O vírus da figura aí é o Chikungunya (CHIKV), um alphavírus da família Togaviridae transmitido por mosquitos, principalmente pelo Aedes aegypti. Causa dores de cabeça, náusea, febre, fadiga e dores musculares e nas juntas. Seu nome quer dizer "aquele que curva" ou "andar curvado" em algum dialeto africano, referência ao que causa ao portador. Já infectou mais de 1,25 milhões de pessoas na Índia, levando-se em conta apenas os casos reportados (a proporção deve ser muito maior).
Entre 2005 e 2006 causou na ilha francesa La Réunion cerca de 266.000 casos, o que equivale a um pouco mais de um terço (34%) da população da ilha. O que causou mais estranheza foi o fato de que o A. aegypti não é um mosquito comum nessa ilha e tem sua distribuição restrita. Aparentemente quem fez a transmissão do CHIKV foi outro mosquito chamado Aedes albopictus conhecido como mosquito-tigre asiático, de onde foi isolado RNA viral durante a epidemia.
Em um artigo que saiu na PLoS Pathogens, a equipe do Prof. Stephen Higgs da Universidade do Texas conseguiu relacionar a mudança de vetor do A. aegypti para o A. albopictus a uma mutação de um aminoácido, de alanina para valina na posição 226 da proteína E1.
E1 e E2 são proteínas do envelope viral, uma espécie de capa lipídica que é levada pelo vírus ao sair da célula, e o recobre, intermediando a entrada na próxima célula, que será infectada. E2 é responsável pelo contato com o receptor celular (nós não temos receptores "feitos" para os vírus, acontece que as células têm diversos receptores na superfície, responsáveis por todo o tipo de sinalização, e os vírus fazem uso deles) e a proteína E1 fica ligada à ela, mediando a fusão.
Tal mutação aumenta a capacidade do vírus de infectar e de se replicar no mosquito-tigre. Com isso, a carga viral necessária em uma pessoa doente ter para transmitir o vírus ao pernilongo é menor, propiciando uma transmissão mais rápida e disseminada.
Essa descoberta levanta novas questões relativas à disseminação de doenças. O Aedes albopictus é um mosquito bem disseminado, incluindo uma grande parte da Europa, e fica a dúvida sobre quais vírus podem sofrer a mesma mutação e consequente transmissão. Recentemente, em Ravenna, região norte da Itália ocorreram cerca de 200 casos de chikungunya, sendo que o RNA viral foi encontrado em mosquitos-tigre.
Em tempos de preocupação com aquecimento global e aumento da população de vetores de doenças como o Aedes aegypti fica a mensagem de que esta não deve ser a única preocupação.
Fontes
Powers, A., & Logue, C. (2007). Changing patterns of chikungunya virus: re-emergence of a zoonotic arbovirus Journal of General Virology, 88 (9), 2363-2377 DOI: 10.1099/vir.0.82858-0
Tsetsarkin, K., Vanlandingham, D., McGee, C., & Higgs, S. (2007). A Single Mutation in Chikungunya Virus Affects Vector Specificity and Epidemic Potential PLoS Pathogens, 3 (12) DOI: 10.1371/journal.ppat.0030201
(Por Atila Iamarino, Rainha Vermelha, 09/09/2009)