Estudo faz relação entre eventos climáticos extremos e o preço dos alimentos e alerta que, levando em conta o atual ritmo de emissões de gases do efeito estufa, milhões de trabalhadores urbanos irão mergulhar para abaixo da linha da pobreza
Quando se pensa nos efeitos das mudanças climáticas vem logo à mente imagens de secas, tempestades ou o aumento do nível do mar. Portanto, é de se presumir que as comunidades costeiras e os agricultores sejam os grandes prejudicados com o fenômeno. Agora, um estudo da Universidade de Purdue, no Estados Unidos, revela mais um personagem que deve sofrer com o aquecimento global: o trabalhador urbano.
Os pesquisadores examinaram a influência econômica de eventos climáticos adversos, como ondas de calor, secas ou chuvas pesadas no custo de alimentos em 16 nações em desenvolvimento e concluiu que o aumento do preço da comida levará milhões de pessoas para abaixo da linha da pobreza. “Eventos climáticos afetam diretamente a produção da agricultura e irão causar o aumento do preço de alimentos básicos, como grãos, que são fundamentais para as famílias de países em desenvolvimento”, afirmou um dos autores do estudo, o diretor do Centro de Mudanças Climáticas da Universidade de Purdue, Noah Diffenbaugh.
Segundo o professor de economia agrícola e co-autor da pesquisa, Thomas Hertel, apesar dos trabalhadores urbanos contribuírem modestamente para as taxas totais de pobreza nos países, eles são o grupo mais atingido pela variação do preço dos alimentos. “Comida é a maior despesa para os mais humildes e, enquanto aqueles que trabalham no campo podem ter alguma vantagem com o aumento dos preços de seus produtos, os pobres urbanos sentirão apenas efeitos negativos. Isto é uma importante conclusão, dado que segundo projeções da própria ONU todos os países em desenvolvimento estão tendo sua população migrando do campo para a cidade”, explicou Hertel.
Bangladesh, México e Zâmbia mostraram a maior porcentagem da população indo para abaixo da linha da pobreza por causa das mudanças climáticas, com respectivamente 1,4%, 1,8% e 4,6%. “Isso significa mais 1,8 milhões de pessoas miseráveis em Bangladesh e no México, e 500 mil na Zâmbia”, disse Hertel.
Metodologia
O estudo "Climate volatility deepens poverty vulnerability in developing countries" foi publicado nesta quinta-feira (20/08) no Environmental Research Letters e analisou dados do século XX e projeções para os próximos anos para desenvolver uma conexão entre os eventos climáticos, a produção de alimentos e o impacto disso nas populações pobres de cada país.
Os pesquisadores identificaram as chuvas, secas e ondas de calor entre 1971 a 2000 e fizeram projeções para 2071 a 2100, em seguida compararam os máximos dos dois períodos. Foram utilizados os modelos climáticos do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC) que consideram que as emissões de gases do efeito estufa continuarão no ritmo atual. “A ocorrência e magnitude dos extremos climáticos devem aumentar substancialmente em todo o mundo. Ondas de calor e secas no Mediterrâneo têm o potencial de serem até 2700% mais freqüentes no futuro, assim como as chuvas extremas no Sudeste da Ásia, que poderão tem uma chance de até 900% a mais de acontecer”, afirmou Diffenbaugh.
As projeções de eventos climáticos extremos foram comparadas com os efeitos desses mesmos tipos de fenômenos na agricultura no passado. Dessa forma foi possível calcular o impacto deles na produção dos produtos no futuro. Por exemplo, em 1991 uma seca no sul da África derrubou a produção de grãos pela metade no Malawi e na Zâmbia. Para avaliar o efeito econômico da queda da produção de alimentos, os pesquisadores utilizaram um modelo de comércio global (Global Trade Analysis Project – GTAP) desenvolvido pela própria Universidade de Purdue. Este modelo é mantido por 27 agências internacionais e é utilizado por mais de 6500 pesquisadores em 140 países.
“É importante entender quais grupos socioeconômicos e países podem sofrer mais com as mudanças climáticas e o aumento das taxas de pobreza, para assim tomar decisões mais embasadas para políticas de ajuda”, disse Diffenbaugh. Segundo o pesquisador, a equipe continuará seu trabalho para elaborar análises mais exatas que liguem a volatilidade climática com a vulnerabilidade econômica. Pois, mesmo com os resultados alarmantes apresentados nesse estudo, a pesquisa levou em conta apenas os eventos extremos, tornando assim sua conclusão conservadora. “Um bilhão de pessoas vivem com menos de US$ 1 por dia, eventos climáticos extremos podem ter um efeito devastador para elas” concluiu Hertel.
(Por Fabiano Ávila, CarbonoBrasil, 20/08/2009)