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direitos quilombolas terras quilombolas
2009-08-31

A titulação de terras quilombolas, atualmente, obedece ao Decreto 4887, de 2003, que foi considerada por antropólogos, juristas e especialistas como um avanço para o reconhecimento e valorização das comunidades remanescentes de quilombolas. O problema é que o decreto corre perigo.  Ele está sendo questionada por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) impetrada em 2003 pelo Partido da Frente Liberal (PFL, atual Democratas), argumentando ser inconstitucional o Decreto. O julgamento da ADI ainda não tem data, mas pode acontecer brevemente.

Nesta quarta (26/08) especialistas no assunto que participaram do debate "Comunidades Quilombolas: territorialidade e proteção jurídica", em São Paulo, afirmaram que revogar o decreto seria um retrocesso e prejudicaria as comunidades.  Flávia Piovesan, professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), afirmou que o decreto atual honra os compromissos internacionais firmados pelo Brasil, que visam garantir os direitos das minorias.

Ela acredita que revogá-lo pode, inclusive, comprometer o país.  "Se essa ação for julgada precedente, terá vários impactos no cenário internacional, e o Brasil poderá ser responsabilizado por violar os direitos [das comunidades quilombolas]", explica.  Entre os acordos firmados está a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais, adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989.

Caso o decreto seja revogado, a titulação passa a obedecer ao antigo Decreto 3912, de 2001, que somente reconhecia como terras quilombolas as que "estavam ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos em 5 de outubro de 1988", além de atribuir a função de iniciar, dar seguimento e concluir o processo administrativo de identificação dos remanescentes das comunidades dos quilombos à Fundação Cultural Palmares (FCP).  Atualmente o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) realiza essa função.

Uma das características do decreto 4888 é que a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos é atestada mediante autodefinição da própria comunidade e que, segundo o decreto, possuam uma "trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida".  Para Flávia, não se trata apenas de reconhecer terras, mas da relação de identidade cultural com aquele espaço.

Dívida social
"Se nós não lembrarmos que o começo de tudo foi a escravidão, se não lembrarmos que temos uma dívida social a ser paga, não adianta discutir direitos.  É uma dívida que precisa ser paga e precisamos fazer essa reparação", afirma Girolamo Domenico Treccani, professor de direito Agrário da Universidade Federal do Pará (UFPA).  Segundo ele, é necessário resgatar a história dos direitos dessas comunidades, para "resgatar nossa própria história".  A proposta de ADI, entretanto, é que o quilombo continue sendo visto como era há 20 ou 30 anos, uma visão ultrapassada.

Treccani afirma também que existe uma solução para que as comunidades quilombolas sejam reconhecidas e os processos de reconhecimento de terras sejam mais ágeis.  "Qual a melhor maneira de defender os direitos das comunidades remanescentes de quilombos?  Cumprir o artigo 68 [do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias].  Só isso.  O dia em que se convencerem de que é só cumprir o artigo 68 boa parte está resolvido.  E agora pergunto: 20 anos depois que isso está no papel, por que ainda não aconteceu?".

(Por Aldrey Riechel, Amazonia.org.br, 27/08/2009)


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