Capturar, sequestrar, enterrar. São fortes os verbos que descrevem a ideia de tirar o CO2 das chaminés de usinas e de poços de petróleo e enviá-lo para reservatórios profundos, livrando a atmosfera de grandes quantidades do gás-estufa. Parece uma solução brilhante, mas está cada vez mais claro que o tempo para que a tecnologia seja viável em larga escala é grande demais para que ela seja protagonista na briga contra o aquecimento global.
Em artigo publicado na última edição da revista "Science", Stuart Haszeldine, geólogo da Universidade de Edimburgo, especula que a CCS (sigla em inglês para captura e armazenamento de carbono), nome dado a esse mecanismo, levaria ao menos dez ou 20 anos para se tornar praticável. Parece pouco, mas é muito.
Isso porque, segundo as projeções do IPCC (o painel do clima da ONU), a humanidade precisa parar de aumentar as suas emissões de CO2 até 2020 para evitar um desastre climático. Cedo demais para a CCS. A essa altura, a tecnologia estaria, com otimismo, apenas começando a se tornar relevante. Como a maior parte da energia utilizada pelas indústrias do mundo não é limpa - 85% do que elas consomem está relacionado à queima de combustíveis fósseis, como o carvão mineral-, o cenário é turvo.
O problema é mais financeiro do que tecnológico. O CO2 já é injetado na terra há décadas. Inicialmente, isso era feito para ajudar a extrair petróleo. O CO2 entra no reservatório, aumenta a pressão e faz o óleo subir. Na semana passada, uma usina a carvão nos Estados Unidos começou a produzir energia elétrica "limpa" a partir do carvão utilizando CCS. Já se sabe como fazer.
Mas não se sabe como pagar. "O grande desafio é custo. Especialmente na primeira etapa, quando ocorre a separação do CO2 nas fontes. A concentração de nitrogênio [na mistura de gases emitidos pelas usinas] é muito alta. Só algo entre 4% e 15% é CO2, esse processo ainda é muito caro", diz Rafael Bianchini, sócio da Climate Consulting (leia texto abaixo).
"Por mais que exista CCS, em vista dos impactos [da mudança climática], a situação é de caos. Não dá para pensar que, por causa de CCS, posso ter luz incandescente em casa." "Hoje, [a CCS] está sendo utilizada como álibi para construir usinas a carvão em vez de investir em novas usinas renováveis", diz o engenheiro Ricardo Baitelo, do Greenpeace.
Pré-sal
O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, afirmou em agosto que a extração do petróleo na camada pré-sal precisaria ter CCS, para evitar que as emissões brasileiras de CO2 explodissem com a exploração -além do carbono contido no próprio óleo, os poços do pré-sal contêm muito CO2, que seria lançado na atmosfera durante a exploração.
Mas o marco regulatório do pré-sal, divulgado semanas depois, não tratou do assunto, apesar de incluir a área ambiental na divisão do bolo a ser criado com a renda do petróleo.
O assunto continua em aberto. "Vamos ver qual vai ser a tecnologia, se será viável. Não dá para dizer [que a CCS não dará certo no pré-sal] e aí nem discutir, simplesmente enterrar o assunto", diz Minc.
Por um lado, a Petrobras afirmou à Folha que considera "prematuro divulgar estimativa de custos para aplicação [de CCS] no (...) pré-sal". Por outro, ela "se compromete a reinjetar 100% do CO2" produzido na exploração.
(Por Ricardo Mioto, Folha de S. Paulo, 27/09/2009)