“Centenas de milhares de pessoas se espremem na fronteira com a Índia, em fuga das terras submersas. O Paquistão está de joelhos. E essas centenas de milhares de refugiados reacendem o conflito entre islâmicos e hindus. A violência explode. Toda a região está fora de controle…”. O próximo apocalipse não está descrito no roteiro de um filme, mas no relatório extremamente alarmante que a National Defense University, um instituto controlado pela inteligência e pelos militares norte-americanos, escreveu no final do ano passado, com George W. Bush ainda no comando, e do qual o New York Times revela agora a existência.
Inundações, guerras, carestias. O desastre à porta tem a assinatura de um único culpado: as mudanças climáticas. Mas a extraordinária novidade do último alarme está na assinatura. Não de uma associação ambientalista, não dos ativistas do verde, mas dos militares, da Defesa, da “intelligence”. “Deveremos pagar por tudo isso de um modo ou de outro”, diz Anthony C. Zinni, ex-general da Marinha e chefe do Comando Central. “Pagaremos para reduzir as emissões de gás hoje e teremos um contragolpe econômico extremamente duros. Ou pagaremos mais tarde e em termos militares: com o custo de vidas humanas”.
Os estudos foram praticamente censurados pelo governo Bush: tem poucos dias a “redescoberta” de uma série de fotos, mantidas sob sigilo, que demonstram como as mudanças climáticas já beberam uma parte do gelo do Ártico. Mas agora, na primeira fila, estão o Pentágono e o ministério da Defesa, com a ajuda da Nasa. Nos próximos 20 ou 30 anos, preveem os estudos, a diminuição do alimento, a seca e as inundações exigirão, da África subsaariana ao sudeste asiático, a escolha entre dois caminhos: a ajuda humanitária ou a resposta militar. Mas verdadeiramente só a intervenção militar poderá gerir uma emergência dessas?
O debate surgiu nos EUA às vésperas da discussão no Senado sobre o pacote climático que, com mil dores de barriga, Barack Obama conseguiu digerir na Câmara. John Kerry, justamente o ex-concorrente de Bush, está fazendo um grande trabalho para convencer cerca de 30 senadores, sobretudo no Sul, que paguem os cortes no carvão com o aumento das tarifas. Eis o carvão. O poderoso lobby já terminou no escândalo com a publicação das cartas falsas ao Senado, em que ambientalistas expoentes pediam que parassem a reforma. Falsidades gravíssimas, muito além do costumeiro trabalho de lobby.
Agora, a entrada em campo da inteligência e da defesa poderia ser uma arma a mais para Obama. Um desastre ambiental, revela uma pesquisa do Departamento de Estado, colocaria em risco até estruturas militares como as bases navais de Norfolk e de San Diego. Teme-se também por Diego Garcia, a pequena ilha no Oceano Índico, de onde os EUA partiram ao ataque contra o Afeganistão. A ameaça é extremamente grande: a primeira guerra mundial do clima poderia ser, verdadeiramente, a última.
(Por Angelo Aquaro, com tradução de Moisés Sbardelotto, La Repubblica / IHUnisinos / CarbonoBrasil, 12/08/2009)