As condições de financiamento estabelecidas pelo BNDES para o projeto da usina hidrelétrica de Belo Monte e a pré-existência de linhas de transmissão no estado do Pará podem ser fatores decisivos para que o preço da energia do empreendimento fique no patamar daquele negociado nas usinas do rio Madeira. O superintendente de infraestrutura do banco, Nelson Siffert, diz que só levando em conta as condições de crédito, que são melhores do que as oferecidas no Madeira, é possível reduzir em pelo menos 5% o valor da energia.
O preço-teto por megawatt hora que será estabelecido para o leilão ainda está em estudo pelo Tribunal de Contas da União (TCU). E como é de praxe nos momentos que antecedem um leilão, investidores e governo têm posição antagônica. De um lado os empreendedores dizem que o preço da energia terá que ser muito maior do que àqueles do Madeira para fazer frente aos investimentos e aos riscos do projeto. De outro, o governo diz que é possível ter um preço até menor.
Corrigida pelo IPCA, a tarifa da usina de Santo Antônio gira hoje em torno de R$ 86,00, e a de Jirau em R$ 76,00. Um dos pontos que podem favorecer uma tarifa parecida em Belo Monte, apesar da complexidade do projeto, é que nos valores das usinas do Madeira está embutido um custo de transmissão para os empreendedores, o que representa cerca de 30% dessas tarifas. Para Belo Monte, esse custo, levando em conta uma tarifa de igual valor, não chegaria a 10%.
Essa grande diferença de custos ocorre porque em Belo Monte não será preciso construir um linhão de transmissão, como os que terão que ser feitos para ligar Rondônia a São Paulo. Metade do custo da construção destas linhas é paga pela geradora e a outra pelos consumidores. No Pará, que hoje já abriga a usina de Tucuruí, uma das maiores do país, os investimentos em transmissão serão menores, já que as linhas estão prontas e será preciso pensar apenas na interligação ao sistema.
Alguns empreendedores alegam, entretanto, que o preço agressivo dos lances feitos pelas usinas do Madeira foram embasados nas condições que se poderiam auferir com a venda de parte da energia para o mercado livre. Do total da energia dos empreendimentos, 30% ficará no mercado livre. O problema é que as condições atuais desse mercado estão muito diferentes das vivenciadas nas épocas dos leilões de Santo Antônio e Jirau.
O preço da energia na época dos leilões das usinas do rio Madeira girava em torno de R$ 150 por megawatt hora. Nem mesmo a usina de Santo Antônio, leiloada antes de Jirau, conseguiu vender sua energia neste patamar. O preço ficou em torno de R$ 140. As condições atuais do mercado livre apontam tendência de queda e os preços já estão na faixa dos R$ 120. De qualquer forma, a previsão é que o edital do leilão da usina de Belo Monte estabeleça um percentual de apenas 10% para a venda livre de energia.
O grande embate com o governo em torno de Belo Monte é hoje travado pelas construtoras, que dizem que o investimento de R$ 16 bilhões estabelecido pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) é muito baixo. Tanto Camargo Corrêa quanto Odebrecht falam de investimentos da ordem de R$ 30 bilhões. O problema em torno do número apresentado pela EPE é que o valor do investimento estabelecido é usado para a composição do preço teto da tarifa.
De qualquer forma, o BNDES já se comprometeu a financiar diretamente R$ 12 bilhões, sem contar com a possibilidade de repasses de outros bancos. Esse é o valor máximo, pelas regras da Basileia, que o banco pode emprestar diretamente para um único empreendimento levando em conta seu atual patrimônio líquido. Se o banco for capitalizado, esse valor pode ser até maior. Segundo Nelson Siffert, do BNDES, em última análise se os bancos privados replicarem as condições do financiamento também esse valor pode ser potencializado.
(Por Josette Goulart, Valor Econômico, 01/10/2009)