Considerado o melhor resort do Brasil, o Costão do Santinho, em Florianópolis, envia carta a potenciais interessados em comprá-lo -- uma reação à queda no número de turistas e à falta de investidores
Localizado a 35 quilômetros de Florianópolis, em Santa Catarina, o complexo hoteleiro Costão do Santinho está encravado numa reserva de 750 000 metros quadrados de mata nativa, entre uma praia paradisíaca, dunas preservadas e costões rochosos. Sua infraestrutura é comparada à de resorts internacionais. Possui 600 apartamentos, campo de golfe, spa, seis restaurantes, oito quadras esportivas, bares e danceteria. Há quatro anos consecutivos, o resort conquista o título de melhor do Brasil no prêmio concedido pela revista VIAGEM E TURISMO, da Editora Abril (que publica EXAME).
Com tantas atrações e honrarias, era de esperar que o negócio estivesse em situação tão privilegiada quanto a localização do hotel. Pois não está. Segundo três fontes independentes ouvidas por EXAME, Fernando Marcondes, fundador do complexo, busca um comprador para o Costão do Santinho Turismo e Lazer, a empresa que administra o resort e é dona das áreas comuns.
Há cerca de dois meses, o Costão enviou a potenciais interessados uma carta-convite assinada por Alan D. Briskin, presidente da consultoria Allenby Enterprises, na Flórida, nos Estados Unidos. Na carta, Briskin diz que foi autorizado por Marcondes a iniciar conversas com grupos interessados, explica o tamanho e as características do resort e revela que o proprietário deseja se aposentar. Procurados pela reportagem, os executivos do resort negaram a venda.
As dificuldades do grupo começaram há dois anos, com a prisão de Marcondes pela Polícia Federal. Dono e "alma" da empresa, ele foi detido por suspeita de envolvimento em um esquema de compra e venda de licenças para construção em áreas de preservação ambiental. Segundo pessoas próximas a Marcondes, o caso diminuiu o interesse de investidores na compra de imóveis dos condomínios Costão das Gaivotas e Costão Golf, dois novos empreendimentos em implantação nas redondezas do resort. Apenas 60% dos 124 imóveis do projeto Gaivotas, por exemplo, foram comercializados desde o lançamento, há mais de dois anos.
Além do desgaste provocado pelo caso, o Costão do Santinho foi afetado financeiramente por dois episódios recentes. O primeiro foram as fortes chuvas que mataram e desabrigaram centenas de pessoas em parte de Santa Catarina, em novembro de 2008. Em razão da tragédia, estima-se que 20% dos pacotes tenham sido cancelados pelos clientes para o verão de 2009. O segundo fator foi uma queda no movimento em razão da crise. Com a redução no número de hóspedes, a ocupação do Costão do Santinho no verão de 2009 foi de 60% -- cerca de 15% menor do que a registrada em 2008. "A crise abateu o setor. Tivemos o pior desempenho dos últimos 15 anos", diz Tarcísio Schmitt, presidente do Sindicato de Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares de Florianópolis.
Esse cenário colocou em questão o modelo de negócios do Costão. Trata-se do sistema de "condo-hotel", em que os apartamentos são vendidos a investidores. Em certa medida, é como se essas pessoas se tornassem sócias do Costão. Só que, em vez de ter ações, elas são donas de uma fração do empreendimento. Quando os proprietários não estão no hotel, os imóveis são oferecidos aos hóspedes. Marcondes seria o sócio majoritário. Ele é dono de imóveis e das áreas comuns, além de ser responsável pelo equilíbrio financeiro do negócio. Com o aumento da concorrência nos últimos anos, ficou mais difícil atrair turistas.
Hoje, o Costão do Santinho disputa clientes com resorts que proliferaram pelo país. Apenas no Nordeste, os quartos de hospedagem se multiplicaram por 10: de 300, em 1999, para mais de 3 200 no ano passado. Com a competição pelos clientes, a média de ocupação nacional também caiu: de 70%, em 2005, para 45%, em 2008. Para um resort começar a ter lucro, estima-se, o mínimo deve ser 50%. "Estamos acima disso", diz Felipe Marcondes, filho de Fernando Marcondes e executivo do grupo.
O movimento do Costão do Santinho para atrair um comprador ocorre em um dos momentos mais difíceis da história recente da indústria hoteleira mundial. Com a economia global em recessão e a falta de crédito, os compradores ficaram mais criteriosos na avaliação de investimentos e mais seletivos na escolha de projetos. Sobretudo no Brasil, que, depois da valorização do real, se tornou mais caro para os turistas brasileiros e estrangeiros.
Em paralelo, a concorrência e a baixa ocupação dos quartos de hotéis disponíveis transformaram as redes hoteleiras do Brasil em um negócio de baixo retorno. Hoje, a taxa média de retorno dos empreendimentos hoteleiros no país varia de 12% a 14% ao ano, enquanto nos Estados Unidos, por exemplo, supera 25%. "Com esse baixo nível de retorno, os investidores tendem a comprar hotéis em Paris ou Madri, capitais desejadas pelos turistas", diz José Ernesto Marino Neto, presidente da BSH International, consultoria especializada em turismo.
O resort Costão do Santinho poderia interessar, no entanto, companhias que têm um modelo de negócios verticalizado. Empresas como a alemã Tui. Com um sistema integrado, que inclui agências de viagens, hotéis e uma frota de cerca de 130 aviões, o grupo seria capaz de trazer turistas de qualquer ponto da Europa -- e, assim, dar continuidade ao paraíso.
(Por Denise Carvalho, Exame, 06/08/2009)
Comentário Ambiente JÁ
Aos interessados em saber mais sobre o outro lado deste "paraíso", sugerimos que cliquem nas tags à direita e também leiam o livro-reportagem "Tacada perigosa: A polêmica construção do Costão Golf sobre o maior aqüífero de Florianópolis", escrito pelo editor-executivo do Ambiente JÁ, Rodrigo Brüning Schmitt.