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mst violência rural assassinatos
2009-08-27

Nesta quinta (27/08), a Coordenação de Movimentos Sociais vai realizar uma vigília em memória do sem-terra Elton Brum da Silva. Ele foi morto há uma semana, pela Polícia Militar, durante um conflito com os trabalhadores sem-terra, acampados no município de São Gabriel, “a cidade do latifúndio”. A concentração para a vigília começa às 17h, em frente à Assembléia Legislativa do RS. A IHU On-Line também presta a sua homenagem a Brum. Irmão Antonio Cechin e Jacques Alfonsin escreveram juntos um depoimento, relatando o que representa a morte do sem-terra para o movimento e para as lutas sociais no Estado. Já Michelini Oliveira e Minna Ponin, companheiras de Elton no movimento, também falaram sobre sua morte e deixaram a sua manifestação.

Confira os depoimentos.

Depoimento de Irmão Cechin e Jacques Alfonsin
Em mais uma execução de ordem judicial de reintegração de posse contra agricultores sem-terra, em nosso Estado, foi assassinado, na sexta-feira passada, outro agricultor sem-terra, integrante do MST, Elton Brum da Silva, 44 anos, dois filhos.  Desarmado, foi morto com um tiro de espingarda 12, desferido nas suas costas.
   
Tragédias como essa entram nas estatísticas oficiais quase como rotina, e o aparelho da repressão policial que as provoca sai isento de qualquer responsabilidade por elas, absolvido sob dois argumentos principais: estava agindo no estrito cumprimento do dever legal, a agressão primeira partiu dos próprios agricultores e a reação armada não tinha outra saída.

Como tudo isso se transforma em processo, o papel vai assimilando alegações de quem acusa e de quem se defende, produção de provas, perícias, depoimentos, um diz-que-diz-que infindável, cercado de mentiras, versões conflitantes, chicana de toda a ordem, prorrogações de audiências, tudo explicado e justificado pelas regras formais inflexíveis da sua tramitação.  

O tempo passa, a mídia está interessada em outras manchetes, as famílias das vítimas cansam de frequentar delegacias, cartórios, repartições, a dor vai aumentando a um limite insuportável até que tudo recomece de novo com outros assassinatos. Quanto aos anteriores, bem, esses que permaneçam sendo processados...

Em programa radiofônico da tarde do mesmo dia, ouvidas a promotora e a juíza de São Gabriel, a primeira avaliou a conduta da Brigada Militar, que executou a ordem judicial contra os sem-terra,  como “profissional” (!?), e a segunda se limitou a relatar o que tinha ouvido dizer, a respeito. Tudo muito asséptico e limpo. Quem as ouvisse diria que a expulsão da área ocupada tinha sido feita sem nenhuma violência, ninguém ferido nem morto, elas não tinham nada a ver com o fato.

Em nome do “respeito à lei”, a mesma que prevê a execução da reforma agrária transferida para jamais, deu-se cumprimento ao mandado, o Legislativo a redigiu, o Judiciário julgou “com base nela” e o Executivo franqueou a força necessária para que o assassinato se consumasse. Assim se manifesta contra os pobres aqui no Rio Grande do Sul, o que a Constituição chama de Estado democrático.  

Estado por Estado, o que não dá mais para se suportar é esse estado de coisas. Democrático de direito ele não é. Diariamente circulam notícias sobre violências praticadas contra multidões pobres, com os seus direitos à alimentação e à moradia violados, sacrificados por ordens judiciais. Que alguma coisa nisso está errada e a responsabilidade por essa situação tenha de ser imputada não às suas vítimas, mas sim aos seus algozes, é hora, mais uma vez, de se denunciar. 

