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soja transgênica transgênicos
2009-08-11

Cassação de liminar que possibilitava plantio de transgênicos no limite de até 500 metros da Floresta Nacional de Passo Fundo poderá inviabilizar lavouras da região

Alguns municípios da região estão ameaçados de ter a economia inviabilizada. A base da economia regional, a agricultura, poderá ter sua área drasticamente reduzida se os produtores precisarem cumprir uma decisão da União que termina com o direito dos agricultores de plantar soja transgênico na área do entorno da Floresta Nacional de Passo Fundo. Em princípio, foi proibido o plantio em um raio de até 10 quilômetros das proximidades da floresta. O Decreto 5.950, de 31 de outubro de 2006, possibilitava que a área limite fosse reduzida para 500 metros. Entretanto, uma ação popular, encabeçada por um biólogo, fez a União entender que o decreto era institucional, voltando à determinação dos 10 quilômetros. Com isso, 98% da área de plantio do município de Mato Castelhano, por exemplo, não poderá ser coberta. Além disso, a medida atinge outros municípios, como Coxilha, Gentil, Marau e Passo Fundo.

A floresta que já foi motivo de orgulho e de cuidado para os agricultores de Mato Castelhano, hoje ameaça inviabilizar as produções agrícolas no município. Agricultores e lideranças políticas da cidade buscam agora uma alternativa para resolver o problema.

As propriedades que já eram atingidas pelo limite de 500 metros passam agora a ser inviabilizadas para o plantio de transgênicos. Juliano Manfroi é da terceira geração de agricultores que plantam no entorno da floresta. "A primeira dificuldade que íamos ter é para conseguir semente, porque hoje não se encontra mais soja convencional. As que existem hoje são aptas para o Paraná, Mato Grosso do Sul, mas não para o Rio Grande do Sul", justifica. O agricultor relata ainda que outra dificuldade será com a aquisição de herbicidas para aplicar na lavoura convencional. "No limite de 500 metros que valia até o ano passado tínhamos uma área de dez hectares atingida. No último ano não conseguimos herbicidas para essa área e tivemos perda de quase dez sacos por hectare", conta.

Manfroi acredita que a decisão representa uma regressão nas formas de plantio. "Além disso, eles pregam tanto que o soja transgênica faz mal, mas com a convencional vamos ter que fazer duas aplicação de herbicidas. Quanta água com herbicida vou colocar a mais no meio ambiente? E o CO2 emitido pelas máquinas?", questiona. Ele defende que antigamente não se viam mais animais pela área. "Hoje já se veem perdizes e veados pelo mato", comemora.

Faltando cerca de dois meses para o início do plantio da próxima safra o agricultor já tem semente e defensivos para a lavoura. "Compramos na hora em que o preço está melhor, não podemos comprar em cima da hora, porque corremos o risco de ficar sem sementes ou produtos. Teríamos opção, se tivesse herbicida e sementes à disposição, mas não se encontra mais", lamenta. Segundo ele a propriedade torna-se inviável agora.

Preconceito
A determinação de retorno do limite para 10 quilômetros é encarada como preconceito por alguns agricultores. É o caso do produtor e engenheiro-agrônomo, Renato Palagio, ele acredita que a ação movida revela questões ideológicas contra OGMs (organismos geneticamente modificados). "Certamente a autora da ação desconhece os malefícios que tínhamos antes com a utilização de herbicidas na lavoura convencional. Hoje com a soja transgênica RR, tem-se uma aplicação de agroquímicos, é bem menos e de letalidade infinitamente menor", opina.

Para Palagio, não existe uma justificativa científica para essa determinação. "Sabemos que não existe o risco de cruzamento entre espécies cultivadas, como a soja, e nativas. Antes, nas melhores condições, não tínhamos um controle 100% da lavoura. As nossas cultivares convencionais nunca tiveram rendimento médio muito alto, mas o que se viu com a soja transgênica, é que começamos a colher bem mais", lembra.

Conforme ele, todos os OGMs são aprovados por uma lei rigorosa e hoje os fabricantes de agrotóxicos não tem interesse em produzir para pequenas áreas. A área atingida na propriedade é de cerca de 160 hectares. "Nessa área são produzidos, em média, 3 mil quilos de soja por hectare", diz. O agricultor acredita que os agricultores não são contra a preservação. Ele justifica a opinião devido ao fato de ser a terra a responsável pelo sustento do agricultor e da família.

