Ele já chamou os gastos bilionários que tem sido dedicados à prevenção da gripe A (H1N1) de "pandemia de indecência". Para Marc Gentilini, especialista em doenças infecciosas e ex-presidente da Cruz Vermelha da França, os excessos cometidos até agora são fruto do medo que as autoridades têm de serem criticadas por omissão. "A dramatização da pandemia é cara e desnecessária."
Folha de S. Paulo - Como o sr. avalia a reação das autoridades à pandemia?
Marc Gentilini - Cada país reage com os meios de que dispõe, mas também em função do impacto da opinião pública. Em geral, as reações estão satisfatórias, mas os ministros da Saúde têm consciência de que sofrerão críticas em caso de mobilização insuficiente. É preciso evitar que excessos causados por medo de críticas levem a operações inúteis. Elas são caras e tiram recursos de setores que deveriam ser prioritários.
E a OMS?
Gentilini - A OMS vive com medo de ser criticada, como ocorreu quando falhou em reconhecer a gravidade da Aids no início da epidemia, especialmente na África. Essa subavaliação inicial tem um grande peso nas decisões atuais da organização. Enquanto isso, em 25 anos a Aids já matou 25 milhões de pessoas. Acho que a reação da OMS em relação à gripe é excessiva e traz o risco de afetar sua credibilidade se as manifestações mais graves da doença não ocorrerem no outono (hemisfério norte), desmobilizando a opinião pública.
E no Brasil?
Gentilini - Levar uma nova doença a sério é sábio, mas dramatizá-la não o é. Os governos devem manter o sangue frio, e o mesmo vale para o público. As drogas, o crime organizado, os acidentes de trânsito, o alcoolismo e a AIDS, todos matam mais que a gripe A. Imunizar a população inteira não é viável e teria inconvenientes, como os efeitos adversos de uma vacina que não é conhecida. Além disso, a vacina pode ser ineficaz em casos de mutação do vírus.
(Por Marcelo Ninio, Folha de S. Paulo, 22/08/2009)