A origem hídrica de grande parte da energia produzida no Brasil é associada a uma matriz energética considerada limpa. O assunto, porém, ainda é controverso, já que não se sabe ao certo o volume de emissões das usinas hidrelétricas. “Essa é uma caixa preta que precisa ser aberta”, disse Bohdan Matvienko, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP/São Carlos), durante reunião técnica sobre Balanço de CO2 em Reservatórios, realizada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente de São Paulo, em agosto último.
Segundo Mauro Meirelles, do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Brasil e Canadá são pioneiros nos estudos de emissões de reservatórios, desde os anos 1990, mas ainda há muitas lacunas de conhecimento sobre o assunto. Por conta disso, essas emissões, que incluem gás carbônico (CO2) e metano (CO4) ainda não são obrigatórias nos inventários nacionais de emissões de gases de efeito estufa. Em seu primeiro inventário, de 2004, o Brasil comunicou suas emissões de metano, mas o resultado foi inconclusivo e não foi incorporado ao resultado final do inventário.
Mudança no uso da terra
Conforme a metodologia do IPCC, os reservatórios entram na categoria de mudança no uso da terra, onde entra a floresta que foi derrubada para a construção do lago. Todo o CO2 é computado no ano do corte. Segundo Meirelles, os reservatórios são estudos por amostragem e, em geral, quanto mais se alaga, maiores são as emissões. “Para projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), não podem ser usados projetos que alaguem uma área muito grande em relação à energia gerada.”
O problema é que as emissões variam muito de um lago para outro e não há um padrão nem em relação à latitude. “Não é uma verdade absoluta, mas as hidrelétricas de Samuel (em Rondônia) e Três Marias (em Minas Gerais) perdem em emissões da termelétricas em relação a CO2 e metano”, conta o responsável pela área de mudanças climáticas do MCT.
Entre as dificuldades para contabilizar as emissões estão a separação do que são emissões antrópicas e naturais e o que é material carreado para o lago (vindo de uma indústria, por exemplo) e que já foi contabilizado. Três Marias, por exemplo, pode estar recebendo material da Região Metropolitana de Belo Horizonte, o que explica as altas emissões, que podem estar sendo contadas duplamente.
Também influencia o nível de emissões a vegetação prévia do lago. Em Balbina (no Amazonas), foi feito um reservatório enorme, sem limpeza prévia da vegetação, gerando grandes emissões. “Hoje se obriga a fazer limpeza antes”, explica Meirelles.
Sumidouro de carbono
Com todos esses problemas, a caixa preta começa a ser aberta. Pesquisas da USP/São Carlos sobre emissões em reservatórios hidrelétricos têm mostrado que, mesmo com muita variação nas emissões, em geral, quando se faz uma represa, se cria um sumidouro de carbono no longo prazo.
Conforme Matvienko, “2,5% do produto que entra no lago é retido no fundo como carbono. Nossos cálculos mostram que, depois de 60 anos, o estoque de carbono vai aumentando, sequestrando indefinidamente, através dos sedimentos. Soltamos metano, que é mais eficiente do que o gás carbônico como gás estufa, mas os rios já emitem carbono antes de serem represados. No balanço geral, sequestramos mais”, afirma o pesquisador.
Matvienko ressalta, porém, que “mesmo que as companhias hidrelétricas adorem nossos resultados, eles ainda precisam ser confirmados por outros grupos de pesquisa”. Mesmo sem a confirmação definitiva, no entanto, Meirelles afirma que energia hidrelétrica, hoje, é considerada energia limpa.
(Por Maura Campanili, Clima e Desmatamento / IPAM / CarbonoBrasil, 28/09/2009)