Apesar de comemorar a atualização dos índices de produtividade da terra, prometida pelo governo brasileiro em agosto, a CPT (Comissão Pastoral da Terra) teme que o "compromisso histórico" seja engavetado caso a bancada ruralista do Senado pressione o Governo Federal. Em 19 de agosto, o Executivo garantiu que, em 15 dias, enviaria um projeto para o Congresso Nacional, o que ainda não foi cumprido.
"O governo pode levar a medida à frente caso a base aliada que faz parte da bancada ruralista afrouxe. Mas quando eles acocham, o governo engaveta [os projetos]. Nós não temos nenhuma certeza de que o projeto será enviado [ao Congresso], mas acontece que agora está exposto, porque o governo garantiu aos movimentos, tem uma pressão muito grande", avaliou Dirceu Luiz Fumagalli, coordenador nacional da CPT.
A atualização dos índices de produtividade é rechaçada pela bancada ruralista do Senado federal, mas tida como "exigência de justiça social" para a CPT, que vê nela a possibilidade de assentamento de milhares de famílias rurais sem terra de todo o Brasil. Os índices estão defasados há 29 anos.
Caso envie a proposta ao congresso, o presidente "Lula estará simplesmente cumprindo a Lei Agrária 8.629, de 25 de fevereiro de 1993", apontou a CPT em nota. O Artigo 11 dessa lei determina que "os parâmetros, índices e indicadores que informam o conceito de produtividade serão ajustados periodicamente, de modo a levar em conta o progresso científico e tecnológico da agricultura e o desenvolvimento regional".
Dados do estudo "Fontes e Crescimento da Agricultura Brasileira" mostram que, de 1975 a 2008, a taxa de crescimento do produto agropecuário foi de 3.68 % ao ano, o que dá suporte à atualização dos índices. No período de 2000 a 2008, o crescimento anual foi de 5.59. A pesquisa foi divulgada em julho de 2009 pelo Ministério da Agricultura.
Outro dado que estimula a medida governamental é o crescimento da PTF (Produtividade Total dos Fatores). O índice brasileiro (que, entre 2000 e 2008, chegou a 4,98% anualmente) bateu o chinês (de 2000 a 2006, foi de 3.2%), o estadunidense (de 1975 a 2006 foi de 1.95%) e o argentino (de 1960 a 2000, de 1.84%).
Em 18 de agosto, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, garantiu, em reunião com representantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), que, em 15 dias, enviaria ao Congresso Nacional uma proposta de atualização dos índices de produtividade. A promessa ainda não foi cumprida.
Ruralistas repudiam medida
O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes (PMDB), apresentou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a posições de seu partido, terminantemente contrário à atualização dos índices de produtividade. Anteriormente, Lula pediu aos ministros Cassel e Stephanes que entrassem em acordo quanto à atualização dos índices. Enquanto Cassel garantia a medida, na semana passada, deputados do PMDB recomendaram a Stephanes que não assinasse a portaria interministerial que trata do tema.
"Por trás desta guerra da bancada ruralista, teimando em manter os velhos índices de produtividade de 1975 está o intento de preservar o latifúndio improdutivo das empresas nacionais e estrangeiras, desconsiderando a função social da propriedade", rebateu a CPT em nota.
Como os índices são os mesmos desde 1980 - com base no Censo Agropecuário de 1975 -, as fazendas facilmente atingem o nível de produção necessária para não serem desapropriadas e liberadas para assentar sem terras. Segundo a Constituição federal, apenas terras consideras improdutivas podem ser desapropriadas para a reforma agrária.
Apesar disso, a CPT acredita que "a superação da secular e estrutural injustiça social no campo e do resgate da dívida social para com os excluídos da terra só se concretizará quando se colocarem em nossa Constituição limites para a propriedade da terra". Os ruralistas apontam que cerca de 400 mil propriedades rurais serão afetadas pela atualização dos índices. "Na realidade, este número corresponde a apenas 10% das propriedades rurais, embora ocupem 42,6% das terras".
Das 4.238.447 propriedades cadastradas pelo Incra, 3.838.000 (90% do total) não seriam afetadas pela medida. Elas garantem 70% da alimentação destinada à população brasileira. "Ao passo que essas outras 400 mil, com o ferrenho apoio da bancada ruralista, são as que recorrem ao governo para adiar indefinidamente o pagamento de suas dívidas com os bancos", criticou a CPT.
(Por Robson Braga, Adital, 02/09/2009)