O Partido Verde na Alemanha se apresenta e é referido como à esquerda no espectro político. Fundado em 1980, foi o primeiro partido político do gênero ambientalista a adquirir uma proeminência nacional, na Europa e no Mundo. Entre 1998 e 2005 integraram a aliança Vermelho-Verde com o Partido Social Democrata (SPD) do então chanceler Gerhard Schröder. Foi um sinal do sucesso do partido. Aí começaram também alguns problemas. A base programática dos Verdes sempre destacou sua oposição ao uso da energia nuclear em todos os sentidos, tanto quanto o pacifismo e o ambientalismo.
Em 2001, como era parte do governo, o Partido Verde apoiou o envio de tropas alemãs, que o SPD defendia, ao Afeganistão, como parte da operação da OTAN na região. Consta que em troca o SPD concordou em diminuir e terminar a dependência energética alemã das centrais nucleares.
Mas o fato abalou a base Verde. Depois da queda do Muro de Berlim, acentuou-se a marcha lenta, seguríssima e nada gradual do SPD para a direita, implementando reformas neoliberais na Alemanha. Isso fez com que muitas das bases à esquerda do SPD dele se afastassem. E os Verdes apareceram como uma força alternativa, apoiando causas como a tolerância em relação à opção sexual, a luta contra a xenofobia, a legalização da presença dos estrangeiros em situação irregular, a luta pela igualdade entre homens e mulheres, e outras mais – entre elas o pacifismo, bandeira que unia essas lutas todas.
Uma espécie de fenda de San Andreas – aquela que um dia vai dividir a Califórnia em dois – se instalou dentro do Partido Verde. Até hoje seus líderes tentam conter a progressão da fenda.
Mas agora ela se ampliou um pouco mais. No Estado de Saarland, a oeste da Alemanha, a nova estrela da esquerda alemã, o partido a Linke (A Esquerda) foi o mais votado nas eleições locais. Seria possível pensar uma aliança chamada de Vermelho-Vermelho-Verde, ou seja, entre o SPD (que saiu do governo nas eleições nacionais) , a Linke e os Verdes. Antes que qualquer conversação começasse, mas fruto também do acirramento do clima entre os Verdes e a Linke na campanha, o Partido Verde local decidiu compor uma aliança com os direitistas CDU, a União Democrata Cristã e o FDP, que é o Partido da Democracia Liberal. (da Democracia e Liberdade, literalmente).
De novo a questão nuclear emergiu, porque esses dois partidos resistem a compromissos mais concretos com o fim da utilização da energia nuclear, além de que a aliança com dois partidos de direita escandalizou uma grande parte do eleitorado e dos simpatizantes dos Verdes.
Há por trás disso uma concorrência com a Linke, que ganhou pontos e votos ao se manter numa posição firme contrária à presença das tropas alemãs (e outras) no Afeganistão, além de defender em primeiro plano programas sociais mais ousados para enfrentar a crise financeira e a quebradeira que se instalou na Alemanha. Há também uma má vontade – que não é só dos Verdes, mas também de parte do SPD e da imprensa conservadora – com a Linke, não só porque esse partido reúne também remanescentes comunistas da Alemanha Oriental, também porque seu líder, Oskar Lafontaine é um dos egressos do partido social-democrata, descontente com a marcha para a direita.
E Lafontaine seria o primeiro ministro de um governo de esquerda no Saarland, que é sua região. A partir daí ele poderia crescer como uma espécie de contra-posição ao governo federal, que agora será empalmado pela nova dupla direitista CDU (com sua co-irmã bávara CSU) e FDP.
Em compensação, no Estado de Brandemburgo, na antiga Alemanha Oriental, o SPD e a Linke decidiram fechar um acordo para formar o governo provincial, como já acontece em Berlim, que é uma cidade que tem status de estado.
Os Verdes agora estão arriscados de, em várias frentes, ficarem no banco de reservas. Não estão acompanhando a evolução de parte de seu próprio eleitorado tradicional para a esquerda, e perigam se enredar no jogo de cadeiras de poder que antes condenavam.
(Por Flávio Aguiar*, Carta Maior, 16/10/2009)
* Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior