A recessão global pode ser uma oportunidade para combater as mudanças climáticas e construir um futuro com baixas emissões de carbono, afirma um relatório da Agência Internacional de Energia (AIE). A AIE calcula que as emissões globais dos gases que provocam o efeito estufa vão cair em 3% neste ano - uma proporção maior do que a estimada.
Se os governos aproveitarem a oportunidade para investir em tecnologias limpas, o aumento da temperatura global pode ficar abaixo da meta de 2 graus Celsius, estabelecida pelo G-8, afirma a agência.
As conclusões do relatório foram divulgadas durante discussões sobre mudanças climáticas em Bangcoc. "A mensagem é simples e absoluta: se o mundo continuar na base atual de políticas de clima e energia, as consequências para as mudanças climáticas serão severas", disse o diretor-executivo da AIE, Nobuo Tanaka. "A energia está no coração do problema - e, portanto, precisa estar no coração da solução."
A recessão deve significar que as emissões de carbono serão 3% mais baixas neste ano do que no ano passado, e isso tem um impacto a longo prazo, afirma a AIE, com projeções de que as emissões em 2020 serão 5% mais baixas do que seriam se o mundo não estivesse passando por uma recessão global.
Os maiores cortes de carbono vão ser alcançados com melhorias na eficiência energética, afirma a agência.
Corte, não queime - A AIE apresentou uma série de medidas de políticas para diferentes regiões do mundo e países em vários estágios de desenvolvimento. Sua receita levaria à estabilização da concentração dos gases que provocam o efeito estufa para o equivalente a 450 partes de dióxido de carbono por milhão (ppm) - um nível que, de acordo com algumas análises, oferece uma boa chance de que a temperatura média global desde antes da Revolução Industrial não sofra variação de mais de 2 graus Celsius.
Sem essas políticas, a agência calcula que as concentrações vão aumentar para 1.000 ppm até meados deste século - níveis que, segundo alguns cientistas, poderiam levar a consequências catastróficas e irreversíveis.
Mas é preciso investir capital político e econômico para se atingir esta meta, afirma a agência, com o ápice das emissões previsto para 2020. Nos próximos 11 anos, os países desenvolvidos - definidos como os membros da OCDE e/ou da União Europeia, terão que cortar em 17% as emissões relacionadas à energia, e em 50% até 2030.
Até 2030, outros grandes emissores como a China, Índia e Brasil vão ter que limitar o aumento de suas emissões a até 14% dos níveis atuais. Os países em estágios menos avançados de desenvolvimento poderão aumentar suas emissões. Globalmente, as tecnologias de energia limpa iriam se expandir, de acordo com a agência.
Entre 2020 e 2030, a receita da AIE prevê que o uso da energia atômica seria três vezes maior, o setor de renováveis seria quatro vezes maior e o uso de tecnologias limpas de carvão seria 14 vezes maior. O custo desta transformação seria de US$ 10 trilhões (cerca de R$ 18 trilhões) entre 2010 e 2030, afirma a agência, mas melhorias na eficiência energética significariam uma economia virtual da mesma quantia.
Calor - No prefácio do relatório, Yvo de Boer, secretário executivo da convenção sobre o clima da ONU (UNFCCC), alertou que tudo isso depende de que seja fechado um ambicioso acordo global na conferência da ONU sobre o clima em dezembro, em Copenhague. "Esses resultados deveriam nos motivar a aumentar os esforços para chegar a um acordo com a necessária ambição", disse ele. "O custo de combater as mudanças climáticas é administrável. Mas não podemos arcar com o custo de não fazê-lo."
Boer está em Bangcoc, onde preside um encontro preparatório entre representantes de diferentes governos que fazem parte da convenção da ONU.
Na segunda-feira (05/10), a China e o Sudão - que presidem o bloco da China e G77 de países em desenvolvimento - acusaram os países ricos de tentar acabar com um dos preceitos básicos do Protocolo de Kyoto - de que as metas de emissão deveriam ter, de alguma forma, efeito legal. Eles acusam países ocidentais, como os Estados Unidos e a Austrália, de tentar tornar as metas mais flexíveis, o que, segundo eles, poderia dar espaço para que eles se esquivassem.
A análise da AIE faz parte de seu relatório anual World Energy Outlook, publicado mais cedo para que pudesse ser discutido durante o encontro de Bangcoc. Alguns dados, como o impacto projetado da recessão sobre as emissões, foram publicados no mês passado.
(Estadao.com.br / AmbienteBrasil, 07/10/2009)