pequenas quantidades na areia do lago, sem causar danos, mas que os mexilhões concentram, disse Horvatin. Ele e outros pesquisadores esperam encontrar respostas logo. “Tentamos olhar toda a cadeia alimentar e ver como modificou com o tempo”, disse.

(Por Adrianne Appel, IPS / Envolverde, 23/10/2009)

* Este artigo é parte de uma série produzida pela IPS (Inter Press Service) e IFEJ (Federação Internacional de Jornalistas Ambientais para a Aliança de Comunicadores para o Desenvolvimento Sustentável (www.complusalliance.org).


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