A usina hidrelétrica de Belo Monte, com capacidade de 11 mil MW, deverá custar R$ 16 bilhões, segundo levantamento da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) encaminhado para análise no Tribunal de Contas da União (TCU). Além da obra, que não considera transmissão, o valor inclui a previsão de isenções fiscais, o custo de formação da Sociedade de Propósito Específico (SPE) e os gastos com seguros. Não são considerados os juros. "Este foi o valor encaminhado ao TCU, resultado de um estudo de otimização do investimento", diz Maurício Tolmasquim, presidente da EPE.
O estudo, que será publicado nesta quarta (23/09) no site da EPE, foi apresentado ontem durante evento da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base (Abdib), em São Paulo. Ele foi enviado há cerca de dois meses ao TCU e deve servir de base para o cálculo da tarifa-teto da energia a ser vendida. O valor supera o indicado no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de R$ 7 bilhões, por conta de atualização do levantamento (o anterior era de 2002) e a inclusão de custos como seguros e formação da SPE. Está bem aquém, no entanto, do investimento projetado por empresas interessada, de cerca de R$ 30 bilhões.
Empresários do setor argumentam que a EPE está subestimando o custo da construção de estruturas de acesso, transporte e acomodação dos trabalhadores. Segundo Augusto Roque, diretor-superintendente de energia da Odebrecht, será preciso avaliar as otimizações realizadas pela EPE. "De acordo com o nosso orçamento, a avaliação é de que o volume de investimento seria bem maior, de R$ 30 bilhões", diz.
Ele explica que entre as dificuldades do projeto está a localização da obra. "Não existe uma cidade de apoio perto. A mais próxima é Altamira, que não tem estrutura para receber os trabalhadores. Será preciso construir alojamentos para acomodar cerca de 20 mil empregados", diz. A Odebrecht tem interesse de participar da obra como investidora e construtora.
"Entendemos que o acesso é difícil, mas há alternativas. Nada que seja impossível", diz Tolmasquim. Segundo ele, as dificuldades não justificam considerar um sobrepreço nos materiais no investimento. "Claro que quem vai investir sempre vai querer uma estimativa de custo mais alta possível, faz parte do jogo. Temos que buscar o preço justo, e a última palavra será o TCU", diz ele. Marcelo Bisordi, diretor de energia da Camargo Corrêa, diz que as soluções para contornar as dificuldades de acesso à obra não são simples. "Ao todo será preciso viabilizar 260 quilômetros de acesso. Será preciso construir um porto, cinco canteiros de obras, estradas, numa área que alaga muito."
O que mais preocupa as empresas é que esse valor mais baixo estimado pela EPE determinará a tarifa-teto do leilão. "Preocupa porque deve vir uma tarifa-teto muito baixa", diz Bisordi. A Camargo Corrêa deve participar em consórcio com a CPFL, e segundo o executivo da empresa, não está descartada a participação de mais de uma construtora no consórcio. "Mas ainda é preciso definir qual será a participação da Eletrobrás, as condições de financiamento, conhecer o edital", diz.
Segundo o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, a Eletrobrás poderá participar com 40% a 49% do investimento. "Só resta saber se a participação será através das subsidiárias ou a posteriori, como no caso das usinas do Madeira", diz. Ele admite que a segunda opção agrada mais ao governo, mas a definição será divulgada apenas com a publicação do edital, esperada para o mês de novembro. O percentual foi considerado interessante pelas empresas.
Tolmasquim descarta a possibilidade de a Eletrobrás assumir todo o custo, como já cogitado por empresas. Segundo o presidente da EPE, o governo está trabalhando para que seja possível a formação de ao menos dois consórcios para disputar o investimento. Está prevista a participação de fundo de pensão e de autoprodutores. Ao menos 70% da energia deverá ser vendida no mercado regulado, 20% ficaria com os autoprodutores e 10% seria disponibilizada para consumidores livres.
O BNDES sinaliza que tentará dar melhores condições de financiamento do que as oferecidas para as usinas no rio Madeira. Segundo Nelson Siffert, superintendente da área de infraestrutura do banco, o prazo total de financiamento será de 25 anos. O normal são 16 anos. Esse período, porém, pode ser estendido até 30 anos. "Ainda estamos em negociações com o governo para tornar as condições mais atrativas", diz ele.
Outro ponto que está sendo discutido com o governo federal diz respeito à exigência do uso dos balanços das empresas como garantia do financiamento. O BNDES deve exigir que apenas 50% do empréstimo receba garantia pelos balanços, em vez dos 100% usuais. Para os outros 50%, as empresas poderiam usar alternativas como um pacote de seguros ou um contrato de suporte de acionistas. A alternativa ideal, porém, diz Siffert, seria o governo permitir que a Eletrobrás também use seu balanço como garantia, o que hoje é proibido para as empresas públicas. As condições de financiamento também só serão publicadas junto com o edital, mas segundo Siffert, haverá poucas modificações em relação ao divulgado agora.
Ontem, procuradores da República anunciaram que a Justiça Federal de Altamira deverá receber esta semana uma ação civil pública pedindo a realização de nova rodada de audiências públicas para debater o projeto da usina.
(Por Samantha Maia, Valor Econômico, 23/09/2009)