O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, não vê problemas jurídicos em retirar dos Estados e municípios afetados pela exploração e produção de petróleo e gás os royalties do pré-sal. Lembrou que atualmente cerca de 29% do pré-sal já foi licitado pelo atual regime, que é de concessão, e por isso Estados e municípios que recebem tanto royalties quanto a Participação Especial (PE) continuarão a recebê-los no futuro. Isso significa, por exemplo, que a produção nos campos de Tupi, Iara e Guará, do pré-sal da Bacia de Santos, vai gerar o pagamento das indenizações, enquanto os campos descobertos ao lado e ainda não licitados, estarão sob as regras da nova lei.
Na interpretação do ministro, o artigo 20 da Constituição, que estabelece a participação no resultado ou compensação pela exploração de petróleo ou gás natural, recursos hídricos e minerais, define direitos de todos os Estados e municípios e não apenas dos diretamente afetados pela atividade. A interpretação é polêmica e opõe advogados especializados.
Marcus Vinicius Buschmann, do escritório de advocacia Buschmann & Associados, acha que o tema vai acabar desaguando em uma discussão jurídica que chegará ao Supremo Tribunal Federal e pode, inclusive, exigir uma emenda constitucional. "A Constituição pode até ser interpretada de forma mais ampla, mas o artigo 20 diz que Estados e municípios vão ser compensados. A produção de petróleo e gás é uma atividade que agride o meio ambiente e gera problemas sociais", avalia Buschmann, para quem é possível alterar a Lei do Petróleo, mas não tirar do Rio e de outros Estados a compensação pela atividade.
Já o advogado Giovani Loss, do escritório Fullbright & Jaworski, tem outra interpretação. "O beneficiamento de todos os Estados é legalmente possível, porque o artigo 20 da Constituição não estabelece a forma como a distribuição irá ocorrer. E quanto os Estados afetados ou não vão receber é uma discussão política", afirma, observando que segundo o artigo 22 da Constituição cabe à União legislar sobre energia. "Em se tratando de um assunto energético de âmbito nacional, não há como fugir da competência da União para fazer a legislação e determinar como as participações governamentais devem ser distribuídas".
Loss observa ainda, em relação à distribuição das receitas, que sob o aspecto econômico existem argumentos em prol da diversificação da base produtiva nacional quando da existência de grandes jazidas de petróleo e gás, e, por isso, existem fundamentos para que Estados não diretamente afetados também recebam uma parcela, de modo que a diversificação ocorra.
Rodrigo Jacobina, do escritório Doria, Jacobina, Rosado e Gondinho, vê "confusão extremamente grave" nas afirmações do ministro com relação à natureza do royalty, que é indenizatória, pela exploração do recurso. "Se há uma indenização, se indeniza a quem tem o recurso explorado. A sustentação de que pode ser pago para qualquer Estado atenta contra a própria natureza do pagamento,"
É fato que a arrecadação atual será exponencialmente menor para os atuais beneficiários à medida que os campos concedidos entrarem em declínio de produção. Um indício de que o governo antecipa reações de Estados como Rio, São Paulo e Espírito Santo é que a distribuição não será tratada na nova lei, mas em separado.
"No que diz respeito aos royalties e a participação especial recebidos por esses Estados, não vai haver alteração. Eles vão continuar recebendo pelo regime de concessão. Quando o petróleo se esgotar, esgotou. Eu só espero que seja dentro de 200 anos, 300 anos", disse o ministro, durante a posse do novo presidente da BR Distribuidora, José Lima de Andrade Neto.
"Se amanhã o Congresso, por hipótese, decidir que deve manter a situação que está hoje, será outra situação, outro cenário. O que eu estou dizendo é que não estamos alterando nada do que se tem hoje no regime de concessão. Sobre o regime de partilha, não se decidiu ainda", disse Lobão. Para o ministro, a simples presença da indústria de petróleo em uma região é compensação suficiente. "Poderíamos fazer uma pesquisa no Brasil todo para saber se os Estados brasileiros todos gostariam de ter esses impactos. A atividade petrolífera traz muita riqueza onde se encontra."
Segundo Lobão, o governo não espera contestações jurídicas relacionadas ao tratamento preferencial que será dado à Petrobras, que terá participação mínima de 30% e será operadora de todas as áreas do pré-sal.
(Por Cláudia Schüffner e Rafael Rosas, Valor Econômico, 21/08/2009)