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redd emissões de co2 fundo amazônia
2009-08-11

Para líder de coalizão de países tropicais, esquemas de crédito de carbono por desmatamento evitado saíram do controle. Papuano Kevin Conrad diz que mundo está num bom caminho para um mau acordo do clima e que EUA ainda são maior problema

Governadores da Amazônia deveriam pensar duas vezes antes de assinar contratos de venda de créditos de carbono por desmatamento evitado. A opinião é justamente do maior defensor de um mecanismo de mercado para carbono de florestas, Kevin Conrad, 40. "Nós chamamos o mercado voluntário de ouro de tolo", afirmou. "Eles vão assinar contratos e o dinheiro não virá, porque ele não existe." Funcionário do governo de Papua-Nova Guiné, Conrad lidera a Coalizão das Florestas Tropicais, um grupo de 40 países que desde 2005 tenta incluir um mercado para o carbono de florestas no novo acordo contra o aquecimento global.

Esse mecanismo, o chamado Redd (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), está hoje em negociação no âmbito da Convenção do Clima das Nações Unidas e deve ser definido em dezembro em Copenhague. Ontem, em Bonn (Alemanha), teve início uma nova rodada de negociações do novo acordo, com um alerta do secretário-executivo da convenção, Yvo de Boer, de que "o tempo está se esgotando". Na ONU, Conrad tem protagonizado disputas com a delegação brasileira. O Brasil defende que o Redd seja feito apenas de fundos voluntários, como o Fundo Amazônia, que não valem créditos comercializáveis.

A coalizão defende um mecanismo de mercado -mas um mercado regulamentado global, e não os acordos voluntários que vêm pipocando por aí. Em entrevista à Folha, o papuano explicou por que está tentando combater os mercados voluntários em seu país e fez sua previsão para Copenhague: "Estamos num bom caminho para um acordo que não seja ambicioso". Leia a seguir.

Folha - Na conferência de Bali, em 2007, o sr. disse ao governo dos EUA para "liderar ou sair do caminho". Para quem o sr. diria isso hoje?
Kevin Conrad -
Eu ainda acho que os EUA, talvez não a administração Obama em si, mas alguns dos senadores no Congresso, ainda precisam desse tipo de bronca. Ainda há muito jogo de empurra vindo dos EUA: "Os EUA não farão isto se a China não fizer aquilo", ou "nós vamos andar devagar porque nossa economia é muito complexa". Há muitas pré-condições que nós esperaríamos que não viessem do maior emissor de todos os tempos. Estamos indo a Copenhague montados nas costas de uma desaceleração econômica. Os principais emissores têm interesse em andar mais devagar hoje. Eu acho que nós temos uma chance boa de ter um acordo que não seja ambicioso.

O sr. apoia a proposta brasileira de licenciamento compulsório de tecnologias de energia?
Conrad - Acho que seria útil. Se o licenciamento de tecnologias for um impedimento a economias mais limpas, precisamos pensar em como fazer as coisas acontecerem, é isso o que o Brasil está tentando.

Hoje há duas visões em debate sobre o Redd. De um lado está o Brasil, defendendo fundos voluntários. Do outro, a Coalizão das Florestas Tropicais, liderada pelo sr., defendendo um mecanismo de mercado. Que visão prevalecerá?
Conrad - Ambas. O que a coalizão está dizendo é que nós precisamos dar um passo de cada vez. Precisamos mobilizar fundos voluntários para ajudar os países a se prepararem. Não podemos soltar as forças do mercado imediatamente. Mas, em toda a história da humanidade, não houve nenhum momento no qual países ricos tenham mobilizado capital suficiente para enfrentar problemas nos países do Terceiro Mundo voluntariamente.

A Noruega se comprometeu a dar US$ 1 bilhão para o Fundo Amazônia...
Conrad - Claro, a Noruega deu US$ 1 bilhão, e nenhum outro país além da Alemanha se comprometeu. Se você olha para o que é necessário, nossa projeção é algo entre US$ 30 bilhões e US$ 60 bilhões por ano.

