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2009-10-25

Parte dos moradores defende o desenvolvimento trazido pelas obras, mas outros temem o impacto ambiental

Os ventos desenvolvimentistas que sopram pelos lados do litoral norte de São Paulo têm revirado a rotina dos moradores da região. Além das obras da Petrobrás, no Campo de Mexilhão, na Bacia de Santos, o projeto de expansão do Porto de São Sebastião virou o assunto obrigatório nas rodas de bate-papo da população.

Alguns defendem o empreendimento, de R$ 5 bilhões (incluindo as vias de acesso), que traria emprego, renda e prosperidade, como avalia o presidente da Associação Comercial e Industrial de São Sebastião, Eduardo Cimino. Outros não se comovem com as cifras bilionárias, como Israel Souza Freitas, um caiçara nascido na Ponta do Araçá, em São Sebastião.

"Os prejuízos ambientais e sociais da obra não vão compensar os benefícios", avalia o morador, de 45 anos, que conhece o projeto - em fase de licenciamento ambiental - apenas pela imprensa. "Eles já começaram a destruir o local quando fizeram o primeiro aterramento no porto e não usaram para nada. Isso reduziu de forma expressiva a quantidade de peixes. Quando era criança, pegava camarão a rodo. Agora, o volume é muito menor."

Um dos pontos mais polêmicos da expansão do porto é exatamente a cobertura do Mangue do Araçá - onde Freitas nasceu e sua mãe vive até hoje -, um dos últimos viveiros de peixes e crustáceos da região. O projeto original, que previa o aterramento do local, foi modificado para diminuir o impacto ambiental.

A Companhia Docas de São Sebastião, administradora estadual do porto e responsável pela expansão, optou por uma tecnologia em que a laje do terminal é construída sobre estacas, mantendo o fluxo de água e os peixes no local. Isso permitirá também que o porto avance 50 metros no mar, deixando um espelho d"água próximo às comunidades do Araçá. Ainda assim, ambientalistas temem que a falta de luz prejudique a procriação das espécies nativas.

Com o avanço no mar, a área do porto passará de 400 mil para 1 milhão de metros quadrados, diz o presidente da Companhia Docas, Frederico Bussinger, um dos idealizadores da retomada do projeto. Ele explica que todos os investimentos serão feitos pela iniciativa privada, por meio de concessão pública ou Parceria Público-Privada (PPP). "No momento, o governo prepara a modelagem que será usada no processo."

A expansão vai criar um novo terminal de contêineres, outro para movimentação de granéis líquidos (etanol) e outro para granéis sólidos. Além disso, serão quatro berços para receber navios de contêineres, dois para etanol e dois para cargas múltiplas. Hoje, o porto tem apenas um berço para atracação de navios de maior porte e quatro para pequenas embarcações.

Com o avanço do terminal rumo ao canal, os píeres contarão com calado natural entre 16 e 22 metros de profundidade, o que vai inserir São Sebastião na rota da nova geração dos meganavios, chamados pós-panamax. Santos, o maior porto da América Latina, ainda não suporta esse tipo de embarcação.

Bussinger destaca que as obras de expansão vão permitir capturar cargas do Vale do Paraíba (SP), cuja demanda representa entre 500 mil e 700 mil contêineres. "Se somarmos Campinas, teríamos 1,5 milhão de contêineres", diz o executivo, referindo-se ao fato de a carga vir pela Rodovia Dom Pedro, sem passar pela congestionada capital paulista. Indo um pouco mais longe, o executivo sonha em atrair até mercadorias do sul fluminense. "A demanda por lá é de 933 mil contêineres."

Toda essa empolgação de Bussinger, porém, causa arrepios em alguns moradores de São Sebastião e Ilhabela. Eles temem que a paisagem do litoral, que cada vez mais se consolida no roteiro do ecoturismo mundial, seja comprometida com o vaivém dos porta-contêineres.

"Os navios da Petrobrás já causam enorme contraste com a natureza da região (no ano passado, o porto recebeu 800 navios de grande porte). Imagine com a expansão prevista pelo governo paulista e um monte de navio de contêiner no canal", afirma Marcelo Batista de Oliveira, um nativo de Ilhabela.

Ele conta que alguns transtornos já começam surgir. "Esses dias havia embarcações fundeadas bem em frente ao centro da cidade para manutenção. Isso não é bom para o turismo nem é permitido." Durante algum tempo, diz o morador, a população ficou alheia aos planos do governo. "Mas agora todos querem participar. Virou um debate acalorado entre moradores e donos de casas em Ilhabela."

Conhecida como a capital nacional da vela, a cidade teme que o novo conceito do porto, especializado em contêineres, atrapalhe os torneios internacionais do esporte. "Não somos contra a expansão, só não queremos um estacionamento de contêineres", afirma o presidente do Instituto Ilhabela Sustentável, Georges Henry Grego.

Imagine para a mãe de Israel, na Ponta do Araçá, cuja vista de sua janela deixará de ser uma sossegada prainha para ser um amontoado de contêineres. "Já coloquei a casa à venda. Não dá mais para ficar aqui. O triste é que essa casa já pertenceu a meus tataravós."

(Por Renée Pereira, O Estado de S. Paulo, 25/10/2009)


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