Novo Plano Diretor atinge Marapendi e Grumari; governo alega combate à favelização e ecologistas têm ressalvas
A prefeitura do Rio estuda uma mudança na legislação que poderá permitir a construção de até 11 eco resorts em áreas de proteção ambiental na orla da zona oeste. Os terrenos são privados, cada resort teria 200 suítes e os lotes seriam vendidos separadamente, para financiar a construção, o que hoje não é permitido. O prefeito Eduardo Paes (PMDB) relaciona o projeto à necessidade de vagas na rede hoteleira para a realização da Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016, que o Rio ainda disputa.
"Trata-se de uma área controlada que merece todo o cuidado, mas temos de levar algum tipo de situação econômica para dar sustentabilidade, senão o proprietário abandona", argumentou o secretário municipal de Urbanismo, Sérgio Dias. Segundo ele, o empreendimento começaria na Área de Proteção Ambiental (APA) da Restinga de Marapendi e poderia ser estendido, caso haja interessados, até a APA de Grumari, um dos últimos refúgios de restinga do Rio. Para Dias, o projeto teria o efeito de inibir a eventual favelização dos terrenos. "Queremos trazer os melhores operadores (de resorts) brasileiros e internacionais."
Responsável pela lei que criou a APA de Marapendi, em 1992, o vereador Alfredo Sirkis (PV), ex-secretário municipal de Meio Ambiente e de Urbanismo, desconfia do modelo em estudo. "A construção do jeito que eles prometem já é viável. Além disso, o projeto ecoturístico não seria solução para responder à demanda por vagas na rede hoteleira." Somados, os 11 eco resorts forneceriam 2.200 quartos. Mas o documento "Games of the XXXI Olimpiad 2016 Working Group Report" aponta a promessa de fornecer mais 21.394 quartos. O relatório foi preparado pelo IOC Candidatura Acceptance Working Group, grupo técnico que examinou as propostas de sete cidades para a Olimpíada, em 2008.
Para Sirkis, se o objetivo for realmente viabilizar economicamente a construção e os limites de preservação forem respeitados, não há problema. "Mas desconfio que não seja só isso. Devemos ficar vigilantes em relação à tentativa de se vender gato por lebre, de serem construídas coisas em escalas muito maiores." Dias defende o projeto, dizendo que nem cozinhas serão permitidas, de forma a evitar que os eco resorts sejam transformados em apart-hotéis. Ele afirma que as construções ficarão limitadas a 10% da área. "E estamos analisando as compensações ambientais."
Sirkis lembra, porém, que antes da criação da APA vereadores apresentaram projeto para a construção de um suposto "polo turístico" na restinga de Marapendi, com prédios de 15 andares. Depois, em 2005, a Câmara aprovou lei complementar que aumentava a área total edificada permitida. Na época, o prefeito Cesar Maia (DEM) vetou o projeto, mas os vereadores derrubaram o veto e houve uma valorização dos terrenos. Maia, então, entrou na Justiça. O plano da atual gestão para as áreas veio à tona durante as discussões do novo Plano Diretor da cidade, cuja votação deve ocorrer até dezembro.
Estudos
Professor da Universidade do Estado do Rio (Uerj) e vice-presidente da Câmara Comunitária da Barra da Tijuca, o oceanógrafo David Zee disse que vê com bons olhos o projeto, desde que sejam feitos os estudos ambientais necessários. "Não existe ilegalidade se o uso for sustentável, os parâmetros forem respeitados e houver uma ocupação de baixa densidade", disse. Segundo ele, os resorts poderiam evitar o risco de ocupação desordenada.
O biólogo Mario Moscatelli, também morador da Barra, que acompanha há 15 anos o ecossistema da Lagoa de Marapendi, afirma que a APA está abandonada. "Hoje não existe fiscalização nem gerenciamento, nada é feito", avalia. "Há despejo de esgoto, incêndio no verão, proliferação de espécies exóticas que expulsam a vegetação de restinga, etc." Moscatelli diz que Grumari vive o mesmo problema, com a mata de encosta se transformando em um grande bananal. "Não ter construção não quer dizer que está preservado." O secretário disse que o estudo de impacto ambiental dos resorts levaria um ano e a construção, no mínimo dois anos.
(Por Felipe Werneck, O Estado de S. Paulo, 11/08/2009)