Os norte-americanos gostam de carne. Em um ano, cada um consome, em média, cerca de cem quilos de frango, porco e vaca. Mas alguns estão gastando menos com estes alimentos devido a casos de contaminação e insegurança sanitária, surgimento de bactérias resistentes e condições de sofrimento animal nos sistemas de criação intensiva. A culpa, dizem os críticos, é da indústria agropecuária que confina os animais em espaços mínimos para maximizar a produção e os ganhos em um mercado muito competitivo. As expectativas dos consumidores de carne a preços módicos na mesa também determinam prioridades da indústria.
Para manter os animais em estreitas jaulas, os fazendeiros acabaram dando-lhes antibióticos, não para combater infecções, mas para prevenir focos e impulsionar o aumento de peso. Até 70% dos antibióticos usados nos Estados Unidos são destinados aos animais de fazenda, embora a ciência, há décadas, venha alertando que sua utilização está criando uma cadeia de efeitos negativos, como a reprodução de cepas de bactérias resistentes, que minam a efetividade dos antibióticos dos quais dependemos para combater nossas próprias infecções.
Na América do Norte, a maior parte dos porcos e aves de curral é criada sob teto, em parques de alimentação intensiva para animais confinados (CAFO), que são um caldo de cultivo para a proliferação de micróbios daninhos. A adição de antibióticos ao alimento permite que as bactérias se adaptem e consigam neutralizar boa parte dos medicamentos. De fato, afirmam os microbiologistas, ao usar antibióticos em excesso, selecionamos as mais poderosas, frente às quais estamos menos preparados para nos defender. O desenvolvimento de novos antibióticos contra elas é caro e lento.
Um notável estudo, publicado em 2008 pela independente Pew Comission on Industrial Farm Animal Production (Comissão Pew sobre Produção Industrial de Animais), estabelece que o uso excessivo de antibióticos é um problema de saúde pública que afeta os trabalhadores das fazendas, as comunidades próximas, os aquíferos e os consumidores. Os custos dos tratamentos por bactérias resistentes chegam a US$ 5 bilhões por ano nos Estados Unidos, afirma a Comissão, que reclama o fim de todos os usos não terapêuticos de antibióticos na produção agropecuária. A Dinamarca adotou uma medida como essa em 2000, e em 2006 foi seguida pela União Européia. Essa experiência, afirmam seus promotores, demonstra que os animais de fazenda podem ser criados em confinamento relativo sem o uso preventivo de antibióticos.
Os produtores afirmam que a chave é voltar a formas tradicionais de criação, ao ar livre e sobre o solo, não em pequenas caixas com grades suspensas sobre enormes lagoas formadas pelas próprias sobras dos animais. Como ocorre com as crianças quando brincam fora de casa, a exposição aos microorganismos das propriedades agrícolas permite aos animais desenvolver uma imunidade natural às infecções mais comuns. O fazendeiro Fred Kirschenmann, do Estado de Dakota do Norte, acredita que os produtores não devem ser os primeiros culpados. A falha é do sistema, orientado por uma demanda de preços baixos, no qual têm seu papel tanto consumidores como grandes intermediários.
Entretanto, quando são considerados todos os impactos, o sistema não é tão efetivo em relação aos custos. Lidar com os focos de epidemia, a queda da eficácia dos antibióticos para uso humano e as condições de vida animal, traz custos maiores para a sociedade. Diante das pressões de cientistas, funcionários e público consumidor, a indústria parece estar voltando a práticas até há pouco desacreditadas por serem consideradas ineficientes ou danosas. Na feira anual de carne suína World Pork Expo, realizada no começo de junho em Des Moines, no centro-norte dos Estados Unidos, observou-se que a maioria dos criadores está reduzindo o uso de antibióticos na alimentação.
Como consumidores, esperamos que a carne chegue embalada em plástico retrátil e a preços baixos. Nossas decisões pessoais podem parecer inofensivas, mas somadas geram consequências que prejudicam a todos nós. Queremos e merecemos alimentos saudáveis e a preços módicos. Porém, devemos nos assegurar de que a busca pelo preço baixo não nos crie novos problemas.
(Por Mark Sommer*, Terramérica / Envolverde, 07/09/2009)
* O autor é colunista e diretor do premiado programa de rádio A World of Possibilities.