Estudo americano mostra que devastação migrou para regiões de floresta mais densa, com maior teor de carbono. Estimativa usou dados de 2001 a 2007; segundo trio da Universidade Stanford, emissão de gases-estufa pode crescer 25% no futuro
Se a taxa anual de derrubada da Amazônia realmente cair, a quantidade de carbono a ser lançada na atmosfera, em tese, deveria cair na mesma proporção. Mas, como o mundo real amazônico é complexo, a premissa acima é falsa. Pelo menos é o que diz um grupo da Universidade Stanford (EUA). Mesmo que a taxa média de corte raso se mantenha na média observada entre 2001 e 2007, os pesquisadores Scott Loarie, Greg Asner e Christopher Field estimam que a emissão de gás carbônico tende a crescer 25% no futuro.
Isso porque o desmatamento tem migrado das florestas mais ralas do sul e extremo leste amazônico para matas mais densas no coração da Amazônia -como a Terra do Meio, no Pará, e o noroeste de Mato Grosso. Essas florestas têm mais biomassa, ou seja, estocam mais carbono por hectare.
O resultado é que a poluição por quilômetro quadrado desmatado aumentou, embora a taxa média de desmatamento no período 2001-2007 não tenha sido muito diferente da registrada nos anos 1990.
O estudo do trio americano, publicado em julho no periódico "Geophysical Research Letters", traz um alerta climático e outro ecológico: "À medida que o desmatamento migra para sistemas de biomassa mais alta, pode haver retroalimentações ainda ignoradas não apenas no carbono, mas também em ciclos hídricos e biodiversidade", escrevem os pesquisadores.
Mas, segundo Loarie, o problema traz também uma oportunidade para o Brasil no debate climático internacional. Reduzir o desmatamento nessas florestas com mais carbono poderia "dar ao Brasil mais créditos de carbono no contexto da Convenção do Clima das Nações Unidas", devido ao chamado Redd (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal). Trata-se de um mecanismo a ser negociado no final deste ano na conferência do clima das ONU em Copenhague. Ele prevê que países que reduzirem seu desmatamento poderão receber dinheiro de nações desenvolvidas, em forma de doações ou em forma de créditos de carbono.
Dinheiro sujo
Acontece que a maneira como o Redd deve ser regulamentado causa polêmica no Brasil. Apesar de o governo ser unânime na defesa da participação das florestas no futuro acordo do clima como mecanismo de redução de emissões, há um debate acalorado sobre se deve haver ou não um mercado para o carbono florestal, e que tipo de mercado seria esse.
O Itamaraty, por exemplo, não quer que países ricos possam abater, de sua cota de corte de emissões, créditos de carbono comprados no mercado de Redd. Prefere verbas voluntárias, como o Fundo Amazônia. O diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Gilberto Câmara, chegou a classificar esses créditos como "dinheiro sujo".
"Uma vez que o Redd poderá ser creditado para os países que evitarem emissões por desmatamento -e o que permanece da Amazônia guarda altas quantidades de biomassa- essa ferramenta poderá ser bastante efetiva para a proteção da floresta brasileira", diz Loarie.
(Por Eduardo Geraque, Folha de S. Paulo, 03/09/2009)