Levantamento do Estado afirma que milho transgênico contaminou outros plantios Maior produtor de milho do país teme efeitos sobre a exportação do Estado e pede ao Planalto mudanças para a safra de verão
A Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Estado do Paraná concluiu que as regras de segregação das lavouras de milho transgênico Bt determinadas pela CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) para todo o país não funcionam na prática. A conclusão do levantamento foi entregue ao governo federal pelo secretário paranaense de Agricultura, Valter Bianchini. A resolução nº 4 da Comissão exige uma faixa de 20 metros entre uma lavoura de milho transgênico e outra convencional nas regiões onde predomina a pequena propriedade.
Depois de avaliar o resultado da primeira safra comercial de milho transgênico (a safrinha, na qual o Paraná colheu 4,7 milhões de toneladas -1,1 milhão de toneladas de milho geneticamente modificado), o maior produtor de milho do país concluiu que o governo federal foi incapaz de fiscalizar o cumprimento das regras de plantio definidas pela CTNBio. Mas, mais do que isso, o Paraná observou que as regras definidas pela comissão são ineficazes.
O material genético transgênico suplanta o perímetro de 20 metros entre as culturas e contamina lavouras convencionais. O resultado joga por terra a tese de que as regras garantem a convivência entre lavouras convencionais e transgênicas, uma das exigências da Lei de Biossegurança. O milho tem o que os agrônomos chamam de polinização aberta, ou seja, uma planta pode ser fecundada pelo pólen de outra planta, transgênica ou não. Segundo a conclusão do Paraná, esse material genético viaja mais do que os 20 metros definidos como "seguros" pela CTNBio.
De acordo com a Seab, "existem evidências das dificuldades em evitar a contaminação, mesmo cumprindo as distâncias estabelecidas [de espaçamento]". "As suspeitas foram confirmadas. Precisamos agora discutir com o governo federal formas mais eficientes de controlar e confinar o milho Bt. Uma das medidas é uma redefinição do espaçamento exigido hoje, é isso que queremos discutir agora com o governo federal", disse Bianchini.
A reportagem da Folha havia revelado em maio a contaminação do milho convencional por material geneticamente modificado. Ao percorrer áreas produtoras do Paraná, a reportagem também revelou que cooperativas de produtores não teriam como colher, transportar e armazenar separadamente a produção transgênica da não transgênica. A Seab confirmou agora na nota técnica a mesma conclusão. Com base nas alegações do Paraná, pode-se concluir que vários alimentos consumidos no país neste momento utilizam em sua composição milho transgênico sem o devido alerta nos rótulos, conforme determina a lei de biossegurança. "Essa hipótese se confirmou", disse Bianchini.
O Paraná teme os efeitos que isso pode provocar na produção de frango e na exportação do produto, caso as autoridades não busquem minimizar os problemas no plantio da safra de verão, quando o Paraná pode produzir 9 milhões de toneladas de milho. No Paraná, a previsão é que o plantio do milho geneticamente modificado supere os 25% da safrinha.
A nota técnica foi enviada aos ministérios da Agricultura, do Meio Ambiente, da Saúde, da Justiça, do Desenvolvimento Agrário e para a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, também presidente do Conselho Nacional de Biossegurança -instituição com poderes para suspender a autorização de plantio comercial de milho transgênico no país. A nota também foi enviada à CTNBio, à Anvisa, ao Ibama e à Presidência da República. A Folha tentou falar com a Casa Civil, mas não obteve resposta.
A nota do Paraná é a primeira vinda de uma instituição pública condenando o modelo de plantio e controle do milho geneticamente modificado. Em junho, 86 organizações civis enviaram uma carta aberta à ministra Dilma solicitando a imediata suspensão da autorização para o plantio de milho transgênico no país. As alegações foram as mesmas apontadas agora pelo Paraná.
(Folha de S. Paulo, 15/08/2009)