Foi o que aconteceu em São Gabriel no dia seguinte ao do assassinato.  Depois do velório de Elton, um ato público do MST e de vários outros movimentos populares, sindicatos, representantes de partidos políticos, foi feito numa praça daquela cidade. A temperatura dos discursos, bastante indignados, tinha tudo para atiçar vingança e revanche, ainda mais considerando o fato de que, até agora, nem se sabe quem puxou o gatilho, e quem sabe trata de ocultar quem matou.

Nada disso se ouviu. Em vez de celebrarem exéquias sobre um cadáver, as falas valorizaram a coragem e o heroísmo do morto, as muitas vidas pelas quais ele deu a sua, que hão de ser diferentes a partir do seu sacrifício. À dor e à estupefação pela crueldade que o vitimou, é bem possível ver que o desafio, agora, não há de se limitar ao choro dos seus queridos familiares e companheiros.   

Até pelo contrário. Se o desespero e o desânimo do seu povo vencessem, aí sim a sua morte teria sido em vão. A multidão que devolveu o corpo de Elton à terra sabe que, historicamente, muitos outros “Eltons” tiveram de morrer, transformando-se nela para que seus descendentes vivessem em Justiça e Paz. Não há exagero em se dizer, portanto, que Elton já ressuscitou. O sangue generoso que ele derramou corre agora em nossas próprias veias, e a terra que o acolheu comprova que ela é escrava de um “direito” iníquo, perverso, antissocial. É a nós que cabe libertá-la para também nos libertarmos.   

À maldição que pesa sobre todo um sistema econômico, político e jurídico que, para se conservar e reproduzir, precisa matar gente e terra, o assassinato do Elton acrescentou mais uma causa para que a nossa luta contra a injustiça social que ele mantém e alimenta, em vez de regredir, recrudesça.

Iludem-se, pois, aqueles e aquelas que nos julgam legalmente punidos com esse crime, e que ele vai nos servir de lição. É verdade que lição ele deu mesmo, mas bem diferente da projetada pelas muitas e sujas mãos que puxaram o gatilho. Seremos Elton nas ruas, nas estradas, nas escolas, nos acampamentos, nos assentamentos, nas ocupações de terra, nas salas das repartições públicas e dos tribunais. Dia 27 deste mês, sétimo dia da morte do Elton, reunidos em vigília na Praça da Matriz, em Porto Alegre, pretendemos renovar esse compromisso.

Nossa dignidade e a nossa cidadania, nossa vida e liberdade o exigem, já que, de grande parte da sociedade, da mídia e do Poder Público, o que temos recebido é morte, senão a física como a dele, a moral. A da exclusão, do preconceito, da injúria, da difamação, da calúnia e do desprezo.

“Põe a semente na terra / não será em vão. Não te preocupe, / a colheita, plantas para o irmão.” Assim cantam muitas/os agricultores sem-terra. Essa nova terra, enfim libertada, a terra da justiça e da fraternidade, do leite e do mel, sagrada ao ponto de termos de descalçar nossos pés para nela pisarmos, pelo respeito que lhe devemos, a ela e a Quem a criou, pode estar à vista de quantas/os, como Elton, não desistem de conquistá-la.

Não nos renderemos.  Somos todos Elton Brum da Silva.

Depoimento de Michelini Oliveira, da Coordenação Estadual do MST
Mais uma vez a violência do latifúndio e do governo federal, que ao invés de realizarem a reforma agrária, distribuírem terras e cumprirem com seus acordos, criminalizam e usam de violência para com os movimentos sociais. É mais uma morte na luta pela terra. Nós esperamos que agora venha algum posicionamento do Governo do Estadual, do Federal e do INCRA quanto ao assentamento dessas famílias. São mais duas mil famílias acampadas que aguardam o assentamento. Para lembrar a morte do companheiro Elton, que fazia parte dessas duas mil famílias, vai haver atividades em todo o Estado, lembrando o sétimo dia do seu falecimento.