São US$ 30 bilhões a US$ 60 bilhões para proteger florestas?
Conrad - Nós estamos no processo agora de valorar cada um desses estágios. Quanto precisamos para cada país, por ano, para ajudá-los a chegar aonde o Brasil está? O Brasil tem satélites, consegue detectar desmatamento, mandar fiscalização. Muitos outros países não chegaram lá ainda. Quanto custa para eles chegarem? Esse é o estágio do meio, o da demonstração. E, apenas quando você tiver preparado instituições e políticas que sejam robustas o suficiente para permitir as forças de mercado, você teria a opção de um mercado. O que o Brasil está dizendo é para ficarmos felizes com os dois primeiros estágios e considerar o mercado num acordo futuro.

O sr. então não defende que o mercado comece a operar já?
Conrad - Se um país está pronto para entrar num mecanismo de mercado, ele deve ter o direito de fazê-lo. Mas a imensa maioria dos países do Redd ainda não está pronta, e precisará de vários anos de um mecanismo de fundos para se preparar.

O governo brasileiro diz que um mercado para desmatamento evitado livraria os países ricos de reduções domésticas ao dar-lhes a liberdade de comprar créditos florestais baratos.
Conrad - Esses são medos de um processo desregulado. Nenhum de nós quer ver os países do Anexo 1 [industrializados] terem uma desculpa para continuar com seu estilo de vida de emissões altas. O que propomos é que o Anexo 1 tem de adotar metas maiores se quiser usar o Redd. Não pode ser uma cláusula de escape, como o MDL [Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, criado do acordo de Kyoto, segundo o qual países ricos podem comprar créditos de países pobres]. É curioso que o Brasil não queira uma cláusula de escape para o Redd, mas esteja feliz com uma cláusula de escape para o MDL. Isso é hipocrisia. O que estamos pedindo é que, quando a UE vem e diz que vai adotar uma meta de 20% de redução de emissões ou de 30% se os países em desenvolvimento fizerem alguma coisa... é disso que precisamos. Que, se o Redd chegar ao mercado, eles se voluntariem a ir de 20% para 30% ou de 30% para 40%.

Há um outro problema no mercado para o Redd que é de ordem filosófica: você estaria pagando as pessoas para fazerem algo que a lei já exige que elas façam.
Conrad - Isso pode ser verdade no Brasil, mas não na maioria dos países em desenvolvimento. Em Papua-Nova Guiné, 97% das terras estão em mãos de proprietários privados. E não há lei que diga que eles não podem cortar as árvores; as árvores são deles. O Brasil está à frente dos outros. Não podemos desenhar um mecanismo de Redd baseado no Brasil.

Qual será o futuro do Fundo Amazônia? Haverá dinheiro?
Conrad - Eu acho que foi um primeiro passo muito importante, mas não acredito que se tornará viável e funcional com o modelo de doação existente.

Qual é a situação de Papua no combate ao desmatamento?
Conrad - Estamos concentrados agora em duas questões: primeiro, fazer as análises que o Brasil já faz: entender onde o desmatamento acontece, por quê, e o que fazer para contê-lo. A outra coisa é que estamos tendo problemas com pessoas que tentam assinar contratos voluntários [de Redd] que usam padrões diferentes dos que a Convenção do Clima usa. O Brasil está tendo esse problema também. Estamos tentando refrear a introdução desses padrões e criar um padrão único.

O sr. recomendaria a governadores no Brasil, por exemplo, que mergulhassem nesse mercado?
Conrad - Eu acho que é um negócio arriscado, porque não há certeza de que haverá dinheiro suficiente. Todo o mercado voluntário no ano passado foi de US$ 700 milhões, no mundo. Um único Estado no Brasil pode beber todo esse dinheiro e ainda haveria desmatamento. Nós chamamos o mercado voluntário de ouro de tolo. Ele representa menos de 1% do mercado global de reduções compulsórias. Essas coisas que os governadores estão assinando não são parte da Convenção do Clima. Vários desses governadores não estão fazendo a análise econômica adequada. Eles vão assinar contratos e o dinheiro não virá, porque ele não existe, não está no mercado.

(Por Claudio Angelo, Folha de S. Paulo, 11/08/2009)


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