No dia 19 de agosto, em Brasília, diante de líderes do Movimento dos Sem-Terra (MST), o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, deu a eles a notícia que esperavam ouvir. Prometeu que dentro de 15 dias o governo promoveria a alteração dos índices de produtividade rural no País. A promessa foi feita dentro do gabinete do ministro Luiz Dulci, da Secretaria Geral da Presidência da República.
Os sem-terra saíram comemorando. Nos dias seguintes, porém, ficou claro que o ministro Cassel prometeu uma mercadoria que não podia entregar. A atualização dos índices está prevista em artigo da Constituição de 1988 e na lei que o regulamentou, em 1993. Se quiser, Lula pode alterá-los. Basta chamar seus ministros do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura e determinar que assinem uma portaria apontando os novos índices. Em seguida convoca o Conselho Nacional de Política Agrícola e pede a seus integrantes (nomeados por ele) para que endossem a medida. E pronto.
Parece simples. Lula, no entanto, está prestes a completar sete anos do poder sem alterar os índices. Segue os passos dos seus antecessores, que também acharam melhor não fazê-lo. Para entender a questão é bom recordar o que aconteceu durante os debates da Constituinte sobre a reforma agrária. Havia uma proposta original, determinando que qualquer terra poderia ser desapropriada se fosse considerada adequada para a reforma.
Os representantes dos proprietários rurais, porém, sentiram-se ameaçados e frearam os reformistas. Para isso incluíram no texto um adendo segundo o qual só pode ser desapropriada a terra improdutiva. E como é que se determina o que é produtivo ou não ? Pelos tais índices de produtividade.
Os defensores da reforma agrária, entre eles Cassel, lembram que os índices em vigor no Brasil são os de 1973. E que seria lógico alterá-los, uma vez que a agricultura brasileira avançou aos saltos nas últimas décadas. A cada vez que se fala no assunto, porém, o País parece reviver o alvoroço da Constituinte. Os proprietários voltam a manifestar seus temores de que se trata de uma ameaça sobre o direito de propriedade. Alguns líderes ainda veem na medida um primeiro passo para outras mudanças, como a aprovação da PEC que determina que terras com trabalho escravo sejam destinadas para a reforma.
No pano de fundo permanece o debate político da reforma. Em conversas com representantes dos proprietários, fica claro que são contrários à ideia de desapropriar terra para atender a um modelo de reforma agrária que consideram fracassado. Os dois lados têm força política. O MST tem o apoio da CUT, da Pastoral da Terra e de outras entidades. Os proprietários contam com uma bancada parlamentar poderosa. Ao contrário do que Cassel tentou vender, trata-se de uma equação política complicada, cuja solução compete ao chefe dele, o presidente.
(Por Roldão Arruda, O Estado de S. Paulo / IHUnisinos, 05/09/2009)