Segundo esboço, resolução defende o fortalecimento do papel da AIEA e incentiva o uso pacífico da energia atômica
O combate à proliferação de armas nucleares dominará a agenda Assembleia-Geral da ONU que ocorre nesta semana em Nova York. Uma resolução deve ser aprovada em reunião do Conselho de Segurança na quarta-feira (23/09), sob o comando de Barack Obama. Atualmente, os EUA presidem o órgão máximo da entidade.
Há meses a questão nuclear está presente indiretamente nos debates na ONU envolvendo o Irã e a Coreia do Norte. Nos últimos dias, a nova resolução, que não cita nenhum país, ganhou força. A negociação, segundo apurou o Estado com um diplomata que participa dos debates, está relacionada à decisão do governo Obama de voltar atrás nos planos de instalar um escudo antimísseis na Polônia e na República Checa, agradando a Rússia. Em troca, os russos devem dar apoio à nova resolução e, se necessário, também aprovar sanções mais duras contra o Irã. Ontem, Moscou anunciou ter arquivado os planos de instalar mísseis em Kaliningrado, perto da fronteira com a Polônia.
O texto da nova resolução ainda não foi definido e o diálogo deve prosseguir nos próximos dias. Mas o Estado teve acesso a um esboço que era o mais provável de ser aprovado. O teor da resolução deve fortalecer o papel da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), apoiar a conferência de não-proliferação nuclear prevista para 2010, defender o desarmamento progressivo e incentivar o uso pacífico da energia nuclear.
Em 2004, durante o governo de George W. Bush e apenas três anos após o 11 de Setembro, a Resolução 1540 do CS da ONU também tratou de questões nucleares, mas o foco era o terrorismo. Já a nova resolução volta a tratar de Estados nacionais, mesmo sem mencioná-los, com Obama levantando uma bandeira na qual, por um lado, demonstra estar disposto a seguir em frente com o "desarmamento por meio de acordos com a Rússia", segundo o ex-embaixador americano em Moscou Thomas Pickering. Ao mesmo tempo, Obama tenta dar garantias a países aliados do Oriente Médio e do Leste da Ásia de que pretende conter o Irã e a Coreia do Norte com a nova resolução.
Os iranianos são acusados por parte da comunidade internacional de tentar construir armas nucleares. O regime de Teerã diz que seus objetivos são pacíficos. Com a resolução, os EUA tentará ampliar o papel da AIEA para inspecionar os países-membros do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, como o próprio Irã. Atualmente, cinco países com arsenal nuclear integram o tratado - EUA, Rússia, França, Grã-Bretanha e China. Paquistão, Índia e Coreia do Norte realizaram testes nucleares, mas não são signatários. Israel, por sua vez, não confirma e tampouco nega ter bombas atômicas e se recusa a assinar o TNP.
Durante a Guerra Fria, analistas argumentavam que os EUA e a União Soviética não se atacariam justamente por possuir um arsenal nuclear. As bombas, segundo a teoria, tenderiam a provocar um equilíbrio de forças e evitariam um confronto direto, como realmente ocorreu. Com o colapso soviético, essa corrente manteve alguns defensores - como o professor da Universidade Columbia Keneth Waltz -, que afirmam não haver o risco mesmo com Irã ou Paquistão armados com a bomba. Segundo eles, Teerã ou Islamabad a usariam para dissuadir grandes potências e inimigos locais, não para atacar indiscriminadamente.
Obama, segundo alguns analistas, rejeita essa teoria ao optar por um escudo antimísseis de médio e pequeno alcance. Recentes declarações da secretária de Estado, Hillary Clinton, indicam como inevitável um Irã com capacidade nuclear, segundo Gary Sick, professor da Universidade Columbia e ex-assessor presidencial para assuntos iranianos.
A posição da Casa Branca seria a de que em países como Irã, Paquistão e Coreia do Norte, o risco de uma arma nuclear ser usada para um ataque é bem mais elevado, pois não há um equilíbrio entre o poder civil e o militar e tampouco há garantia de que as armas são bem monitoradas. Assim, a resolução da ONU e o fortalecimento da AIEA buscam justamente evitar que países mais fracos busquem armas atômicas.
(Por Gustavo Chacra, O Estado de S. Paulo, 20/09/2009)