De cada tonelada de alumínio produzida no Brasil, a indústria consome 14,9 megawatt/ hora (MWh) de energia elétrica. É tanta energia usada para transformar bauxita e alumina em alumínio, que a indústria lidera o ranking dos maiores consumidores industriais do país de energia elétrica. Dos 444.583MWh gerados em 2008, a indústria de alumínio absorveu 24.355MWh, ou seja, 5,5% da produção nacional de energia elétrica. Não é à toa que o setor é apontado como um sorvedouro de energia elétrica. E como 45% da produção nacional viram commodity mineral no mercado externo, exportar alumínio é exportar energia elétrica incorporada ao processo produtivo.
Enquanto China e Rússia alimentam suas indústrias com térmicas a carvão; o Brasil usa energia limpa. O país, o sexto maior produtor mundial, é o único, junto com o Canadá, entre os grandes, que tem uma matriz energética baseada 85% em hidrelétricas. Como a água é um bem escasso, especialistas e ambientalistas defendem que o país deveria se beneficiar do seu potencial hidráulico e não disputar em condições de igualdade com os grandes poluidores. Eles alertam ainda que as usinas do Rio Madeira estão sendo construídas para atender à demanda do setor.
— Enquanto os maiores produtores mundiais de alumínio exportam um produto sujo, o Brasil vende um alumínio rico em energia renovável — avalia José Goldemberg, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), defendendo que o país deveria liderar o movimento pela cobrança de uma taxa adicional para quem vende produto ambientalmente sujo.
— É a França quem está liderando esse movimento.
Consumo por tonelada é igual ao de cem famílias
Cada tonelada de alumínio produzida no país equivale ao consumo de energia de cem famílias brasileiras em um mês, calcula Célio Bermann, que coordena o projeto “Energia, Sociedade e Meio Ambiente”, na USP. Não bastasse isso, diz, o setor é pouco empregador: a indústria gera 0,7 posto de trabalho para cada 1 milhão de KWh de energia que consome. Em outros setores, como o de alimentos e bebidas, essa relação é de 58 empregos para o mesmo volume de energia consumida. Já no setor têxtil, a relação é de 36 postos de trabalho para o mesmo volume de energia consumida.
Apesar disso, continua Bermann, o país estaria, ao construir as novas hidrelétricas da Região Norte, como as do Rio Madeira, repetindo o que ocorreu em Tucuruí, nos anos 70. A energia elétrica de Tucuruí é, ainda hoje, consumida exclusivamente pela Albrás, no Pará, e pela Alumar, em São Luís, no Maranhão. Ambas as empresas pagam uma tarifa subsidiada: a Albrás paga US$ 22 por MWh, e a Alumar, US$ 26. O custo de produção desta energia, calcula Bermann, é de US$ 38 e US$ 40, respectivamente.
Na redefinição do contrato de Tucuruí, em 2004, essas benesses foram praticamente mantidas e perdeu-se, na opinião de Bermann, uma “ótima oportunidade” de reverter esta situação. A subvenção à energia elétrica só tem uma razão social, caso possibilitasse “o acesso para as populações de baixa renda”.
— O risco agora é de se repetir esse mesmo quadro com as usinas do Madeira, e principalmente com o projeto de Belo Monte no Rio Xingu — complementa o consultor Joaquim Francisco de Carvalho, ex-diretor da Nuclen e ex-executivo da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), comentando que os países desenvolvidos não usam hidreletricidade para fabricar eletrointensivos.
— Esse tipo de produção, eles procuram afastar cada vez mais para países em desenvolvimento, onde a opinião pública não liga muito para o meio ambiente.
Setor paga compensação socioambiental
Não bastasse ser pouco empregador e ainda sobreviver graças a uma energia subsidiada, o setor de alumínio contribui relativamente pouco para o Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país): 4,3%.
O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, não concorda com as críticas e nega que o país esteja subsidiando a energia elétrica consumida pelas grandes empresas do país. Ele garante ainda que o setor de alumínio está pagando um extra para usar a energia elétrica que consome, sob a forma de compensações socioambientais.
— As críticas demonstram uma visão muito estreita do setor — avalia Eduardo Spalding, coordenador da Comissão de Energia da Associação Brasileira dos Produtores de Alumínio (Abal).
Spalding explica também que o setor está planejando investimentos futuros de R$ 20 bilhões e que a relação entre o consumo de energia e a tonelada de alumínio produzida no país é menor do que a média internacional: 14,9MWh contra 15,4MWh. O executivo também é vice-presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace).
A atual participação do setor no regime de autoprodução (geração própria) de eletricidade é da ordem de 38% de suas necessidades. Esse percentual tem crescido muito nos últimos anos, mas principalmente por meio de grandes usinas.
(Por Liana Melo, O Globo / IHUnisinos, 20/09/2009)