Cidades atingidas
Conforme o prefeito de Mato castelhano, Solano Canevese, além do município, outras cinco cidades serão atingidas: Marau, Água Santa, Coxilha, Gentil e Passo Fundo. "O município vai se tornar inviável economicamente, além da desvalorização das propriedades rurais, os produtores ficarão inviabilizados de permanecer nas suas áreas aqui, porque hoje não existem mais semente e produtos para a produção da soja convencional", pontua.

O prefeito alega que todos os produtores estão preparados para a próxima safra. "Essas pessoas vão ficar inviabilizadas economicamente, e quem vai pagar a conta dos contratos e negócios já firmados?", questiona. O prefeito destaca que existem várias áreas de preservação espalhadas pelo país e uma das únicas que tem esse problema é a de Mato Castelhano. "O povo ajudou a plantar e a cuidar a floresta e hoje ela se tornou um inimigo das produções dessas famílias", compara.

O município tem cerca de 17 mil hectares de terras destinadas ao plantio de soja. "Com essa definição isso praticamente zeraria o Fundo de Participação do Município e o ICMS gerado por essa cultura, além da desvalorização dos imóveis. Praticamente ficaríamos só com a produção de trigo e de leite no município", destaca. Para tentar resolver o problema, o chefe do Executivo entrou em contato com os senadores Sérgio Zambiasi e Paulo Paim e com o deputado Luiz Carlos Busato. "Eles estão atentos a esse problema em Brasília e já me comunicaram que falaram com a assessoria da Presidência e os advogados da União deverão entrar com uma ação contra a cassação desse decreto presidencial", adianta. Além do que já está sendo feito, o prefeito deixa a sugestão para que os agricultores entrem com uma ação conjunta para possibilitar o plantio da próxima safra.

O decreto
O decreto que dava respaldo aos produtores para o plantio da soja transgênica, respeitando os limites de 500 metros tem o número 5.950, datado de 31 de outubro de 2006. Conheça o texto:
Art. 1º - Ficam estabelecidas as faixas limites para os seguintes organismos geneticamente modificados nas áreas circunvizinhas às unidades de conservação, em projeção horizontal a partir do seu perímetro, até que seja definida a zona de amortecimento e aprovado o Plano de Manejo da unidade de conservação:
I - quinhentos metros para o caso de plantio de soja geneticamente modificada, evento GTS40-3-2, que confere tolerância ao herbicida glifosato;
II - oitocentos metros para o caso de plantio de algodão geneticamente modificado, evento 531, que confere resistência a insetos; e
III - cinco mil metros para o caso de plantio de algodão geneticamente modificado, evento 531, que confere resistência a insetos, quando existir registro de ocorrência de ancestral direto ou parente silvestre na unidade de conservação.
Art. 2º - Os limites estabelecidos no art. 1º poderão ser alterados diante da apresentação de novas informações pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio.

Entenda o caso
De acordo com o advogado Ioberto Banunas, que assessorou juridicamente o grupo de produtores e prefeitos que criou uma associação anos para tratar da questão e assegurar os diretos dos produtores, a redução de 10 quilômetros para 500 metros foi aprovada até que existisse um plano de manejo sobre a unidade de conservação, o que ainda não aconteceu. Contudo, a ação popular parte da afirmação de que o decreto seria inconstitucional e que geraria prejuízo para o meio ambiente.

Dentre os argumentos, está a não existência de uma comprovação científica de que soja transgênica não gere prejuízos ao meio ambiente. Com base nisso, considerando a ilegalidade do decreto, a União ingressou com um agravo de instrumento, buscando alteração dessa decisão liminar e conseguindo a suspensão. A decisão passa a valer para a próxima safra e caberá aos órgãos de proteção ambiental a fiscalização. Continuando a situação da forma que está, os produtores que forem flagrados com lavouras de soja transgênica além do limite dos 10 quilômetros poderão ser multados.

"Essa é uma medida que vem em uma hora muito imprópria, porque os agricultores estavam preparados para a decisão do limite de 500 metros para o plantio de transgênicos. A nossa cidade será 100% atingida. Pegaram Mato castelhano como cobaia", prefeito de Mato Castelhano, Solano Canevese.

(Por Glenda Mendes e Leonardo Andreoli, O Nacional, 10/08/2009)


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