O advogado belga Olivier De Schutter, relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Direito à Alimentação, defendeu ontem em Brasília a estratégia do Movimento dos Sem-Terra (MST) - de ocupar terras e exigir sua destinação para a reforma agrária. "É uma forma de chamar a atenção para o problema", disse De Schutter em entrevista coletiva, segundo a Agência Brasil.
No encontro com os jornalistas, o relator também fez referências à concentração fundiária no País, que, além de ser alta, na comparação com outros países, aumentou nos últimos anos, conforme levantamento estatístico divulgado pelo IBGE em setembro. "A concentração fundiária é um problema no Brasil", apontou De Schutter.
O relator da ONU veio ao Brasil para participar de um seminário internacional sobre direito à alimentação, organizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social, e para coletar dados com vistas a um estudo sobre problemas relacionados à alimentação ao redor do mundo. Segundo suas declarações, o acesso à terra é uma das questões centrais no debate sobre a produção de alimentos.
Na segunda-feira, ele visitou o Assentamento Eldorado de Carajás, que fica em Unaí, a 170 quilômetros de Brasília, e é controlado pelo MST. Na conversa com os assentados, o relator da ONU falou de suas preocupações com o avanço da cultura de cana de açúcar para a produção de combustíveis - tema recorrente em seus discursos e declarações, desde que assumiu o cargo, em maio do ano passado.
Segundo De Shutter, a expansão da cana favorece a concentração de terras e a diminuição das áreas usadas para o cultivo de alimentos. Por causa disso, ele já chegou a pedir o congelamento da produção de biocombustíveis no Brasil e em outros países ao redor do mundo.
Na entrevista de ontem, ele chegou a citar o caso do Estado de São Paulo, onde já seria visível a concentração de terras, em decorrência do aumento da produção de etanol. Na opinião dele, o Brasil ainda precisa "melhorar a sustentabilidade da produção do etanol".
De acordo com o levantamento do IBGE divulgado no mês passado, no Brasil, as pequenas propriedades, com menos de 10 hectares, totalizam 2,7% da área ocupada por estabelecimentos rurais. Já as grandes propriedades, com mais de 1.000 hectares, ocupam 43% da área total. Por outro lado, as pequenas propriedades somam 47% do total de estabelecimentos rurais, enquanto as grandes correspondem a 0,91%.
Ainda na entrevista de ontem, o relator da ONU elogiou o governo federal pela diminuição da desnutrição e pela queda da mortalidade infantil na última década. Mas também chamou a atenção para a permanência de bolsões de fome, qualificando-os de "inaceitáveis".
(Por Roldão Arruda, O Estado de S. Paulo / IHUnisinos, 17/10/2009)