A fosfateira no rio do Pinheiro, em Anitápolis, foi eleita como a jazida que irá abastecer de fosfato toda demanda de fertilizantes, além de prover empregos necessários para uma região carente do Estado de SC. Ou seja, uma iniciativa importante para trazer o progresso. Emprego é uma palavra mágica. Argumento quase religioso para permitir qualquer ação política que tenha consequências pouco ponderadas a médio e longo prazo.
O que não é dito, porém, é que a região onde será instalado tão benéfico empreendimento está próxima às nascentes do rio Braço do Norte. Região composta, portanto, por inúmeras famílias de pequenos proprietários que praticam a agricultura familiar e orgânica (que, por sinal, dispensa esse tipo de fertilizante e tem ótima empregabilidade).
Os municípios de Santa Rosa de Lima, Anitápolis, Rio Fortuna e Braço do Norte são responsáveis por uma considerável fração da produção hortigranjeira catarinense. Inclusive a produção de orgânicos é a que mais cresce junto ao mercado consumidor, principalmente internacional.
Apesar das iniciativas contrárias da mídia, as pessoas estão se informando cada vez mais e não é todo mundo que está disposto a consumir produtos com agrotóxicos ou que promovam o desgaste da terra e poluição da água. Além disso, para ser instalada, uma barragem será construída no rio Pinheiros e 247 hectares (equivalentes a 350 campos de futebol) de mata atlântica serão suprimidos. Isso sem falar na água necessária para o funcionamento da empresa.
A exploração da jazida de fosfato em Anitápolis tem um impacto tremendo que faz com que a suposta geração de emprego e impostos seja o menor deles. Os custos ambientais e de saúde reverterão gastos para o Estado (para todos, portanto) em que, ao fim e ao cabo, zerarão ou tornarão negativos os supostos ganhos econômicos da região.
A Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA) tem, em seu site, informações muito úteis que não foram em nenhum momento mencionadas no relatório de impacto ambiental apresentado pela Bunge/Yara. Uma delas é de que a exploração de jazidas de fosfato similares nos EUA resultou em contaminação por radioatividade e metais pesados nos lençóis freáticos e na atmosfera. Isso porque para a produção de uma tonelada de ácido fosfórico é necessária a produção de quatro toneladas e meia de um subproduto chamado sulfato de cálcio, que vem acompanhado de altas concentrações de radionuclídeos.
Ao longo do processamento do fosfato, quantidades imensas de sulfato de cálcio são depositadas em montes que a mineradora chama de “rejeito” e que as empresas divulgam como sendo material que não será usado. Os radionuclídeos são partículas que ficam livres no ar e na poeira. Podem ser respirados pela população e ser depositados na agricultura, e lagos e rios locais.
Se a preocupação do poder público é gerar empregos, sugiro investir em isenção fiscal para a produção de orgânicos e agricultura familiar, a exemplo da recente ação do governador Luiz Henrique para ajudar os produtores de suínos do Estado. Uma política pública responsável é aquela capaz de pensar benefícios a curto, médio e longo prazo. Não se preocupar com resíduos, lixo e uso de água, de determinada iniciativa, é, no mínimo, razão de responsabilidade civil. O custo para a saúde dos moradores da região deve ser uma preocupação do poder público, salvo se os compromissos assumidos sejam com outros grupos que não com a sociedade catarinense.
Aí o esforço em trazer uma empresa como essa para Anitápolis se explica. Empresa, inclusive, que não consegue no seu país de origem desenvolver iniciativa semelhante. Será que os noruegueses não estão interessados nas divisas possíveis da Bunge/Yara? Ou eles percebem que o custo-benefício não é tão atrativo? Nunca há uma única alternativa para resolver os problemas sociais de uma região. O inaceitável é que a alternativa eleita seja uma que traga mais prejuízos que soluções.
Dia 20 de setembro haverá uma mobilização no trevo de Anitápolis. É urgente que a sociedade busque entender o impacto desse empreendimento e, a partir disso, tome uma posição autônoma e não de senso comum gerada por alguma campanha milionária de publicidade.
(Por Samantha Buglione*, A Notícia, 15/09/2009)
* É professora de direito e do mestrado em gestão e políticas públicas da Univali, doutora em ciências humanas, e seu blog é http://samanthabuglione.blogspot.com