Estatal busca se converter em Petrobras do setor elétrico e negocia 9.500 MW em novas usinas pela América do Sul. Objetivo é internacionalizar a Eletrobrás e trazer para o país energia hidrelétrica de usinas construídas em outros países da região
A Eletrobrás, estatal com planos de ser a Petrobras do setor elétrico, negocia a construção de grandes hidrelétricas na América do Sul e na América Central. O ousado plano da estatal prevê a construção de usinas com capacidade instalada total de até 9.500 MW, quase 10% da base ativa hoje no Brasil. Os oito projetos planejados pela Eletrobrás quase equivalem ao gigante e polêmico empreendimento de Belo Monte, no rio Xingu (Pará), que está em fase de licenciamento.
Há dois objetivos para esse movimento da estatal brasileira. O primeiro é dar impulso ao seu plano de crescimento, com operações internacionais -o que inclui a busca de negócios na área de transmissão de energia inclusive nos Estados Unidos. O segundo é garantir, com esse movimento, a integração regional da infraestrutura do setor elétrico na América do Sul. A produção de energia em países onde o potencial hidrelétrico ainda não foi usado pode assegurar a expansão da oferta que será necessária ao Brasil.
Por ano, o país precisa expandir de 3.000 MW a 5.000 MW a base instalada, a depender do PIB. Nos últimos anos, sem as hidrelétricas, esse aumento de oferta só foi possível com usinas térmicas a gás natural, mais caras e poluentes. A produção de energia hidrelétrica próxima à fronteira brasileira pode, portanto, atender a essa demanda, avalia a Eletrobrás. Isso porque a energia excedente produzida na Guiana, no Peru e na Argentina será transportada por linhas de transmissão para o Brasil.
O projeto mais adiantado é o da usina de Inambari, no departamento de Madre de Dios, no Peru. O projeto prevê a construção de uma usina de 2.000 MW e de uma linha de transmissão com 1.600 quilômetros -que ligará a unidade a Porto Velho (RO). Dessa forma, a energia produzida lá seria, em parte, transferida para o sistema interligado brasileiro. A obra, de US$ 4 bilhões, poderá já estar no leilão de energia para o mercado regulado no Brasil em 2010, com perspectiva de oferta efetiva em 2015.
Além desse, a Eletrobrás, em parceria com a Odebrecht, a Engevix, a Andrade Gutierrez e a OAS, estuda quatro aproveitamentos hidrelétricos em solo peruano. Somados, totalizam mais 4.500 MW. O projeto de Inambari chamou a atenção da imprensa do país andino, que acusa o governo do presidente Alan García de aceitar um projeto que beneficia o Brasil, enquanto os danos ambientais entrarão na conta da Amazônia peruana. É a mesma crítica apontada por muitos opositores do projeto da usina de Belo Monte e dos empreendimentos planejados pelo Brasil em outras áreas da região amazônica.
Binacional
Como Itaipu, há um novo plano para a construção de uma usina binacional. Desta vez, no rio Uruguai. O projeto Garabi, estudado pela CNEC (do Grupo Camargo Corrêa), é parceria entre os governos brasileiro e argentino. A usina planejada terá 2.000 MW de capacidade instalada e linhas de transmissão com capacidade equivalente que levarão essa energia para o Brasil e para a Argentina. Até abril de 2010, os estudos que atentam a viabilidade estarão prontos. A modelagem do projeto ainda não está definida.
Na Guiana, a Eletrobrás estuda a construção de uma usina de 800 MW, no rio Mazaruni. Sinval Gama, superintendente de operações internacionais, diz que o projeto abastecerá a Guiana com 100 MW e transferirá para Boa Vista (única capital brasileira fora do sistema interligado) outros 700 MW. Com a importação de energia da Guiana, Boa Vista pode reduzir o uso de térmicas.
A construção de usinas pela Eletrobras fora do Brasil tem ainda projeto na Nicarágua. A hidrelétrica de 220 MW fica no rio Grande de Matagalpa. Segundo Gama, a obra está estimada em US$ 600 milhões. Nesse caso, a energia abasteceria a América Central, onde já existe um sistema interligado e operado por uma empresa.
(Por Agnaldo Brito, Folha de S. Paulo, 05/10/2009)