A penúltima reunião de negociação antes da conferência do clima de Copenhague terminou ontem em Bancoc, Tailândia, com duas promessas: uma dos países desenvolvidos, de que vão acabar com o Protocolo de Kyoto em favor de um acordo do clima único para ricos e pobres. A outra, dos países em desenvolvimento, de que não deixarão isso acontecer.
"O Grupo da África se opõe à substituição do Protocolo de Kyoto por quaisquer outros acordos. Vou repetir: o Grupo da África se opõe à substituição do Protocolo de Kyoto por quaisquer outros acordos", declarou o representante da Argélia numa das plenárias finais do encontro, ontem de manhã. Foi apoiado por todo o G77, o grupo dos países em desenvolvimento, que o Brasil integra.
"O Protocolo de Kyoto não basta mais; o melhor caminho é integrar tudo num acordo único", declarou em seguida o sueco Anders Turesson, falando em nome da União Europeia. Em outras áreas, como adaptação, transferência de tecnologia e florestas, houve avanços em Bancoc, com a redução do texto de negociação de 181 páginas -mas os diplomatas não sabiam ainda em quanto ontem- e o acerto de minúcias.
A negociação sobre o clima hoje está dividida em dois pedaços, ou "trilhos": de um lado estão os países industrializados que ratificaram o Protocolo de Kyoto e hoje negociam metas obrigatórias mais elevadas para um segundo período do protocolo, de 2013 a 2020. De outro, os países em desenvolvimento mais os EUA, negociando compromissos voluntários.
Como os EUA -o principal emissor histórico de gases-estufa- jamais integrarão algo parecido com Kyoto, os europeus têm pressionado pela incorporação de elementos de Kyoto num único "trilho", que abarque o mundo todo.
Dividir para conquistar
Para o G77, a estratégia dos europeus é "dividir para conquistar". As ONGs criticaram o resultado da reunião, chamando-o de "retrocesso". Segundo os ambientalistas, o encontro em Bancoc não refletiu as declarações dos chefes de Estado como Barack Obama e Nicolas Sarkozy nas Nações Unidas no fim do mês passado. Na ocasião, todos prometeram liderar o processo rumo a um acordo em Copenhague.
"Estamos em um momento difícil da negociação", disse o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefe da delegação brasileira em Bancoc. "Faltam convergências importantes em metas para os países industriais e apoio financeiro. São temas que só vão se resolver em Copenhague." Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU, voltou a minimizar ontem o racha político, comparando a discussão a escolher a cor do papel de presente antes de comprar um sapato. Foi interpelado por uma jornalista indonésia: "Mas e se ninguém quiser comprar o sapato"?
A União Europeia, por sua vez, insistiu que leva Kyoto a sério e que não está matando o protocolo. "Estamos é na nossa segunda operação de resgate", afirmou o sueco Turesson. Ele disse que os europeus não querem "reinventar nada", mas dizem que um acordo que não inclua todas as principais economias do planeta não evitará o aquecimento global.
O negociador americano Jonathan Pershing insistiu que seu país está comprometido com "metas de curto prazo para toda a economia". Disse também que os EUA não trabalham com a possibilidade de o Congresso não aprovar a lei de mudanças climáticas antes de Copenhague, mas que a atuação dos congressistas é determinante. Disse também que o Executivo não teria força para propor algo mais ambicioso que o máximo de 7% de redução de emissões até 2020 considerado pelo Senado. Mas isso foi antes do Nobel de Obama.
(Por Claudio Angelo, Folha de S. Paulo, 10/10/2009)