A morte dele influencia extremamente o sentimento das famílias acampadas. Estamos muito indignados. Nós não vamos desistir, mas temos vontade de vingar o sangue do companheiro com luta até que os governos se posicionem quanto à Reforma Agrária. Infelizmente, precisou tombar mais um companheiro nesta luta, e não foi o primeiro. Desde Sepé Tiaraju, vários companheiros sem-terra já tombaram. Há algumas áreas que o governo já comprou e inclusive já pagou, mas o Judiciário está trancando essas áreas.

Nós temos certeza que Elton não gostaria que estivéssemos tristes, e nem de silêncio para lembrar-mos dele. Ele era conhecido de todo mundo, muito puxador da animação, da luta. O melhor jeito para lembrar-se dele, certamente, é seguir a luta no seu lugar. A luta que ele não pode seguir por causa da violência da Brigada Militar e do latifúndio. Nós agora vamos tomar por tarefa seguir essa luta e conquistar a terra que ele mesmo não vai poder conquistar.

Depoimento de Minna Ponin, da Coordenação Estadual do MST
O companheiro Elton pagou, com a própria vida, a ausência de uma política de Reforma Agrária no nosso Estado e, também, no nosso país. Está havendo um processo contra a Reforma Agrária no campo gaúcho, porque há uma grande concentração fundiária, especialmente das grandes empresas de celulose, que nos últimos quatro anos concentraram cerca de 500 mil hectares de terra. Por outro lado, o Governo Federal tem sido bastante lento no processo de desapropriação. As poucas áreas que têm sido disponibilizadas para assentamentos, o Judiciário cancela as desapropriações.

O Elton é um exemplo disso. Ele já estava acampado há um ano no município de Canguçu, e veio para São Gabriel com o objetivo de ser assentado em uma das áreas. Mas o juiz de Santana do Livramento, Belmiro Krieger, cancelou o processo de apropriação da terra pelo MST. E, por fim, o governo gaúcho respondeu com a determinação de começar a matar trabalhador que se manifesta pela Reforma Agrária e contra o agronegócio. Nas últimas manifestações, não só contra os sem-terra, a polícia gaúcha tem agido com muita violência, de forma covarde, assim como foi em São Gabriel, já que Elton foi assassinado pelas costas.

O companheiro Elton derramou seu sangue em um dos maiores latifúndios do Rio Grande do Sul.  A fazenda Southall ainda tem cerca de 8.200 hectares de terra, que ainda são latifúndios. Lá poderiam viver dignamente cerca de 600 famílias, ou seja, em torno de duas mil pessoas poderiam ter sua vida garantida, trabalhando na terra e produzindo alimentos saudáveis para outros trabalhadores.

A nossa vingança é continuar essa luta, porque nós vivemos uma violência que não é só a violência brutal da Brigada Militar, é a violência de ficar anos esperando pela terra, a morosidade dos governos, é a violência de ver nossos filhos desnutridos, de não poder dar a eles uma alimentação e um futuro dignos. Então, esta violência do êxodo rural, provocada por esta reconcentração da terra na mão de poucas empresas estrangeiras que nós estamos vendo aqui, é a primeira forma de violência que os sem-terra vivem. Portanto, o sangue que o Elton derramou neste latifúndio vai alimentar esta luta que tem que seguir, porque é nossa única alternativa, o contrário disso seria se somar à fila dos desempregados nas periferias da cidade e estar sujeito a outras violências que nós não estamos dispostos a viver.

Em decorrência da morte do companheiro Elton, nós vamos realizar um conjunto de atos celebrativos e simbólicos em várias regiões do Estado, com a participação de pessoas que já conquistaram a terra, com outros sem-terra que seguem acampados e, também, com a participação de trabalhadores de outras categorias do campo e da cidade. Porém, nós já definimos que, por volta de dez horas da manhã, vamos realizar um ato celebrativo no local aonde Elton foi assassinado, que é na fazenda Southall, onde ocorreu o despejo na última sexta-feira.

(IHUnisinos, 27/08/2009)


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