Seres humanos não resistiriam às águas geladas que essas criaturas chamam de lar, mas, graças a mecanismos especiais, elas conseguem viver abaixo da superfície de gelo
Baleias, golfinhos, focas e outros mamíferos marinhos podem gerar o próprio calor e manter uma temperatura corporal estável, apesar das condições ambientais variáveis. Assim como as pessoas, eles são homeotérmicos endotérmicos ─ ou seja, são animais “de sangue quente”. Mas esses mamíferos são especialistas em termorregulação: suportam temperaturas na água, que chegam a 2º C negativos e temperaturas do ar de 40º C negativos.
Ann Pabst, zoóloga marinha da University of North Carolina, em Wilmington, explica como os mamíferos marinhos conseguem sobreviver ao frio extremo. As águas oceânicas polares podem chegar a 2º C negativos. Mesmo em regiões temperadas ou tropicais, a água do mar pode atingir 1º C negativo em grandes profundidades.
Vocês podem perguntar como a água a 2º C negativos não se transforma em gelo. A razão: a água do mar contém sal, que congela a uma temperatura um pouco menor que a água doce, que congela a 0o C. Isso acontece, na verdade, porque o sódio e o cloro do sal interferem com a capacidade que as moléculas da água têm de se juntarem para formar cristais de gelo.
Algumas espécies de pinípedes ─ que incluem morsas, focas e leões marinhos ─ e algumas baleias, golfinhos e botos vivem perfeitamente bem nessas condições. Alguns exemplos específicos são as baleias-jubarte, baleias azuis ─ os maiores animais do planeta ─ as orcas, as focas de Weddel e os elefantes marinhos. A pele desses animais está repleta de células nervosas termossensíveis, como a pele de qualquer outro mamífero. Eles certamente percebem as mudanças na temperatura, pois respondem a estímulos de temperatura. Mas ainda não sabemos como eles relacionam as variações de temperatura com as suas sensações, isto é, se sentem frio ou desconforto.
As baleias e outros mamíferos marinhos mantêm uma temperatura corporal interna parecida com a nossa – de mais ou menos 37º C. Para mantê-la sob condições extremas, elas têm dois tipos de resposta: a comportamental e a fisiológica. Uma resposta comportamental típica é a migração. No inverno, as baleias-francas grávidas migram das águas do Canadá e da Nova Inglaterra para as costas da Geórgia e da Flórida para darem à luz seus filhotes.
A forma fisiológica para minimizar a perda de calor é manter uma relação corporal área/volume relativamente baixa: uma pequena quantidade de pele ─ através da qual o calor é trocado com o ambiente ─ e um grande volume de tecido corporal, que gera calor. Animais maiores tendem a ter relações área/volume menores, e a maioria dos mamíferos marinhos é bem grande. Entre os menores estão as lontras, que têm um tamanho comparável ao de um gato doméstico grande.
Os mamíferos marinhos dispõem também de outros excelentes isolantes térmicos, o pêlo e a gordura. A lontra marinha tem o pêlo mais denso entre todos os mamíferos conhecidos: 130 mil fios por centímetro quadrado. Essa é aproximadamente a quantidade de fios de cabelo em toda a cabeça de uma pessoa. O isolamento térmico do pêlo é mais eficiente quando o pelo está seco, porque o ar preso nele, é um bom isolante. Os pêlos da lontra são tão densos que conseguem aprisionar uma camada de ar logo acima da pele, mesmo quando o animal está nadando.
Água, ao contrário, é um eficiente condutor de calor; ela transfere calor de um corpo qualquer cerca de 25 vezes mais rápido que o ar. Animais que passam a maior parte do tempo na água dependem de uma camada de tecido formado por gordura, colágeno e elastina, que fornece, entre outras coisas, isolamento térmico e reservas energéticas. A quantidade de tecido gorduroso varia de um animal para outro. Os botos de Newborn são os mais gordinhos: 43% de toda a sua massa corporal é pura banha.
Animais desnutridos ou doentes podem ter dificuldades em manter um estoque de gordura saudável, tanto em e quantidade ─ que pode ser media pelo teor de gordura – quanto em qualidade, e por isso, podem morrer se expostos a temperaturas muito baixas. Se forem deslocados dos seus habitats naturais, também podem sucumbir a temperaturas muito altas ou muito baixas. No entanto, não é provável que isso ocorra com animais selvagens saudáveis.
(Por Coco Ballantyne, Scientific American Brasil, 19/08/2009)