Imagine saber com meses de antecedência quando e onde podem ocorrer inundações e secas. É isso o que mais de 150 países se comprometeram a conseguir na terceira Conferência Mundial sobre o Clima. Os “serviços climáticos” são primos distantes dos serviços meteorológicos que fazem a previsão do tempo. As novas tecnologias e a ciência abriram a janela às previsões de prazo mais longo, permitindo informar sobre secas ou outros eventos climáticos semanas e até meses antes que ocorram.
Este anos os cientistas puderam prever meses antes as inundações sem precedentes do vale de Red River, nos Estados Unidos, o que permitiu à população local se preparar e evitar consequências piores, disse a ecologista Jane Lubchenco, diretora da Administração Nacional Oceanográfica e Atmosférica (NOAA, dos EUA) e presidente da delegação norte-americana em genebra. “Imagine os agricultores podendo determinar o que plantar e onde, segundo as previsões de seca de três a cinco anos no futuro, ou as comunidades costeiras capazes de saber as intensidades das tempestades e do nível do mar”, disse Lubchenco à IPS.
O órgão que a Conferência propôs criar, o Marco Global dos Serviços Climáticos, “fortalecerá a produção, o acesso, a prestação e a aplicação da previsão e dos serviços climáticos com base na ciência”, afirmou. O mesmo incluirá um Sistema Mundial de Observação do Clima, um Programa Mundial de Pesquisa do Clima e sistemas de informação de serviços climáticos. A idéia, em grande parte, é gerar capacidade nos países em desenvolvimento e fornecer informação de uma forma útil às pessoas que tomam decisões em todos os níveis, desde autoridades até produtores agrícolas.
“Hoje é um dia histórico para conseguir que os serviços climáticos estejam ao alcance de todos”, disse Michel Jarraud, secretário-geral da Organização Meteorológica Mundial (OMM) e presidente da conferência, ao mais de dois mil cientistas, especialistas e autoridades relacionados com o tema, no encerramento do encontro na última sexta-feira em Genebra. Um grupo de trabalho especial realizará consultas durante 12 meses para decidir como instrumentar este ambicioso projeto. Suas recomendações serão analisadas e será adotado um plano para implantá-lo no próximo congresso da OMM em 2011. “Melhorar o desenvolvimento e a prestação dos serviços climáticos será fundamental para o futuro da segurança alimentar”, disse Lubchenco.
Isto é especialmente válido porque a mudança climática está alterando o clima ao prender mais calor na atmosfera. Isso implica que os agricultores, entre outros, já não podem confiar em sua experiência passada nem no conhecimento histórico para prever as condições dos cultivos das safras seguintes. “A sociedade necessitará de ferramentas de informação que se adaptem na medida em que o clima continuar mudando, apesar das disposições que forem tomadas para reduzir as emissões de gás de efeito estufa”, disse Jarraud.
A aplicação do Marco Mundial transcende as negociações climáticas que acontecerão em dezembro em Copenhague sobre um novo tratado mundial de redução das emissões desses gases, ressaltou.
A mudança climática é um fato, e embora as emissões caíssem a zero neste momento, “a comunidade internacional deve abordar a necessidade de tomar medidas de adaptação, especialmente nas regiões mais vulneráreis do mundo”, disse aos delegados Rajendra Kumar Pachauri, presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática e ganhador do prêmio Nobel da Paz em 2007.
Uma vez mais, Pachauri recordou às autoridades presentes que para limitar o aumento máximo da temperatura terrestre em dois graus centígrados, as emissões de gás de efeito estufa deverão chegar ao seu ponto máximo em 2015 e depois cair abruptamente. O ambientalista destacou os enormes benefícios que a redução das mesmas terá para a saúde, agricultura, trabalho e segurança energética.
“A mudança climática pode desencadear o desastre econômico”, assegurou Ban Ki-moon, secretário-geral da Organização das Nações Unidas, aos uma visita aos gelos polares ao norte da ilha norueguesa de Svalbard. Esta geração e as futuras pagarão um preço elevado se em Copenhague não for adotado um novo tratado climático que reflita o que a ciência indica como necessário, acrescentou. Por sua vez, Toke Talagi, primeiro-ministro do pequeno país insular de Niue, no Pacifico, expressou profunda frustração e alarme pela situação dos pequenos estados insulares. “Estamos em tempos de crise. É possível que os serviços climáticos e os fundos para a adaptação cheguem tarde às nossas ilhas em processo de afundamento”, ameaçadas pela elevação do nível das águas e pelas tempestades cada vez mais fortes, disse Talagi aos delegados.
Niue e a Aliança dos Pequenos Estados Insulares querem que o mundo desenvolvido se comprometa a reduzir em 40% as emissões até 2020. O mais próximo dessa meta é o compromisso da União Européia de redução em 20%. “As grandes economias ignoram a ciência e tentam tirar um pouco mais da mãe Terra”, disse Talagi. “Devemos tomar as decisões adequadas em Copenhague. A mudança climática transcende as fronteiras e não respeita ninguém”, acrescentou.
(Por Stephen Leahy, IPS / Envolverde, 09/09/2009)