Pesquisadores podem começar a usar “nanoarmadilhas” para aumentar a capacidade de armazenamento de calor em reservatórios geotérmicos superficiais de baixa temperatura. Isso diminui o risco de terremotos.
A produção de energia geotérmica ganha um incentivo com uma nova tecnologia, que promete aumentar o rendimento dos reservatórios superficiais de baixa temperatura. Na foto, a usina geotérmica de Nesjavellir, na Islândia. O manto derretido da Terra é uma fonte de energia virtualmente inesgotável, que poderia representar 10% das necessidades energéticas dos Estados Unidos. Mas questões relacionadas à segurança e ao custo impedem o desenvolvimento da energia geotérmica. No entanto, com a possibilidade de uso da nanotecnologia, os pesquisadores planejam testar um jeito mais eficiente de se chegar sem riscos aos depósitos geotérmicos de baixa temperatura.
O presidente Barack Obama vem promovendo a energia geotérmica como solução para os Estados Unidos abandonarem de vez o hábito de consumir combustíveis fósseis, o que diminuiria as emissões de gases do efeito estufa. No começo de julho, o Bureau de Administração do Solo dos Estados Unidos concedeu os direitos de exploração da energia geotérmica de uma área de aproximadamente mil quilômetros quadrados de terras públicas no sudoeste do país, na expectativa de que 111 novas usinas geotérmicas estejam funcionando até 2015.
As usinas geotérmicas tradicionais ─ responsáveis por somente 0,5% do fornecimento de energia nos Estados Unidos – aproveitam fontes de água superaquecida (entre 150 e 370° C), localizadas a quilômetros abaixo da superfície da Terra. Essas fontes surgem quando o magma proveniente do manto externo (cerca de 50 km abaixo da superfície) invade a crosta, aquecendo rochas e água. Na maioria das usinas, à medida que a água sob pressão é extraída do reservatório, ela se expande e se transforma em vapor, fornecendo energia para girar turbinas que geram eletricidade.
Mas as perfurações para obter os recursos hidrotérmicos podem, às vezes, deflagrar terremotos, em particular, quando o projeto perfura leito rochoso quente ao redor de falhas e injeta a própria água. O método, chamado de estimulação, levou o governo suíço a fechar uma usina na cidade de Basiléia, em 2006, depois que as perfurações desencadearam tremores violentos; e a AltaRock Energy, empresa californiana, engavetou seus planos para os gêiseres, depois que um artigo do New York Times levantou dúvidas sobre a segurança do empreendimento.
Fontes quentes de baixa temperatura, às vezes abaixo de 100° C, são mais abundantes e mais próximas da superfície terrestre, o que reduz o risco de as perfurações interceptarem falhas profundas, onde geralmente têm origem os terremotos. A água precisa ser utilizada em conjunto com um trocador de calor, para aquecer líquidos específicos, como alcanos (hidrocarbonetos saturados, como o metano) ou perfluorocarbono, cujos pontos de ebulição são mais baixos. Ao evaporar, essas substâncias liberam energia para movimentar as turbinas. Mas, infelizmente, elas liberam menos energia que a água liberaria nessa transição, o que reduz o rendimento do processo.
Por isso, o engenheiro ambiental Peter McGrail e seus colegas do Laboratório Nacional do Noroeste do Pacífico, do Departamento de Energia dos Estados Unidos (DoE, na sigla em inglês) têm uma proposta para mudar esse quadro.
Há oito meses, sua equipe fez uma descoberta surpreendente quando capturava e armazenava carbono. Eles trabalhavam com nanoestruturas que agiam como armadilhas, aprisionando dióxido de carbono, quando perceberam que também poderiam aumentar, em 20 vezes, a capacidade dos alcanos de armazenar calor. “Tivemos a ideia de aplicar essa descoberta à geotérmica”, explica McGrail.
Segundo o engenheiro, em tese, esse líquido poderia levar a um aumento de 30% a 40% na capacidade de produção de energia a partir de fontes geotérmicas de baixa temperatura. McGrail e sua equipe batizaram as estruturas de “portadores de calor metal-orgânicos” (MOHC, na sigla em inglês). Com uma ajuda de US$1,2 milhão, proveniente do Departamento de Energia, nos próximos três anos a geração de eletricidade será testada em laboratório usando diferentes mistura.
A nova proposta surpreendeu a comunidade científica ─ otimista quanto ao êxito da empreitada. “Isto é inédito para mim”, revelou Peter Rose, responsável pelo Programa Geotérmico, do Instituto de Energia e Geociências da University of Utah. “Mas parece que essa abordagem tem grande potencial para a geração de eletricidade a partir de recursos geotérmicos de baixa temperatura.”
Trabalhando com estruturas semelhantes, Leonard MacGillivray, químico da University of Iowa, comenta que a abordagem é plausível, os compostos são fáceis de serem sintetizados e incapazes de provocar danos ambientais. “Isto é muito intrigante,” observa. “É muito bom poder usar essas estruturas metal-orgânicas para resolver problema.”
É claro que a tecnologia ainda está engatinhando e sua viabilidade dependerá de fatores como disponibilidade de linhas de transmissão de energia e de propriedades públicas nas vizinhanças dos recursos geotérmicos de baixa temperatura. Segundo McGrail, “a expectativa aqui é tornar o sistema mais econômico pelo uso de sistemas mais rasos e diminuir o risco de interceptar uma falha ativa capaz de gerar um terremoto”.
(Por Brendan Borrell, Scientific American Brasil, 23/09/2009)