Enquanto os líderes mundiais lutam para chegar a um novo acordo sobre a mudança climática até dezembro, eles enfrentam um obstáculo talvez mais difícil do convencer grandes poluidores como os Estados Unidos e a China a reduzirem as emissões de gases do efeito estufa: como pagar pelo novo acordo.
O preço do novo acordo climático será de impressionantes US$ 100 bilhões por ano até 2020, estimam muitos economistas; alguns colocam o custo mais próximo de US$ 1 trilhão. Esse dinheiro é necessário para ajudar países em rápido desenvolvimento, como Índia e Brasil, a adotarem tecnologias mais limpas, porém mais caras, à medida que se industrializam, assim como auxiliar os países mais pobres a lidarem com as consequências da mudança climática, como secas e elevação do nível dos mares.
Este financiamento é uma parte essencial de qualquer acordo internacional sobre o clima, dizem negociadores e cientistas, porque os países em desenvolvimento devem coibir o crescimento de suas emissões caso o mundo queira limitar a elevação das temperaturas. Com base em cálculos da Agência Internacional de Energia para 2005 até 2030, 75% do crescimento na demanda de energia virá do mundo em desenvolvimento.
Muitos países em desenvolvimento deixaram claro que não assinarão o tratado a menos que recebam dinheiro para ajudá-los a se adaptarem a um planeta mais quente. Reconhecendo que um novo tratado necessita de unanimidade para o sucesso, países industrializados como os Estados Unidos e os da Europa concordaram em princípio em realizar esses pagamentos; eles já foram redigidos na estrutura acertada do tratado, que será assinado em Copenhague em dezembro.
Mas até o momento, não há estratégia concreta para levantar essas somas imensas. Não há nem mesmo um acordo a respeito de que países devem pagar ou em que proporção. "O nível de ambição no financiamento não se equipara ao senso de urgência que todos têm agora", disse Luiz Alberto Figueiredo Machado, o negociador-chefe do Brasil para mudança climática, que espera obter recursos para preservar sua floresta tropical. Ele acrescentou: "Financiamento e um nível adequado de financiamento são itens que podem levar a um colapso das negociações para nós".
No encontro de cúpula da ONU para mudança climática, em Nova York, e no encontro do Grupo dos 20 em Pittsburgh, no mês passado, os líderes nacionais, incluindo o presidente Barack Obama e o presidente da China, Hu Jintao, destacaram a urgência do combate à mudança climática. Mas eles não ofereceram novas propostas para financiamento e não colocaram mais dinheiro na mesa.
Talvez ainda mais preocupante, o Fundo de Adaptação da ONU, que oficialmente começou a operar em 2008 para ajudar os países pobres a financiarem projetos para enfrentar os efeitos do aquecimento global, permanece vazio, em grande parte porque os países ricos não contribuíram com as doações que prometeram. O fundo atualmente conta com cerca de US$ 18 milhões, uma fração minúscula do que supostamente deveria ter, segundo autoridades do fundo.
As autoridades da ONU consideram o fracasso em obter o financiamento como uma ameaça ao novo tratado global. "Quão importante é isso? É crítico", disse Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção Marco das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, que supervisiona as negociações do tratado.
Os Estados Unidos e outros países industrializados certamente terão que contribuir em peso a qualquer programa de financiamento. Mas a recessão global limitou os recursos e os países estão tendo problemas para apoiar suas boas intenções e promessas anteriores com dinheiro.
A situação difícil do fundo da ONU, criado como um exemplo da cooperação internacional na resposta à mudança climática, é sintomática. O fundo supostamente se beneficiaria de duas fontes de receita: a primeira um imposto de 2% sobre os créditos de carbono vendidos no sistema de comércio de carbono da ONU, no qual os países ricos investem em projetos verdes nos países em desenvolvimento para compensar as emissões em casa; a segundo é a doação voluntária pelos países ricos.
O imposto de 2% deverá gerar pelo menos US$ 1,6 bilhão até 2012. Mas as doações ainda não se materializaram, disse De Boer. Várias propostas estão na mesa para gerar dinheiro para ajudar os países em desenvolvimento a conter futuras emissões, assim como para se adaptarem aos efeitos da mudança climática. Mas a maioria permanece longe de produzir dinheiro.
Em setembro, a União Europeia ofereceu um plano no qual "os países industrializados e países em desenvolvimento economicamente mais avançados" forneceriam de US$ 33 bilhões a US$ 74 bilhões por ano para ajudar os países pobres a se adaptarem, com a parcela da União Europeia estimada em US$ 3 bilhões a US$ 22 bilhões. O projeto de lei sobre o clima, aprovado pela Câmara dos Estados Unidos em junho, leiloaria permissões de emissões e doaria parte da receita para ajudar os países pobres. A legislação agora está tramitando no Senado.
Connie Hedegaard, a ministra dinamarquesa do clima e energia que presidirá o encontro de Copenhague, sugeriu recentemente a imposição de um novo imposto sobre o combustível de transporte de carga ou sobre os voos aéreos -que causam emissões substanciais- para financiar a adaptação nos países pobres. "Nós precisamos de um financiamento mais inovador", disse Hedegaard em uma entrevista. "O G20 deveria elaborar um financiamento rápido, que enviaria um forte sinal de que os países desenvolvidos estão falando sério a respeito disso."
Muitos países pobres dizem que estão cada vez mais céticos, após terem testemunhado como promessas anteriores evaporaram quando a economia azedou. Eles estão igualmente nervosos a respeito de soluções baseadas no mercado, como o uso de parte da receita dos créditos de carbono. "Os países em desenvolvimento não estão convencidos de que o mercado encontrará para eles os US$ 100 bilhões de que precisam", disse Figueiredo Machado, o negociador-chefe do Brasil. "Eles querem garantias."
Quando a Alemanha e a França sugeriram em um recente encontro do Grupo dos 20, em Londres, que contribuiriam ao fundo por meio da redução de outros tipos de ajuda, a Índia se rebelou. Financiar a ajuda aos países pobres para que se adaptem à mudança climática ou reduzam as emissões "não deveria ocorrer às custas de outros apoios monetários", disse Pranab Mukherjee, o ministro das Finanças da Índia.
Igualmente contenciosa é a questão de que países devem doar e quais devem receber. Os contribuintes devem ser apenas os países industrializados, ou entre eles devem estar incluídos poluidores que estão se desenvolvendo rapidamente -e estão cada vez mais ricos- como a China?
Xie Zhenhua, o principal negociador chinês, falando em uma coletiva de imprensa em Nova York no mês passado, disse que a ONU não deve esperar que a China pague."O aquecimento global é resultado do CO2 gerado pelos países desenvolvidos durante sua industrialização", disse Xie. "A China é um dos países que arcam com o impacto disso."
(Elisabeth Rosenthal*, The New York Times / Último Segundo, 15/10/2009)
*Tradução: George El Khouri Andolfato