A cadelinha do contêiner da Avenida Rio Branco, que até agora rende cartas na seção do jornal, se salvou. Alguém de mau coração a abandonou semana passada em um contêiner verde, do lixo orgânico, mas ela foi encontrada por funcionários da Codeca que faziam a limpeza e a manutenção dos equipamentos antes que fosse engolida e triturada pela coleta mecanizada, aquela em que o caminhão levanta o contêiner e despeja o que tem dentro em seu interior. Foi assim que, tudo leva a crer, três pessoas foram mortas, e seus corpos apareceram com traumatismos de todo tipo no Aterro São Giácomo.
A cadelinha, portanto, teve melhor destino do que essas três pessoas que dormiam dentro de contêineres verdes quando foram engolidas pelos equipamentos mecanizados.
Aliás, o que foi feito no caso da cadela é uma providência simples para evitar novas mortes de pessoas. É tão singela a tarefa que surpreende não tenha sido adotada como regra básica desde o início. E isso que, quando da primeira morte, chegou a se falar até em instalação de câmeras nos caminhões. É só um servidor abrir a tampa do equipamento para uma rápida verificação visual, com lanterna, se for o caso, antes de o caminhão erguer o contêiner e esmagar seu conteúdo.
Aliás de novo, é lamentável que tenhamos de fazer considerações e proposições do gênero, de que funcionários da companhia responsável pela limpeza urbana tenham de vasculhar os contêineres atrás de pessoas que dormem dentro desses equipamentos. Mas essa situação parece não incomodar muito, já são três mortes, e não há clamores a respeito. Nosso tempo é mesmo engraçado. Pessoas dormem em baús de lixo, são trituradas como qualquer outro material descartado, e nenhuma indignação mais forte se estabelece na cidade, quem sabe até uma revolução operacional e de comportamento. Nada disso. Ficamos, no máximo, no “ora vejam”, “pois é, que infortúnio”.
A cadelinha salvou-se. Tomara outras pessoas que dormem em contêineres não morram mais ao serem engolidas pelos equipamentos mecanizados da coleta orgânica. Não se pode tolerar novas mortes do tipo. Nem cachorro atirado dentro deles. Nem gente dormindo no meio do lixo.
(O Pioneiro, 21/10/2009)