A meta do governo do Espírito Santo de tornar Vitória, a capital do Estado, a primeira capital brasileira com 100% de esgoto coletado e tratado até o primeiro semestre de 2011 quase esbarra em uma das tradições mais caras da cidade e do Estado, a fabricação artesanal de panelas de barro para moquecas no bairro de Gameleiras. Como a estação de tratamento, que está sendo quase triplicada para assegurar a realização da meta, fica perto da mina da argila usada na confecção das panelas, as artesãs do bairro acharam que a matéria-prima seria contaminada no processo de tratamento dos dejetos.
Segundo Sérgio Ceccato, diretor da Haztec Aquamec, empresa responsável pela produção dos equipamentos da estação, foi preciso levar uma comissão das paneleiras a outros Estados onde a mesma tecnologia já está em funcionamento (Paraná e São Paulo) para convencê-las de que não havia risco e permitir o prosseguimento dos trabalhos.
Orçadas em R$ 27,3 milhões, as obras de ampliação vão elevar a capacidade de tratamento da estação Mulembá de 210 litros para 560 litros de esgoto por segundo. Os equipamentos vão custar R$ 8,4 milhões. A conclusão das obras na estação, segundo Ceccato, estão previstas para agosto de 2010, mas a Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan) prevê para o primeiro semestre de 2011 o funcionamento completo do sistema, com todas as interligações.
O sistema completo vai custar R$ 224,5 milhões e prevê a integração ao atual sistema de mais 41 bairros e 140 mil dos 314 mil habitantes da capital capixaba. Hoje, Vitória tem 58,7% de esgoto tratado. Mas a conclusão da obra não vai garantir a limpeza das águas em toda a área da capital do Estado. A Grande Vitória tem cerca de 1,5 milhão de habitantes e a universalização do tratamento chegará apenas à capital.
Segundo a Cesan, no conjunto dos sete municípios que compõem a capital e seu entorno, a disponibilidade de tratamento de esgoto passará dos atuais 37% para 60%. No Brasil, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2008, somente 52,5% dos domicílios são conectados à rede de esgoto, tratado ou não. No ano 2000, quando o total geral do país era de 47,2%, o tratamento englobava apenas 35,3% desse total, segundo dados da última Pesquisa Nacional de Saneamento Básico disponível.
A ampliação do sistema de tratamento de esgoto da Grande Vitória, que atendia apenas a 20% dos domicílios em 2002, é parte de um programa que prevê investimentos totais de R$ 1,03 bilhão até 2011, dos quais R$ 604,7 milhões foram realizados até julho deste ano. Segundo a Cesan, os outros R$ 398,3 milhões estão contratados e com as obras em andamento. Parte das obras tem financiamento concedido pelo do Banco Mundial (Bird).
Entre os maiores municípios da Grande Vitória, o que ficará em pior situação no final do atual projeto será Vila Velha (o mais populoso do Estado, com 398 mil habitantes em 2007), cuja capacidade de tratamento da rede passará de 23,3% para 45%. Cariacica, a mais pobre (356,5 mil habitantes) passa de 35,4% para 62%. Serra, o mais industrial (385,3 mil habitantes), passará de 44,3% para 64%. E Guarapari, o mais turístico (98 mil habitantes), passará de 49,2% para 78%.
O governo do Espírito Santo estima que para chegar a 100% de tratamento do esgoto da Grande Vitória serão necessários investimentos adicionais de R$ 700 milhões que o Estado pretende fazer no sistema de parceria público-privada (PPP). O modelo ainda está em análise e deverá contar com o apoio do BNDES.
(Por Chico Santos, Valor Econômico, 28/09/2009)